A poluição dos rios que cortam a maior metrópole da América Latina, os rios Pinheiros e Tietê, é resultado direto do lançamento de esgotos domésticos sem o adequado tratamento
A Fiesp realizou no dia 9 de outubro em São Paulo, o Seminário: “A despoluição dos rios. ” O evento teve como objetivo, promover debate sobre a necessidade da melhoria da qualidade dos rios, abrangendo desde o planejamento de médio e longo prazo, a necessidade de investimentos, a integração das políticas públicas nos seus diferentes níveis de atuação, bem como um olhar sobre o passado, buscando não repetir os mesmos equívocos para avançarmos e termos resultados concretos de despoluição dos rios.
Após mais de 30 anos de inúmeros projetos de despoluição destes rios, que envolveram mais de 3 bilhões de dólares, a sociedade continua convivendo com rios altamente degradados.
Com o tema “Qual é o Projeto de Despoluição do rio Pinheiros? ”, o evento foi inaugurado por Jose Eduardo Cavalcanti, Conselheiro do Conselho Superior de Meio Ambiente- COSEMA da FIESP.
O especialista apresentou, a situação atual da infraestrutura sanitária na Bacia do Rio Pinheiros:
- População na bacia:3,3 milhões de pessoas
- Municípios envolvidos: São Paulo, Taboão e Embu das Artes
- Área total:271 km2
- Ligações de esgotos:1.048.316
- Total de economias na bacia: 1.138.932
- Esgoto coletado:85,6%
- Esgoto tratado: 47,9%
“O canal Pinheiros entremeia regime hidrodinâmico misto entre lêntico (ambientes aquáticos de água parada, como por exemplo, lagoas, lagos, pântano, etc.) e lótico (ambientes aquáticos de água corrente, como por exemplo rios, nascentes, ribeiras e riachos) ”. Qualidade da água, resultados típicos:
- Condutividade varia de 258 a 629 μS/cm
- Oxigênio dissolvido entre < 0.1 mg/L a 10 mg/L
- Sulfetos de 1.3 a 2.7 mg/L
- Turbidez de 29 a 278 NTU
- COT entre <1 e 45.8 mg/L
- Fósforo entre 0.07 e 5.7 mg/L
- DBO entre 70 e 150 mg/L
Afluentes que sujam o Rio Pinheiros
Alguns córregos receberão redes de esgoto; outros, miniestações de tratamento.16 dos 25 principais afluentes do Rio Pinheiros ainda não foram saneados – Imagem: Arte /G1- 08/2019
Eduardo Cavalcanti pediu participação dos municípios de São Paulo, Taboão da Serra e Embu das Artes, que seriam responsáveis pela limpeza da margem dos córregos, galerias pluviais, reurbanização de fundos de vales ocupados e fiscalização de imóveis não-conectados à rede coletora. Também seria competência das prefeituras o plano de comunicação do projeto.
Outro ponto comentado, foi sobre os ensaios em planta piloto para atingimento classe 4 (águas que podem ser destinadas à navegação e à harmonia paisagística):
- Aplicação de ativadores biotecnológicos
- Adição de peróxido de hidrogênio
- Adição de coagulantes químicos, ar micro pulverizado e remoção por flotação
- Eletrocoagulação com a liberação de oxidrilhas
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Projeto Novo Pinheiros
Fonte: Jose Eduardo Cavalcanti
“O Projeto Novo Rio Pinheiros possui como metas, coletar mais 73 mil economias elevando o percentual de esgoto coletado para 93%. Encaminhar pelo menos 498mil economias para tratamento, elevando o percentual de esgoto tratado para 93% e manter uma DBO média no rio em no máximo 30mg/L”, destacou.
Cavalcanti pontuou sobre as intervenções da Sabesp no Projeto Novo Pinheiros entre elas: executar coletores-tronco, obras de remanejamento, prolongamentos e interligações na rede existente das sub bacias, viabilizar as ligações de esgotos de economias em áreas irregulares, incrementar seu programa “caça esgoto”, “se liga na rede” e implantação das estações de tratamento (ETAIS).
Como proposições sobre o Projeto, ele defendeu o controle da poluição difusa por meio de containers de lixo, priorizar implantação de sistema de coleta em tempo seco e a transposição do efluente tratado da Estação de Tratamento de Esgoto (ETE) Barueri até Retiro.
Marcelo Reis, do Movimento Volta Pinheiros explicou que o Volta Pinheiros é um movimento apartidário que luta pela despoluição do Rio Pinheiros. Busca reunir diversos atores da sociedade para dialogar sobre o assunto: cidadãos, prefeitura, governo do Estado (Sabesp, DAEE, EMAE, CETESB).
“Hoje, não são aceitas as linhas gerais do projeto apresentadas através dos meios de comunicação ou canais oficiais e cobramos pelo projeto completo do “Novo Pinheiros”, para conhecer orçamento detalhado, prazos, metas e empresas envolvidas. O poder público tem a obrigação de fornecer essas informações a todos os cidadãos (sem que para isso necessite recorrer a Lei de Acesso à Informação). A palavra-chave é “transparência”, afirmou.
“O que temos até hoje, foi muito discurso por parte dos governantes, mas pouco apresentado oficialmente, a confiança política é uma grande dificuldade. Sabemos que R$ 70 milhões serão investidos em desassoreamento via EMAE, a meta da primeira etapa: 1,2 milhão de m3, não foram informadas todas as etapas. Investimento de R$1,5 bilhão no Projeto Novo Pinheiros, sem BNDES, mas contando com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) e com New Development Bank. E mais R$3,1 bilhões de iniciativa privada através de Parcerias Público-Privadas (PPPs). Vários grupos chineses se interessaram. Duas licitações estão concluídas (Zavuvus e Pedreira), duas estão em fase final do processo. (Ponte Baixa/Pedreira e Corujas/Rebouças). Espera-se ter todas as 14 licitadas no mês de outubro, em novembro, está previsto publicar o edital das estações de tratamento das áreas informais”, explicou.
