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Cantareira chega ao fim do ano com pouco mais de 20% da capacidade

Cantareira está na fase de restrição por ter apenas 25% da capacidade de armazenamento

O sistema Cantareira, o maior de São Paulo, chegou a dezembro com 25,3% da capacidade total, o que indica fase de restrição. Apesar de não haver racionamento na capital paulista e região metropolitana, os moradores reclamam da redução de pressão nas torneiras, e o fantasma de um rodízio no abastecimento de água continua a rondar

Imagem: Divulgação Portal do Mananciais a Sabesp

No interior do estado, o racionamento virou realidade neste ano. A estiagem e as chuvas abaixo da média deixaram os reservatórios de água secos ou com nível insuficiente para garantir o pleno abastecimento à população.

Os moradores de Bauru, Franca, Valinhos, entre outras cidades, sentiram no cotidiano o impacto da interrupção no fornecimento de água.

Ana Paula Silva é assistente social e moradora do Jardim Palma, em Franca, a capital do calçado. Apesar da suspensão do racionamento, ela ainda está insegura quanto ao abastecimento.

“Cortavam água entre 11h e 12h, aí eram 36 horas sem. Voltava meia-noite do dia seguinte. Os bairros foram divididos por blocos A, B e C. Minha casa tem caixa-d’água grande e moram poucas pessoas, mas eu não lavava roupa quando tinha o rodízio e juntava louça para lavar de uma vez. Mas os condomínios ficavam sem água. Tem que se programar porque tudo depende das chuvas”, disse.

Com o passar dos meses, a queda verificada no nível de armazenamento dos sete mananciais de São Paulo foi se acentuando. Juntos, eles têm 38% da capacidade total em dezembro. Alto Tietê, Cotia e Rio Claro estão com menos da metade de água. A situação é um pouco mais tranquila nos sistemas Guarapiranga, São Lourenço e Rio Grande.

Ainda em março, quando o R7 conversou com o diretor-presidente da Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo), Benedito Braga, ele garantiu que não haveria racionamento. No entanto, o Cantareira estava com quase metade da capacidade, índice que ainda assim era pior do que o registrado em 2013, quando o estado enfrentou uma severa crise hídrica.

“Nós tivemos um inverno seco em 2020 e chuvas abaixo da média em fevereiro. Numa situação anterior à crise hídrica, poderíamos estar preocupados, mas fizemos um conjunto de obras que mudaram o papel do Cantareira. Hoje o Alto Tietê e o Guarapiranga podem atender à demanda. Há integração dos sistemas e podemos jogar com isso”, afirmou, na ocasião, Benedito Braga.

Ainda em maio, os consumidores foram surpreendidos com o aumento na conta de água e esgoto, autorizado pela Arsesp (Agência Reguladora de Serviços Públicos do Estado de São Paulo). Usuários residenciais, comerciais, industriais e públicos tiveram as tarifas médias ajustadas pelo IPCA (Índice de Preços para o Consumidor Amplo) anual de 7,6%. A exceção foi a população de baixa renda.

Sistemas de abastecimento

O Cantareira responde pelo abastecimento de 7,29 milhões de habitantes. Ele armazena aproximadamente 1,2 trilhão de litros de água, dos quais 982 bilhões de litros estão acima do nível das comportas (volume útil) e o restante está abaixo das comportas (reserva técnica).

A Sabesp abastece 21 milhões de pessoas na região metropolitana de São Paulo. São sete os sistemas produtores de água, que dispõem de 20 represas: Alto Tietê, Guarapiranga, Cantareira, Cotia, Rio Grande, Rio Claro e São Lourenço.

A situação foi se agravando ao longo do ano porque as tão aguardadas chuvas não atingiram as médias esperadas, nem mesmo após a estiagem.

Segundo a Climatempo, os acumulados de precipitação devem ficar abaixo da média também durante o verão, a estação mais chuvosa do ano.

No inverno, o acumulado foi de 119,2 mm, o que representa 79% da média, que é de 150 mm, de acordo com o Inmet (Instituto Nacional de Meteorologia). A estação foi marcada por recorde de frio e de calor e pouca chuva.

