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Região Serrana do RJ está na idade média quando o assunto é tratamento de esgoto

Levantamento do Multiplix aponta que das 12 cidades analisadas, nenhuma tem 100% de esgotamento sanitário adequado

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Residências despejando esgoto in natura direto no rio, em Nova Friburgo | Foto: Reprodução/Portal Multiplix

 

No Dia Mundial do Meio Ambiente, 5 de junho, que tem como um dos objetivos alertar a sociedade para os problemas ambientais e para a valorização dos recursos naturais, o problema do tratamento de esgoto ainda vem à tona na Região Serrana fluminense. A falta do serviço ou o atendimento parcial perdura na maioria dos municípios.

De responsabilidade da gestão pública municipal, o tratamento de esgoto é uma medida de saneamento básico que busca acelerar o processo de purificação da água poluída por residências, comércios e indústrias, antes de ser devolvida ao meio ambiente ou ser reutilizada.

De acordo com a Agência Nacional de Águas (ANA), autarquia federal vinculada ao Ministério do Meio Ambiente, no Brasil, 43% da população possuem esgoto coletado e tratado e 12% utilizam-se de fossa, que é uma solução individual. Isto quer dizer que 55% da população têm tratamento considerado adequado; 18% possuem seu esgoto coletado e não tratado, o que pode ser considerado como um atendimento precário; e 27% não dispõem de coleta nem tratamento.

Devolver esgoto não tratado adequadamente à natureza interfere na qualidade da água nas áreas urbanas, causando impactos na saúde da população, na balneabilidade, na irrigação, dentre outros.

Panorama do esgotamento sanitário

De acordo com o glossário do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a definição de esgotamento sanitário é o “conjunto de obras e instalações destinadas à coleta, transporte, afastamento, tratamento e disposição final das águas residuárias da comunidade, de uma forma adequada do ponto de vista sanitário”.

Um levantamento realizado pelo Portal Multiplix junto aos municípios da Região Serrana do Rio e com dados do IBGE mostra que das 12 cidades analisadas, nenhuma tem 100% de esgotamento sanitário adequado e a maioria não possui tratamento. Confira:

  • Teresópolis – com 180.886 habitantes, apresenta 67,2% de domicílios com esgotamento sanitário adequado. Não tem tratamento de esgoto;
  • Nova Friburgo – com 190.084 habitantes, possui 82,8% de domicílios com esgotamento sanitário adequado. Tem tratamento de esgoto;
  • Duas Barras – com 11.454 habitantes, apresenta 50,2% de domicílios com esgotamento sanitário adequado. O esgoto é despejado in natura no rio e não há tratamento de esgoto;
  • Sumidouro – com 15.577 habitantes, tem 29% de domicílios com esgotamento sanitário adequado. Não tem tratamento de esgoto;
  • Santa Maria Madalena – com 10.417 habitantes, apresenta 53,3% de domicílios com esgotamento sanitário adequado. Tem duas estações de tratamentos de esgoto, com sistema de aeração forçada;
  • Bom Jardim – com 27.269 habitantes, apresenta 54% de domicílios com esgotamento sanitário adequado. Tem sistemas de fossa e filtro anaeróbio e uma estação de tratamento de esgoto no Conjunto Habitacional de Bom Destino.
  • Trajano de Moraes – com 10.611, tem 31,4% de domicílios com esgotamento sanitário adequado. Até o fechamento da reportagem, a prefeitura não informou se há ou não sistema de tratamento e não existem dados disponíveis;
  • Carmo – com 18.755 habitantes, apresenta 71% de domicílios com esgotamento sanitário adequado, com a utilização de fossas. Não tem tratamento de esgoto;
  • São Sebastião do Alto – com 9.326 habitantes, possui 48,5% de domicílios com esgotamento sanitário. Não tem tratamento de esgoto;
  • Cantagalo – com 20.177 habitantes, apresenta 71,4% de domicílios com esgotamento sanitário adequado. Possui rede coletora e no Distrito de São Sebastião do Paraíba, localizado às margens do Rio Paraíba do Sul, o esgoto é 100% tratado. No Bairro BNH está em andamento obra de infraestrutura para melhoria da rede de esgoto e fossa já existente no bairro;
  • Cordeiro – com 21.806 habitantes, tem 83,4% de domicílios com esgotamento sanitário adequado. Tem tratamento de esgoto realizado pela Cedae;
  • Macuco – com 5.574 habitantes, apresenta 97,4% de esgotamento sanitário adequado. Possui tratamento parcial, com uma Estação de Tratamento de Esgoto (ETE), que abrange um bairro;

Recursos existem, mas faltam projetos

Boa parte dos municípios citados acima estão dentro da área do Comitê da Bacia Hidrográfica Rio Dois Rios (CBH-R2R), órgão estadual que tem como objetivo promover a gestão descentralizada e participativa dos recursos hídricos da região.