Além do governador Doria, vários governos já usaram o rio como plataforma política
Fonte: Marcelo Reis/Movimento Volta Pinheiros
Uma novidade comentada por Marcelo Reis é que a estação de tratamento de recuperação da qualidade da água será colocada diretamente nos córregos para não poluir o Rio Pinheiros e a coleta de lixo flutuante/Ecoboat virá para dentro do afluente. As empreiteiras entram com o investimento, mas se a Demanda Bioquímica de Oxigênio (DBO) não for menor que 30mg/L as futuras empresas não recebem. Os consórcios/empreiteiras terão que ligar 500 mil residências que ainda jogam diretamente no Rio Pinheiros.
Fonte: Marcelo Reis/Movimento Volta Pinheiros
Fonte: Marcelo Reis/Movimento Volta Pinheiros
Ressaltou que para os governos, o legado é eterno. Trazer de volta o Rio é exemplo de seriedade e respeito:
- Criação de receita através de geração de energia e reúso da água
- Parte da história da cidade
- Pensamento longevo
- Exemplo de que a mudança é possível
- Gestão competente
- Projeção nacional
- Respeito ás futuras gerações
Para as empresas, o benefício é imenso trazendo os cidadãos de volta ao convívio com o Rio Pinheiros:
- Esportes: revitalização da ciclovia e criação de pista de running.
- Alimentação e Bebidas: quiosques, bares e restaurantes.
- Construção, Homecare, Saúde: cuidado com os pomares e jardins.
- Automotivas e Mobilidade: balsas de transporte de passageiros.
- Esportivas, Alimentação: escolas de esportes e áreas de treino.
- Banco, Telefonia, Infraestrutura, Serviços: eventos musicais, artísticos e culturais.
“Atualmente o capital da Sabesp está assim dividido: 50,3% nas mãos do Governo do Estado de São Paulo e 49,7% para corporações privadas. O lucro no semestre de 2019 foi de R$ 1,1bilhão e os dividendos aos acionistas em R$307 milhões. A Sabesp é muito mais que uma ferramenta política e econômica, que empresa tem em seu core de negócio um benefício social? Acreditamos que o governo tem o projeto correto sim, mas não terá tempo hábil e compromisso de fazê-lo acontecer”, concluiu Marcelo Reis.
“Tecnicamente é possível despoluir os rios da Região Metropolitana de São Paulo (RMSP), dentro de características específicas. Programas de despoluição não tem prazo definido e requerem grandes investimentos para se alcançar resultados. Fixar datas em um programa é o primeiro passo para o insucesso. ” A declaração é de Roberto Teixeira França, ex-coordenador do Plano Diretor de Esgotos da Região Metropolitana de São Paulo.
Para França, diversos fatores se somam para que não se tenham alcançado resultados satisfatórios:
- Posição geográfica da região
- Urbanização caótica
- Disponibilidade de recursos
- Vontade política efetiva
- Poluição difusa
- Desenvolvimento conjunto de outros programas
“A poluição difusa é o grande vilão. Se na RMSP a população gera através dos esgotos cerca de 1.100 t/dia da DBO, a carga difusa que contribui aos rios é da ordem de 360 t/dia. Se nessa mesma região fosse alcançado 98% de redução da DBO nas ETEs, a carga remanescente seria de aproximadamente 22 t/dia da DBO, enquanto a carga difusa permanece da ordem de 340 t/dia, ou 15 vezes”, comentou.
Imagem: WIKIPEDIA COMMONS
Distribuição porcentual das categorias do Índices de Qualidade das Águas (IQA) em 2017 em função da época do ano
Fonte: Cetesb
Enquanto no Tempo Seco a soma de Péssimo/Regular/Ruim do IQA é de 29%, no Tempo Chuvoso é de 35%, ou seja, efeito da diluição.
Já a soma Ótimo/Bom passa de 71% para 65%, ou seja, efeito da difusa.
Como problemas dessa situação:
- Coleta com economias não ligadas
- Ligação de esgoto na rede pluvial
- Descarga de coletores nos córregos
- Lixo não coletado
- Lixo descartado em vias públicas
- Descontinuidade no transporte dos esgotos
Roberto Teixeira França, encerrou a apresentação com as seguintes conclusões e recomendações:
- Verificar as sub-bacias que contribuem com maior carga poluidora aos rios
- Analisar os pontos de descontinuidade do sistema coletor
- Identificar ligações não efetivadas na rede coletora
- Identificar ligações clandestinas de esgotos
- Verificar ociosidade do sistema de interceptação e possibilidade de condução das águas dos córregos
- Analisar as alternativas de reassentamento da população face à implantação de pequenas ETEs ao longo dos córregos
- Atuar paulatinamente nas bacias dos córregos afluentes de montante para jusante
- Só “deslocar” a ação quando efetivamente eliminadas as contribuições poluidoras
- Implantar PROGRAMAS:
- Financiamento das ligações prediais – condição básica de adesão
- Programa de Melhoria da Qualidade da Água – destinado às escolas de Ensino Básico; base para educação sanitária e ambiental futura
- Entidade Metropolitana – a solução efetiva depende da atuação conjunta das autoridades municipais