Na cidade de São Paulo, um estudo do Inmet revelou que novembro foi o mês com menos chuva em nove anos. A média normal é de 137 mm, mas o total, em 2021, foi de 98,6 mm.

Mesmo com o atual cenário desfavorável, a Sabesp insiste que não haverá racionamento.

“A projeção aponta níveis satisfatórios dos reservatórios com as perspectivas de chuvas do verão, quando a situação será reavaliada. Não há risco de desabastecimento neste momento, mas a companhia reforça a necessidade do uso consciente da água”, informou em nota.

Fase de restrição

Pelo fato de o Cantareira estar na chamada fase de restrição, quando o volume armazenado fica entre 20% e 30% da capacidade, a ANA (Agência Nacional de Águas) impõe o limite de retirada de água do sistema em 23 metros cúbicos por segundo.

Mas, segundo a Sabesp, “a companhia vem retirando do sistema o limite máximo autorizado na faixa de restrição há um ano (desde novembro de 2020), o que é possível graças à integração com os demais sistemas”.

Fonte: ANA

Com a integração dos sete sistemas, que envolvem 155 reservatórios e dez áreas de interligações, a empresa afirmou que hoje há mais segurança hídrica uma vez que a integração permite transferências de água entre as regiões, de acordo com a necessidade operacional.

Mas a interligação do rio Itapanhaú ficou para março de 2022. Com o início da operação, a expectativa é transferir 400 litros de água por segundo do rio para o sistema Alto Tietê. Até julho do ano que vem, segundo a Sabesp, serão em média 2.000 litros por segundo.

No entanto, moradores de diferentes bairros relatam que a água não chega sempre às torneiras e há redução de pressão não só mais durante a madrugada.

A diminuição da vazão, que antes começava às 23h, é feita a partir das 21h ou ainda antes. Às 5h, o fornecimento é normalizado. Em casas sem caixa-d’água, especialmente em locais mais altos e distantes, a redução acaba se transformando em interrupção do abastecimento.


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Investimentos e perdas

No início de outubro, o Governo de São Paulo anunciou a criação do programa Água É Vida, que pretende reforçar a segurança hídrica e beneficiar mais de 2,1 milhões de moradores no estado.

Entre as ações estão a perfuração de 138 poços em mais de 200 cidades não atendidas pela Sabesp, o desassoreamento e revitalização de rios, além do aceleramento do processo de licenciamento ambiental de barramentos em propriedades rurais para abastecimento humano e de animais. O investimento imediato previsto foi de R$ 400 milhões.

“Vivemos hoje a situação de crise hídrica, momento de mudanças climáticas. Esperávamos outra crise daqui a uns 20 anos, mas depois de cinco anos estamos com o mesmo dilema. Não adiantam medidas paliativas e corretivas, mas sim preventivas, olhando para o futuro dos municípios, para enfrentar eventos extremos”, destacou o secretário de Infraestrutura e Meio Ambiente, Marcos Penido.

Desde a crise de 2013, um conjunto de medidas foi adotado para garantir a segurança hídrica e a preservação dos mananciais. Entre elas: a integração dos sistemas com transferências de água rotineiras entre regiões, ampliação da infraestrutura, gestão da pressão noturna para reduzir perdas na rede e campanhas para o consumo consciente.

O Brasil tem perdas de água potável que dariam para abastecer 63 milhões de pessoas em um ano. De acordo com estudo do Instituto Trata Brasil, em 2019, 39,2% da água captada não chegou às residências do país, o que representa um volume equivalente a 7,5 mil piscinas olímpicas de água tratada desperdiçada diariamente ou sete vezes o volume do Cantareira.

Do total, 60% são perdas físicas, como vazamentos e problemas na rede de tubulação e ramais. Segundo o levantamento, o volume seria suficiente para levar água aos quase 35 milhões de brasileiros que até hoje não têm acesso ao recurso ou abastecer mais de 13 milhões de moradores de favelas por quase três anos.

