Ativista norte-americano afirma que o desperdício ocorre pela falta do incentivo que viria com o preço adequado para o insumo
Em tempos de seca e racionamento de água, como o que se vive no Distrito Federal atualmente, experiências exitosas em amenizar o resultado das calamidades hídricas e sugestões de especialistas da área são muito bem-vindas, ainda que passem por aumentar o preço do insumo, como ocorre hoje com a energia, para evitar o desperdício. A recomendação é do advogado e ativista norte-americano Seth M. Siegel, autor do livro Faça-se a Água — a solução de Israel para um mundo com sede de água. Editada pela Educ, da Pontifícia Universidae Católica de São Paulo (PUC-SP), a publicação, traduzida em 14 idiomas, revela os métodos e as técnicas que permitiram àquele país, situado numa das regiões mais desérticas do planeta, se tornar líder mundial em tecnologia hídrica.
Contrário ao racionamento, o especialista em políticas hídricas sugere o encarecimento do recurso. “Quando a água não tem o preço adequado, os usuários — sejam agricultores, empresas, indivíduos ou governos — não têm incentivo para economizar”, diz. E alerta: “Embora a Amazônia seja a maior fonte de água-doce do mundo, isso não significa que o Brasil terá um futuro seguro para a água.”
Siegel revela que 60% da superfície da Terra sofrerá desequilíbrio alarmante entre as demandas crescentes de água e o recurso potável disponível. “Se ações não forem colocadas em prática, o preço dos alimentos aumentará e o crescimento econômico vai desacelerar. A consequência será a instabilidade política”, prevê. No Brasil, para lançar o livro, Siegel esteve em Brasília, na Embaixada de Israel, na quinta-feira. Confira a seguir os principais trechos da entrevista concedida ao Correio.
O planeta experimenta aquecimento global e mudanças climáticas graves. O senhor acha que podem ocorrer disputas geopolíticas em torno da água?
Embora seja sempre possível que algum líder use a escassez de água como pretexto para um conflito, não é necessário. A guerra é muito cara. A melhor alternativa para evitar isso é usar tecnologia, preços de mercado, conservação, agricultura inteligente. Foi o que Israel fez. Embora esteja na região mais seca do mundo, tem hoje excesso de água e compartilha o recurso com seus vizinhos palestinos e jordanianos. A cooperação é muito mais inteligente do que o conflito. A tecnologia da água pode ser usada para abrir portas e construir relacionamentos. Pode ser uma ferramenta para países e estados trabalharem em conjunto. A construção da confiança leva a relacionamentos cada vez melhores.
Suas previsões dão conta de que 60% da superfície terrestre terá desequilíbrio entre a demanda e a água disponível. No melhor dos cenários, quando isso vai ocorrer? E no pior?
A base desses dados é um relatório da Inteligência do governo dos Estados Unidos, segundo o qual isso começará a se desenrolar agora e será amplamente sentido até 2025. Bilhões de pessoas serão atingidas. As causas serão as mudanças climáticas, a crescente população, o aumento dos padrões de vida, a infraestrutura precária e outros elementos. Eu digo no livro que os problemas de água representam a má governança. Países e regiões inteligentes encontrarão uma maneira de sair disso, mas, infelizmente, muitos outros provavelmente não o farão. Para as pessoas que vivem em áreas com má governança, temo que os problemas da água se tornem crises humanitárias.
O Brasil tem a Amazônia e um dos maiores mananciais de água do mundo, mas falta tecnologia e consciência para não poluir rios. Como o senhor avalia a condição do país?
Embora a Amazônia seja a maior fonte de água-doce do mundo, isso não significa que o Brasil terá um futuro seguro para a água. Precisamos parar de pensar na água como um recurso inesgotável como a luz do sol. A água é uma vasta mercadoria, mas há limites para ela e a poluição é uma das maneiras mais rápidas de criar esses limites. Todo país tem que estar atento a como suas práticas levam à poluição dos recursos hídricos, especialmente da agricultura e da indústria. Muitas técnicas podem ajudar a reduzir a poluição de fazendas e fábricas, mas o governo tem que liderar o caminho com regras e educação.
Como evitar o desperdício e incentivar a economia de água?
