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Qualidade sanitária da água de reúso como destino sustentável para a agricultura

Resumo

A água de reúso definida como a reutilização de águas provenientes de efluentes tratados, pode ser uma fonte alternativa de água para agricultura, porém é importante a avaliação da sua qualidade sanitária para não causar agravos a saúde ambiental e humana. O objetivo foi avaliar a qualidade sanitária da água de reúso de diferentes origens para uso na agricultura com finalidade de emprego sustentável da água. Foram coletadas amostras de água de reúso de diferentes tipos de tratamento, denominadas no trabalho como “clorada, polida e biológica”. Foram realizadas análises bacteriológicas e físico-químicas da água de reúso, e do solo. Em sistema construído em laboratório foram cultivados Petroselinum crispum, regados por gotejamento com água de reúso e água potável. Foram feitas extrações de DNA total para verificação da quantidade de microbiota no solo durante os cultivos. Foi realizada Reação da Polimerase em Cadeia (PCR), para busca no solo dos cultivos, dos bioindicadores de contaminação fecal Escherichia coli, Adenovírus sorotipos 40 e 41 e Methanobrevibacter smithii. Foi avaliado o desenvolvimento da planta como bioindicadora indireta de nutrientes no solo. Foi analisado o decaimento de E. coli e Salmonella spp. no solo com cultivo de P. crispum e solo nu, irrigados com águas de reúso e potável (controle). Análises de substâncias com atividade estrogênica foram feitas nas amostras de águas de reúso, por meio do ensaio YES (Yeast Estrogen Screen). As análises bacteriológicas e físico-químicas mostraram que apenas a água de reúso “polida” estava própria para reúso agrícola, segundo normativas nacionais e internacional. As quantificações de DNA indicaram que as amostras de água de reúso contribuíram para aumento de 1,6 vezes na quantidade de microbiota do solo, enquanto que os irrigados com água potável tiveram diminuição de 3,8 vezes. A água de reúso auxiliou para o maior desenvolvimento dos cultivos. A PCR mostrou que as amostras de água de reúso alteraram a microbiota do solo, pois ficaram retidos durante os cultivos, os microrganismos presentes nas águas de reúso, Adenovírus tipo 40 e 41 e E. coli. O decaimento de Salmonella spp. nos cultivos irrigados com água de reúso foi mais lento, em comparação com o grupo controle. A amostra “biológica” apresentou substâncias com atividade estrogênica na concentração de 115 ng L-1. O estudo demonstrou que, se a água de reúso estiver dentro dos padrões de qualidade sanitária, se for feita irrigação por gotejamento, e com um tempo de parada entre irrigação e colheita das culturas, esta representa uma fonte de água segura e sustentável para irrigação da agricultura. Para isso é fundamental a criação de lei federal de reúso agrícola, a fim de evitar danos à saúde humana e ambiental.

Introdução

Em meio à escassez de água doce para abastecimento da população em diversas regiões do mundo e no Brasil, a água de reúso vem sendo estudada e utilizada como uma fonte alternativa de água para irrigação na agricultura (MORAIS et al., 2016). A água de reúso é definida como a reutilização de águas provenientes de efluentes tratados (MORAIS et al., 2016), e pode ser classificada de acordo com a sua origem, como reúso local ou interno – proveniente de águas cinzas a partir de residências e novos empreendimentos; e reúso externo – proveniente de águas negras (esgoto bruto) de estações tratamento de esgoto e que passam na sequencia por estações de tratamento de água de reúso (ETE+ETAR) (Moura et al., 2020).

A água de reúso é um recurso bastante utilizado na agricultura, porém é fundamental a realização de estudos que verifiquem quanto o seu uso altera as características originais do solo, alterando o meio ambiente ou mesmo oferecendo riscos na rega de cultivos, ou seja, quais parâmetros de qualidade sanitária poderiam ser verificados para que a utilização deste recurso seja segura para a saúde humana e ambiental.

A agricultura é a atividade que mais consome água doce no mundo e no Brasil, cerca de 70% (FAO, 2018), e devido à escassez das fontes hídricas para esta atividade em diversas regiões, a água de reúso se torna uma alternativa para enfrentamento desse problema (URKIAGA et al., 2008). A irrigação da agricultura, geralmente, não permite o reaproveitamento direto da água utilizada nas culturas, pois é evapotranspirada pelas plantas e transformada em vapor d’água na atmosfera, e também parte da água se infiltra no solo chegando na camada subterrânea no lençol freático (CUBA et al., 2015).

A utilização de água de reúso na agricultura pode trazer benefícios como nutrientes e água, favorecendo o crescimento de plantas e reduzindo o uso de fertilizantes artificiais (EPA, 2012). A irrigação com água de reúso pode ser uma forma de fertirrigação natural, proveniente de nutrientes, como nitrogênio, potássio e fósforo, fundamentais no cultivo em solos pobres (OTENIO, 2015). Além disso, pode diminuir a pressão da demanda de água sobre os mananciais, e reduzir a quantidade de esgotos lançados nos rios (MANCUSO e SANTOS, 2013).

No entanto, a água de reúso deve ser bem gerenciada e com qualidade sanitária adequada, para que não ofereça riscos à saúde humana e ambiental (WHO, 2006). Visto que dependendo da origem e do tratamento empregado para a produção da água de reúso, pode ou não ser segura para a saúde humana e ambiental. E pode conter poluentes e contaminantes, tais como produtos químicos e microrganismos, que podem causar agravos à saúde ambiental (MOURA et al, 2020). Além disso, a transmissão de doenças pode ser diminuída e controlada por fatores agronômicos como prática de irrigação utilizada, como por gotejamento, práticas de cultura e de colheita (MORAIS et al., 2016).

No Brasil existe uma legislação federal sobre água de reúso para agricultura, que é a Resolução CNRH nº 121 de 2010, no entanto, esta não estabelece parâmetros para avaliação da qualidade sanitária para o reúso agrícola. Existem padrões de qualidade em normatizações como a Norma técnica da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), nº 13.969/97 (ABNT, 1997), que traz poucos padrões, e não é específica sobre água de reúso. Ademais, existem normatizações pontuais de alguns estados brasileiros que possuem parâmetros de qualidade sanitária para reúso agrícola. Internacionalmente, existem normatizações como nos Estados Unidos da América o “Guidelines for Water Reuse” da U.S. Environmental Protection Agency (EPA) de 2012, que trata de forma mais completa sobre água de reúso,
com parâmetros físico-químicos e biológicos, baseados em estudos científicos, de modo que esta água se torne mais segura para aqueles que a utilizam.

A busca por fontes alternativas de água para a agricultura torna a utilização da água de reúso um recurso importante para atingir a sustentabilidade. Com isto, o estudo teve como objetivo avaliar a qualidade sanitária da água de reúso de diferentes origens para uso na agricultura com finalidade de emprego sustentável da água.

Autor: Natasha Berendonk Handam.

 

Qualidade sanitária da água de reúso


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