NOTÍCIAS

Falhas no controle da captação de água podem levar a nova crise hídrica, diz Tribunal de Contas do DF

Relatório mostra que Agência Reguladora de Águas desconhece quantas outorgas foram concedidas por ela mesma’. Adasa nega situação.

falha-captacao-agua

Uma auditoria divulgada nesta semana pelo Tribunal de Contas do Distrito Federal apontou uma série de falhas no controle de autorizações concedidas pela Agência Reguladora de Águas (Adasa) para captação de recursos hídricos na região.

Segundo o documento, o órgão “desconhece quantas outorgas foram concedidas por ela mesma”. Essas outorgas são dadas a agricultores, indústrias, condomínios ou mesmo a moradores que retiram água diretamente de poços, ou do leito dos rios.

“O grave desconhecimento do total de usuários pode levar o DF a uma crise hídrica sem precedentes, além de ter impacto em outras unidades da federação”, diz o documento.

O levantamento foi feito no ano passado, e o resultado, divulgado nesta terça-feira (12). De acordo com a auditoria, os dados “são alarmantes”, agravados pelo fato de que os usuários não pagam por esse recurso.

Pelas regras em vigor, hoje, quem tem outorga de captação direta só paga conta de água se usar alguma estrutura da Caesb no processo. Quem faz tudo “por conta própria” recolhe a água de graça.

captacao-agua

Captação de água no Núcleo Rural Rio Preto, em Planaltina (DF) — Foto: Gabriel Jabur/Agência Brasília

Captação de água

As outorgas são autorizações emitidas pela Adasa que permitem, por um prazo determinado, a captação de água em lagos, rios e nascentes do DF. O registro da concessão também é obrigatório para abastecimento de caminhões-pipa e até para regularização de barragens.

“Essas captações de água interferem na quantidade de recurso disponível para abastecimento nos reservatórios da região”, diz uma das conclusões no relatório.

Além disso, os especialistas afirmam que a água presente no subsolo é uma “reserva estratégica para os momentos de escassez” e, por isso, o controle sobre a emissão das outorgas seria fundamental para evitar cenários de desabastecimento.

Em nota, a Agência Reguladora informou que concede outorgas de direito de uso de recursos hídricos desde 2005. “Ao longo de 13 anos, a Adasa emitiu 32.135 atos de outorga”. Além disso, até esta terça (12), haveria 9.743 pontos autorizados para captação, sendo a maioria (6.032), de águas subterrâneas.

“Todos eles estão devidamente georreferenciados”, diz o comunicado. O órgão afirma, ainda, que não há, portanto, “nada que indique a possibilidade de retorno de uma crise hídrica” (leia a íntegra mais abaixo).

agua

Estrutura de captação de água no Córrego do Bananal, no DF — Foto: Dênio Simões/Agência Brasília/Divulgação

40 anos de defasagem

Outra suposta falha apontada pelos auditores é a falta de informações, no banco de dados da Adasa, sobre as reservas de água subterrâneas e as bacias – como a do Descoberto – que cortam o DF.

Além disso, a equipe do TCDF afirma que não encontrou uma padronização para o cálculo da quantidade de água que pode ser retirada desses locais e o que considera “mais grave”: que a concessão de novas outorgas “é feita com base em dados desatualizados”.

“Há situações em que os dados de referência estão defasados há cerca de 40 anos. É o caso da Estação São Marcos, em que as informações mais recentes são referentes ao período de 1978 a 1980.”

agua-1

Barragem do Descoberto, no Distrito Federal, bate 100% e volta a transbordar — Foto: Fabiano Andrade/TV Globo

Nível dos reservatórios

Em Brasília, o reservatório do Descoberto – principal que abastece a região – operava com 100% da capacidade, segundo a medição feita no fim da manhã desta terça-feira (12).

Já a bacia de Santa Maria opera com 70% da capacidade. O volume é o maior desde junho de 2016.

Mudanças previstas

Um estudo encomendado pela Adasa no ano passado indicou que, se quiser, o governo pode cobrar pelo uso da água de três dos principais rios da capital: o Corumbá, o Maranhão e o Preto.

A medida, segundo o governo, é prevista na Constituição Federal e já é aplicada em estados como Ceará, Rio de Janeiro e Rio Grande do Sul. A Agência Reguladora prevê que os primeiros boletos pelo uso dos rios sejam emitidos já em 2021.