As duas melhores ferramentas são educação e preço. A educação deve começar desde cedo. O preço é provavelmente a melhor ferramenta. Quando as pessoas têm de pagar pela água, tratam-na como qualquer outro recurso caro: passam a ter mais cuidado para não desperdiçar e procuram tecnologia para economizar. Quando a água não tem preço adequado, os usuários — sejam agricultores, empresas, indivíduos ou governos — não têm incentivo para economizar. Há muito desperdício com perdas nos sistemas de abastecimento. O fator de perda municipal médio em todo o mundo é de cerca de 25%. Um relatório do Banco Mundial de 2016 aponta que muitas empresas brasileiras perdem mais de 30%. Isso é muita água! Israel perde menos de 10% de sua água para vazamentos e essa deve ser a norma mundial. Eles conseguem isso por uma ampla gama de tecnologias de prever quando um tubo começará a vazar para que ele possa ser substituído, ou pelo uso de tecnologia submarina para escutar vazamentos. É possível economizar água quando o governo decide se concentrar nela.
O que o Brasil está fazendo de errado?
Primeiro, gostaria de comentar o quanto o Brasil tem sido notável em disponibilizar água e saneamento para muitos nos últimos 30 anos. Faz parte do “milagre” do Brasil, mesmo que as pessoas mais pobres ainda careçam de abastecimento e esgoto iguais. Ainda assim, há muito a ser feito. Além de consertar a infraestrutura hídrica e de obter informações sobre a irrigação, é necessário fazer mais para reduzir a poluição da água, especialmente da indústria. É uma ameaça à saúde pública quando as águas residuais industriais são liberadas sem tratamento no abastecimento de água. Eu também sugeriria que o Brasil atraísse mais capital, inclusive estrangeiro, para melhorar a qualidade e o acesso à água. Tudo é possível. É preciso dinheiro, é claro, mas, ainda mais, é preciso foco.
Assim como tem água potável, o Brasil possui uma extensa costa. A dessalinização é um processo conhecido há muito tempo, mas pouco usado até hoje. Por quê?
A dessalinização é uma excelente fonte de água de alta qualidade. Mas deve ser usada como último recurso e não como fonte primária por conta do alto custo. Em qualquer lugar onde haja cidades populosas a uma distância de até 160 quilômetros da costa do mar, dessalinização pode ser um ajuste. Mas a conservação e a agricultura inteligente, com a reutilização de águas residuais tratadas, devem ser usadas primeiro.
O senhor falou em agricultura. O Brasil é um país agrícola. Quais tecnologias podem reduzir o consumo de água sem comprometer a produção de alimentos?
A melhor tecnologia para o cultivo de alimentos tentando poupar água é a irrigação por gotejamento. Atualmente, apenas uma pequena minoria da agricultura brasileira usa qualquer irrigação, e se utiliza muito pouco o método do gotejamento. A maioria dos agricultores irriga por inundação ou alguma forma de sprinklers (duas técnicas que perdem água na evaporação). Há estimativas de que a agricultura de irrigação do Brasil poderia crescer 600%. Valeria a pena o governo e os agricultores se familiarizarem com a irrigação por gotejamento. Ela usa menos água, perde pouco ou nada para a evaporação, leva a maiores rendimentos e ajuda a reduzir a poluição nos rios, pois evita o escoamento do fertilizante.
Hoje, há racionamento em Brasília. Como as campanhas de uso racional são efetivas?
Eu não sou um grande fã de reduzir a oferta através do racionamento. Uma abordagem mais inteligente, penso eu, é usar mecanismos de preços e de mercado para regular o consumo. O problema é que, quando a água é cobrada pelo preço real, há queixas — muitas vezes apropriadas — sobre a equidade e que a água é um direito universal. Então, é necessário a mistura dos dois. As pessoas pobres devem receber vales de água da mesma forma que recebem subsídios de comida ou aluguel, mas a sociedade como um todo deve pagar o preço total.
No Brasil, a produção de energia depende da água, porém, nos últimos cinco anos, não houve chuvas suficientes para encher reservatórios. Essa escassez é uma tendência?
Ninguém sabe com certeza, mas é preocupante. Parece que, mesmo que tenhamos alguns períodos muito úmidos, a probabilidade é que a temperatura esteja aumentando, e que haverá escassez de água em muitos lugares no Brasil e em todo o mundo. Já que parte significativa da produção de energia se baseia em ter quantidades abundantes de água para geradores hidrelétricos ou para refrigerar, precisamos conservar os recursos que temos e desenvolver novas tecnologias que levem em conta a possibilidade de episódios de escassez de água. Para uma economia dinâmica como a do Brasil, escassez de água para a energia pode criar um sério impedimento para o crescimento.
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