“As perdas são comuns no Brasil. Nos últimos cinco anos, a média foi de 36,7% e a expectativa era de redução paulatina do índice, mas, em 2019, ele chegou a 39,2%, o que indica uma tendência de aumento”, explicou barra Scazufca, pesquisador do estudo de perdas de água do Instituto Trata Brasil.

De acordo com a Sabesp, nos 375 municípios atendidos, com a troca de ramais e hidrômetros e a inspeção das tubulações para identificar vazamentos e fraudes, houve queda do índice de perdas totais de 41%, em 2004, para 27%, em 2020. O indicador está abaixo da média nacional.

O problema é um dos grandes desafios a serem enfrentados, segundo Luana Siewert Pretto, diretora de relações institucionais e governamentais da Asfamas (Associação Brasileira dos Fabricantes de Materiais para Saneamento).

“A grande questão é a sustentabilidade. Água é um recurso finito, e vai ter que se investir em redução de perdas porque, no futuro, não vai ter mais de onde tirar água. Órgãos licenciadores estão cada vez mais rígidos nas outorgas de captação. As mudanças climáticas estão exigindo isso, e não tem mais como fugir”, assegura.

Estratégia de guerra

Com reservatórios secos ou em níveis insatisfatórios para abastecimento, as chuvas de verão são ansiosamente aguardadas. No entanto, elas devem ficar abaixo da média no centro-sul do país pelo oitavo ano, segundo a Climatempo.

Especialistas defendem o uso de cisternas, o desassoreamento de rios e a perfuração de poços artesianos para o enfrentamento da crise hídrica.

“É uma estratégia de guerra. Precisamos reter o máximo de água de chuvas possível e não permitir o escoamento para outros países. Vamos estar preparados para não perder uma gota dessa chuva torrencial que virá no verão. Com cisternas, piscinões e reservatórios municipais, você armazena essa água”, ressaltou Francisco Lahóz, secretário-executivo do Consórcio PCJ (Consórcio Intermunicipal das Bacias dos Rios Piracicaba, Capivari e Jundiaí).

Em Vinhedo, a 81 km da capital paulista, o racionamento continua. São 48 horas com e 24 horas sem abastecimento. O município produz 270 metros cúbicos de água por hora, mas consome 560 m³/h. Na terra das uvas, o rodízio foi inevitável porque, em outubro, os reservatórios estavam em níveis críticos, segundo a Sanebavi (Saneamento Básico Vinhedo). Na ocasião, a mesma medida foi adotada por ao menos 14 cidades da região.

Foram três crises hídricas só neste século. Até então a mais recente, a de 2013, fez com a que população reduzisse até 20% do consumo de água. Hoje a economia está na casa dos 10%.

“Apesar da criação do sistema São Lourenço e de todas as obras e ações da Sabesp, temos hoje 20% menos água armazenada do que no mesmo período de 2013. Os indicadores estão piores, e outros sistemas estão com níveis mais baixos, além do Cantareira. Podemos ter problemas importantes de abastecimento com pouca chuva até abril, e depois já começa a estiagem”, destacou Pedro Luiz Côrtes, professor de pós-graduação em ciência ambiental do Instituto de Energia e Ambiente da USP.

De acordo com o Inmet, este verão deve ter entre 20% e 40% menos chuvas do que a média da série histórica.

“Se for isso, eu ainda vou comemorar. Porque, se for 20%, teremos 80% de chuvas e, se for 40%, 60% de chuvas. Chove 17,5% menos a cada ano com os eventos climáticos extremos, como o aquecimento global, a alta de desmatamentos e o La Niña [resfriamento das águas do Pacífico]”, lembrou Francisco Lahóz.

Já Pedro Luiz Côrtes vê chances reais de problemas no abastecimento no ano que vem.

“Teremos um volume ainda menor de armazenamento em 2022. A Sabesp deve intensificar a redução de pressão da água, o que não deixa de ser uma forma de rodízio, mesmo que em algumas horas, porque chega a faltar água”, conclui.

Fonte: R7


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