As faturas devem afetar principalmente os produtores rurais, que puxam água diretamente dos rios para irrigação e criação animal. De acordo com a Adasa, outras captações de água – para aquicultura e turismo, por exemplo – também estarão sujeitas à cobrança. O governo não divulgou os valores previstos para a cobrança.

Água grátis

Atualmente, os produtores e donos de propriedades às margens do rio não pagam pela água. Isso acontece porque, teoricamente, o acesso à água é um direito universal. A conta urbana da Caesb, por esse entendimento, se refere aos custos de operação do sistema, e não, à água consumida.

Como essa captação direta no leito do rio não usa a estrutura da Caesb, em tese, o acesso é gratuito – mas não ilimitado. Na época do racionamento, por exemplo, o governo chegou a limitar o ritmo de captação e o fornecimento das outorgas para evitar um colapso dos rios.

Leia abaixo a íntegra da nota da Adasa:

NOTA

A Agência Reguladora de Águas, Energia e Saneamento Básico do Distrito Federal (Adasa) aguarda o recebimento oficial do relatório do TCDF para que possa analisá-lo em profundidade, fazer suas considerações e elaborar um plano de ação para sanar eventuais deficiências. Para isso, terá prazo de 60 dias, a partir do recebimento.

Com base nas informações divulgadas pela imprensa, a Adasa esclarece que:

a) A situação atual dos recursos hídricos do Distrito Federal é adequada para este período do ano, e a infraestrutura de produção e distribuição de água para a população encontra-se em condições muito diferentes dos anos anteriores, quando existia uma situação de escassez. Não há, portanto, nada que indique a possibilidade de retorno de uma crise hídrica.

b) Concede outorgas de direito de uso de recursos hídricos desde 2005 e atua continuamente no aperfeiçoamento de metodologias para a implementação deste instrumento de gestão da água. Ao longo de 13 anos, a Adasa emitiu 32.135 atos de outorga (que incluem requerimentos, outorgas prévias, renovações, revisões e cancelamentos), e hoje existem 9.743 pontos outorgados, dos quais 3.711 são de águas superficiais e 6.032 de águas subterrâneas. Todos eles estão devidamente georreferenciados.

c) A água consumida pelos maiores usuários do DF, tais como a Caesb, no abastecimento público, os grandes agricultores que praticam irrigação por pivô central e todos os grandes empreendimentos que exigem licenciamento ambiental já estão outorgados e são monitorados. Portanto, parte significativa do volume total consumido no DF é conhecido e é levado em consideração na emissão de novas outorgas. Assim, a Adasa tem pleno conhecimento do volume outorgado até o momento e do potencial impacto que este representa na disponibilidade hídrica de cada bacia hidrográfica do DF, dados que foram fundamentais para o enfrentamento da crise hídrica.

d) Os procedimentos adotados na emissão de outorga estão estabelecidos na Resolução nº 350, de 23 de junho de 2006, que vem sendo sucessivamente revisada e atualizada, tendo a última revisão sido feita em 2017, e em outras resoluções. Além disso, a Adasa já faz a gestão integrada entre águas superficiais e subterrâneas, fato relevante e inovador no Brasil, conforme sua Resolução nº 16, de 18 de julho de 2018.

e) Os dados utilizados para a definição de volumes outorgados são provenientes de 55 estações fluviométricas de monitoramento colocadas pela Agência em pontos estratégicos das áreas de maior demanda. Além disso, utiliza dados do INMET, ANA, Embrapa, Caesb, Ibram, e do Plano de Gerenciamento Integrado de Recursos Hídricos, aprovado, por unanimidade, em 2012 pelo Conselho de Recursos Hídricos do DF.

f) Tem planos de fiscalização programadas e de atendimento a situações eventuais, com o objetivo de identificar irregularidades quanto à regularização de canais de irrigação, de acesso dos pontos de captação por caminhão-pipa, e principalmente, dos usos de recursos hídricos e outorgas. Apenas em 2018, a Adasa realizou cerca de 1.580 ações de fiscalização. Além disso, realiza campanhas de regularização de usuários de recursos hídricos. Entre 2015 e 2017, um total de 2.055 usuários cadastrados e iniciaram o processo de regularização. Finalmente, participa de ações fiscalizatórias juntamente com a Caesb, a Polícia Ambiental e outras instituições.

A Adasa permanece à disposição da população do DF para esclarecimentos que se façam necessários.

Fonte: G1

ÚLTIMAS NOTÍCIAS: