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Gestão de riscos em empresas de saneamento

A grave seca que atingiu os estados do sudeste brasileiro entre 2013 e 2015 apontou vários desafios a pessoas e empresas, com a pouca disponibilidade de água potável para o consumo humano, além de diversos outros usos como geração de energia, agricultura e insumo de processos produtivos. Esta escassez hídrica retratou a vulnerabilidade que diversas empresas e setores da economia apresentam quando se aborda sobre a gestão do risco hídrico.

Um exemplo atualmente, muito veiculado na mídia é o caso Samarco, uma empresa de mineração, muito dependente da água. Em 2014, a ampliação das atividades mineradoras da empresa fez com que fossem captados 40 milhões de m³ de água, 74% a mais do que em 2013 e quase seis vezes o consumo dos domicílios. É bom salientar que o empreendimento em questão tem uma de suas principais plantas no município de Mariana em Minas Gerais, cidade que passou por grave escassez hídrica.

Especialistas no tema, afirmam que o planeta está mudando devido à ação antrópica ou da própria natureza, por isso é necessário planejamento para que os danos maiores sejam evitados. No Brasil, as companhias de saneamento ainda não introduziram devidamente esse assunto na pauta de seus objetivos estratégicos, porém algumas ações ou iniciativas pontuais para minimizar danos na estrutura e na prestação dos serviços de água e esgoto, em caso de catástrofes climáticas ou acidentes, estão sendo executadas. Mais importante que a capacidade de reagir de modo apropriado e ágil é a adoção de medidas preventivas que reduzam os riscos à integridade física das pessoas e de danos materiais. Apesar do Brasil ser privilegiado no que se refere à suscetibilidade a catástrofes que envolvem abalos sísmicos, erupções vulcânicas, maremotos e outros desastres naturais, temos de lidar com fenômenos naturais danosos e recorrentes como, por exemplo, inundações e secas, sem que haja um planejamento sobre as possíveis ações preventivas, nem a elaboração de planos de contingência.

Mitigar o risco de ter que restringir, ou até mesmo suspender, os processos produtivos particularmente em atividades com uso intensivo de água, é necessário, mas nem sempre é simples. Internamente, os processos são otimizados e com pouco espaço para aperfeiçoamento, portanto, é necessário fazer uso de soluções mais modernas, entre elas o reúso de água e o investimento em infraestrutura urbana.

O reúso da água é uma forma muito eficiente para garantir a oferta, diminuindo a dependência de chuvas e a pressão sobre os mananciais. Existem várias experiências exitosas de empresas que reusam água, uma que merece destaque é o Aquapolo Ambiental, resultado de parceria entre Odebrecht Ambiental e SABESP, que fornece 1m³/s para o polo petroquímico do ABC Paulista. A água de reúso é uma excelente opção para a crise hídrica na qual o Brasil atravessa. A reutilização da água possibilita o uso sustentável de recursos hídricos, diminui a quantidade de esgoto despejado nos rios e lagos, além, de aumentar a disponibilidade para fins em que há necessidade de potabilidade.

Uma das apresentações sobre o tema, “Estruturação e implementação da gestão de riscos operacionais no processo de distribuição de água da Região Metropolitana de São Paulo – RMSP”, faz parte dos Anais do Encontro Técnico AESabesp / Fenasan 2016.

O projeto teve como autores, os engenheiros da Sabesp, Marcel Costa Sanches, Reynaldo Eduardo Young Ribeiro, Arnaldo Nóbrega Ramos e André Carmo.

O trabalho, estrutura e implementa um modelo de Gestão de Riscos Operacionais no processo de Distribuição de Água da RMSP tendo como objetivo a mensuração dos riscos e suas priorizações para propor ações que permitam corrigi-los. Também foram elaborados Planos de Contingência para minimizar as ocorrências de materialização dos riscos. A metodologia utilizada foi extraída das referências que consolidam as boas práticas de gestão de riscos e controles internos: COSO ERM / ISO 31.000 / WHO – Guidelines for Drinking-W ater Quality. A estrutura proposta está adequada para identificação, análise, avaliação de riscos, tratamento e monitoramento. Os resultados mais significativos estão relacionados à identificação dos Setores de Distribuição mais críticos, proporcionando a possibilidade de focar os esforços operacionais e recursos orçamentários nesses locais onde são necessários maiores níveis de atenção, contribuindo, desta forma, a regularidade do abastecimento da RMSP.