Segundo o diretor-presidente do comitê, Lícius de Sá Freire, o baixo índice de tratamento de esgoto urbano não é uma exclusividade da Região Serrana nem da bacia hidrográfica do Rio Dois Rios, mas é um problema, com poucas exceções, de todo o país.

“O problema se deve ao baixo nível de investimento municipal para implantação e ampliação dos sistemas de esgotamento sanitários; investimentos com valores elevados para os orçamentos de pequenos municípios (projetos e obras); falta de cobrança sobre a concessionária para a execução correta do previsto no contrato de concessão. Por exemplo, há casos em que o contrato de concessão prevê atuação no tratamento de esgoto e a concessionária não realiza o referido tratamento. Também há carência de corpo técnico pouco estruturado nas secretarias municipais de meio ambiente; baixo nível de controle social no setor; falta de vontade política, dentre outras questões”, diz.

Neste sentido, o diretor-presidente diz que o CBH-R2R vem destinando recursos financeiros desde 2013 para o desenvolvimento de projetos de sistema de esgotamento sanitário (SES), totalizando aproximadamente R$ 5 milhões nesses seis anos. No entanto, destaca como problema a deficiência de projetos executivos para que consigam angariar recursos de fundos estaduais e federais para o setor.

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Esgoto sendo despejado no Rio Paquequer, em Teresópolis. Município está entre as cidades que não possuem tratamento | Foto: Reprodução/Portal Multiplix

Para resolver essa lacuna, Lício de Sá Freire diz que o comitê vem auxiliando os municípios no financiamento de projetos de saneamento. “Como os recursos financeiros disponíveis para deliberação do CBH não são recursos suficientes para financiar obras, e como os fundos que possuem robustez para financiar obras não conseguem destinar os recursos para o saneamento, principalmente por falta de projetos técnicos municipais, o CBH-R2R entendeu que poderia financiar os projetos para os municípios, e que, de posse desses projetos, os municípios acionem os fundos federais e estaduais que possuam envergadura para financiar a implantação dessas obras”, explica.

Um exemplo dessa engrenagem de financiar projetos de sistema de esgotamento sanitário e, em seguida, pleitear recursos para a obra são três projetos atuais para as áreas urbanas dos municípios de Macuco, Cordeiro e Santa Maria Madalena.

“O primeiro passo para o município que quer iniciar a melhoria do tratamento de esgoto em seus territórios é a implantação do Plano Municipal de Saneamento Básico (PMSB). E, atualmente, dos 12 municípios que pertencem à Bacia Hidrográfica do Rio Dois Rios, apenas o município de Cantagalo teve o seu PMSB aprovado na Câmara Municipal, os outros 11 não têm seus PMSBs implantados”, enfatiza Lício.

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Esgoto sendo tratado na Estação de Tratamento de Esgoto de Conselheiro Paulino, em Nova Friburgo | Foto: Reprodução/Portal Multiplix

O professor do Curso de Engenharia Ambiental da Estácio de Sá – Campus Nova Friburgo, André Bohrer Marques, também aponta a implantação dos Planos Municipais de Saneamento como algo básico para qualquer município atuar de forma estratégica e eficiente na coleta e tratamento do esgoto. Mas, segundo ele, a sociedade brasileira não tem o assunto como prioridade e são poucos os setores que pressionam os gestores municipais a investir em saneamento. Para o professor, a questão é complexa e envolve uma série de aspectos que devem ser ponderados.

“Em pequenos municípios não há estrutura administrativa e financeira para atuar como deveria no sistema de coleta e tratamento de esgoto. O tratamento de esgoto para o número de habitantes pequenos também não possui escala de atuação que proporcione o lucro desejado pelas empresas que atuam neste setor. Em resumo, não há interesse das empresas privadas em tratar pouco esgoto, porque não vão obter lucro. Também se percebe que não há empenho e interesse dos gestores municipais em investir na área. Um exemplo desta falta de interesse é que há muitos casos de municípios que perdem recursos simplesmente por não se manifestar ao órgão financiador”, diz.

Por fim, André afirma que é preciso reconhecer que a região teve melhorias nos últimos anos, mas que o ideal ainda está muito distante da realidade, especialmente nas áreas rurais ou em bairros mais afastados.

“Especificamente em relação a Nova Friburgo, faz-se necessário destacar que houve um avanço considerável de tratamento no trecho urbano, porém, não vejo nenhuma atuação nas localidades rurais, que também possuem problemas com esgoto doméstico. Podemos afirmar que no que se refere a coleta e tratamento de esgoto possuímos aspectos que existiam na Europa na idade média”, finaliza.

Fonte: Multiplix.

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