Em fevereiro de 2007 foi publicada a Lei 11.445/2007 que rege as diretrizes nacionais para o saneamento básico, ordenando, dentre outras questões, a identificação dos riscos a formalização de planos de contingencias. Consequentemente, a Sabesp busca adequar um sistema de gerenciamento de risco para proporcionar um atendimento mais adequado às demandas dos seus stakeholder.

Desta forma, em junho de 2013, todas as Unidades de Negócio envolvidas no Processo de Distribuição de Água do Sistema Integrado da RMSP, reuniram-se para iniciar uma avaliação de riscos estruturada e alinhada com os diferentes atores para preservar e aumentar a segurança de seus sistemas de distribuição de água à população.

Outro grande fator motivador para execução do projeto ocorreu com a realização por alguns jogos da Copa do Mundo de 2014, onde Ministério da Justiça, por meio da Secretária Extraordinária de Segurança para Grandes Eventos, determinava: “fortalecer o policiamento ostensivo nos pontos sensíveis e críticos, ressalvadas as competências de outros órgãos, em especial nos locais de infra-estrutura, sistemas de telecomunicações, de fornecimento de energia, iluminação, gás, abastecimento de água e  outros”.

Segundo o COSO (2004), a gestão de riscos contribui para assegurar comunicação eficaz e o cumprimento de leis e regulamentos, bem como evitar danos à reputação da organização e suas consequências.  Em suma, a gestão de riscos ajuda a organização a atingir seus objetivos e a evitar os perigos e surpresas em suas atividades.

Objetivo

O projeto tem como objetivo: Estruturar e Implementar a Gestão de Riscos Operacionais no processo de Distribuição de Água da Região Metropolitana de São Paulo – RMSP. As ações a serem realizadas para atingir o objetivo geral do projeto e também aplicá-lo em outras situações são:

  • Alinhar a Gestão de Riscos Operacionais aos conceitos do Plano de Segurança da Água-PSA;
  • Verificar quais são os riscos do Processo de Distribuição;
  • Mensurar os riscos identificados e prioriza-los;
  • Propor as ações que permitam corrigir potenciais eventos que possam comprometer o sistema;
  • Elaborar Planos de Contingência para restabelecimento dos processos.

Materias e Métodos

A dificuldade na gestão do processo de distribuição de água toma-se evidente quando se observa a complexidade e o elevado número de componentes envolvidos e a deficiente quantidade e qualidade de informações disponíveis no processo de tomada de decisão. Diante desses fatores a ocorrência do processo de tomada de decisão é diante de riscos e incertezas.

Certamente, é sensato para se tomar uma decisão contextualizada o gerenciamento dos riscos dos processos na distribuição de água. A finalidade da gestão de riscos é a tomada de decisões baseada nos resultados da análise de riscos, sobre quais riscos precisam ser tratados e sobre as prioridades de tratamento.

Entre os diversos modelos de gestão de riscos disponíveis, foram utilizados para o desenvolvimento desse projeto o elaborado pelo Comitê das Organizações Patrocinadoras-COSO (Committee of Sponsoring Organizations of the Treadway Commission – Enterprise Risk Management), o processo de Gestão de Riscos segundo a norma ISO 31000 e da Organização Mundial da Saúde-WHO (Guidelines for Drinking-Water Quality), conforme figura 1:

Figura 1: Referências da metodologia de Gestão de Riscos adotadas ao projeto

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Essas referências consolidam as boas práticas de gestão de riscos e controles internos, pois as estruturas propostas, conforme a Figura 2, estão adequadas para identificação, análise, avaliação de riscos, tratamento e monitoramento. 

Figura 2: Framework aplicado aos trabalhos

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Resultados

Para atender a demanda, o projeto abrangeu o Processo de Distribuição de Água da RMSP, composto de 157 setores de abastecimento e responsável pelo fornecimento de água para uma população aproximada de 16 milhões de pessoas.

Foram organizados grupos de trabalhos com especialistas no sistema de abastecimento das diversas Unidades de Negócio. Esse grupo, no primeiro momento, identificou e avalizou um portfólio de riscos que contemplava os principais problemas. Esses eventos foram sintetizados em 8 (oito) riscos, conforme portfólio do Quadro 1.

Quadro 1: Portfólio de Riscos do Processo de Distribuição de Água

(Clique na imagem para ampliar)

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Foram definidas as métricas para priorização dos riscos em uma matriz cartesiana onde o eixo X trata a probabilidade da materialização do evento e o eixo Y o impacto proporcionado por essa materialização.  A seguir, na Figura 3, matriz utilizada para eleger a criticidade dos riscos.

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O impacto foi identificado, inicialmente, na quantidade de população atingida. No entanto, para alguns casos, foi analisado o impacto quanto à saúde pública, reputação e imagem, legal e ao meio ambiente.

Após a definição da abrangência do projeto e suas premissas para aplicação da metodologia de avaliação, iniciou-se a priorização dos setores a serem submetidos a mensuração dos impactos e probabilidade. Na Tabela 1 segue os resultados consolidados dos setores de abastecimentos avaliados:

Tabela 1: Quantidade de setores pontuados

(Clique na imagem para ampliar)

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Os resultados das avaliações de criticidades foram plotados na matriz cartesiana e, também, em um mapa temático da RMSP subdividido por setor de abastecimento, permitindo identificar pontual onde estão ocorrendo os eventos mais críticos. Esse mapa demonstra uma visão espacial das avaliações dos setores por risco. Segue, na Figura 4, exemplo de um dos mapas de criticidade dos riscos para a condição de indisponibilidade de energia na reservação de água.

Figura 4: Mapa de visão espacial das avaliações dos setores

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Para os setores de abastecimentos classificados como risco crítico, os responsáveis estabeleceram planos de ação para evitar a materialização do risco, trazendo-o para uma condição de probabilidade e impacto aceitável. Todos os planos de ação a serem implementados foram suportados, para serem desenvolvidos, pelas áreas de engenharia, contemplando prazos e valores necessários para sua realização.

Além dos planos de ação, foram gerados planos de contingência para as diversas situações de riscos, dotando dessa forma a empresa de parâmetros mínimos necessários para o restabelecimento dos processos vitais, num estado aceitável, evitando uma paralisação prolongada que possa gerar prejuízos à Companhia e a população.

Conclusão

A Gestão dos Riscos Operacional apresentou-se como resposta para assegurar a identificação, análise, avaliação, tratamento e monitoramento contínuo dos riscos, proporcionando o aperfeiçoamento do processo de tomada de decisões a partir do conhecimento prévio e estruturado dos riscos e seus impactos, conforme segue:

  • Definir antecipadamente ações que permitam corrigir potenciais eventos que possam comprometer o abastecimento da RMSP;
  • Monitorar continuamente riscos, controles e ações de melhoria;
  • Consolidar a cultura de riscos nas Unidades, atuando de forma pró-ativa;
  • Prover informações aos gestores do negócio de modo a maximizar o desempenho e não afetar a continuidade do abastecimento;
  • Melhorar os níveis de governança corporativa, pois torna mais transparente o perfil do Processo de Distribuição de Água.

No entanto, os resultados mais significativos ao adequarmos uma metodologia com envolvimento das equipes foram à identificação dos Setores de Distribuição mais críticos, possibilitando focar os esforços operacionais e recursos orçamentários nesses pontos que requerem maior nível de atenção, garantindo assim a boa gestão do abastecimento da RMSP. Também foram elaborados Planos de Contingência para restabelecimento os processos na ocorrência da materialização dos problemas, mitigando os impactos à população.

Finalmente, esse trabalho buscou aperfeiçoar o processo de tomada de decisões a partir do conhecimento prévio e estruturado dos riscos e seus impactos, aperfeiçoamento a prestação dos serviços públicos de saneamento, promovendo a maior eficácia, eficiência e perenidade do negócio e a regularidade do abastecimento da RMSP.

Recomendações

Devido a esse projeto ter atingido seus objetivos, recomendamos a estruturação e implementação da Gestão de Riscos Operacionais às demais Unidades da Corporação e, também, a outros processos de negócio, tais como os Processos Coleta e Tratamento de Esgoto.

Este trabalho assim como os Anais do Encontro Técnico AESABESP 2016, podem ser acessados na íntegra, através do link abaixo:

http://www.fenasan.com.br/

Em parceria com o Portal Saneamento Básico, o SINDCON (Sindicato Nacional das Concessionárias Privadas de Serviços Públicos de Água e Esgoto) realizará no dia 26 de outubro o curso inédito sobre Riscos em Empresas Prestadoras de Serviço de Água e Esgoto: investimentos e instrumentos de gestão, aberto a associados da entidade e demais interessados.

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Detalhes em: https://tratamentodeagua.com.br/cursos-e-eventos/

 

Gheorge Patrick Iwaki
[email protected]
Responsável Técnico

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