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Tratamento de esgoto não decola no Litoral Norte do RS e preocupa especialistas

Média de tratamento de esgoto é de 10,9%, mas na maioria dos municípios tudo o que é descartado vai diretamente para o meio ambiente

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A ampliação do tratamento de esgoto é um tema que pouco se vê nas campanhas eleitorais à Presidência, governo do Estado e nas disputas entre os candidatos a prefeito. É um problema nacional, que parece sem solução, pelo menos a curto prazo. Durante o verão, os holofotes se voltam às praias. Dados da Corsan sobre 16 municípios do Litoral Norte apontam que em 11 deles o tratamento de esgoto é zero. Ou seja, tudo o que é descartado das residências e empresas vai direto para o meio ambiente — incluindo o mar onde os veranistas se banham nesta época do ano.

Arroio do Sal, Balneário Pinhal, Capivari do Sul, Imbé, Mostardas, Osório, Palmares do Sul, Santo Antônio da Patrulha, Tavares, Terra de Areia e Três Cachoeiras não contam com tratamento de esgoto. Já Capão da Canoa e Torres apresentam os melhores índices de cobertura, mesmo que não ideal. Pouco mais da metade do efluente produzido nessas cidades passa por estações de tratamento antes de ser lançado em mananciais. A média fica em 10,9%.

As cidades sem tratamento utilizam um sistema que, apesar de amenizar o lançamento do efluente bruto na natureza, não faz o tratamento. São as fossas sépticas, com filtro e sumidouro. O sistema com três tanques funciona da seguinte forma: o primeiro recebe todo o esgoto, armazenando no fundo os sedimentos e deixando a gordura na parte superior. O segundo faz o filtro do líquido que passa. O terceiro é um tanque vazado que lança o que sobrou no solo, por infiltração. Todo esse sistema fica nos terrenos das residências, embaixo da terra. Mas há também ligações clandestinas que despejam o esgoto cloacal diretamente na rede pluvial —que deveria receber somente água da chuva e da limpeza de calçadas. No caso dos municípios do Litoral Norte, além das lagoas, a rede pluvial desemboca também diretamente no mar, em locais, muitas vezes, de grande movimento de banhistas.

Tratamento de esgoto

Em Imbé, onde o tratamento do esgoto é de apenas 0,51% (o percentual tratado refere-se a um loteamento que construiu uma Estação de Tratamento própria), a reportagem de GaúchaZH presenciou trabalhadores abrindo um caminho na areia para a passagem do que era lançado de um arroio que fica na Avenida Garibaldi. A via estava alagada com a chuva e a equipe tentava desobstruir os dutos para que aquela água conseguisse fluir e sair no mar.

A situação incomoda veranistas, como Maria Eduarda Soares Taffarel, 19 anos, que estava nas areias de Imbé, bem ao lado do esgoto pluvial que tinha como destino o mar.

— Eu evito pisar. Todo mundo sabe de onde vem, que pode provocar doenças, que é anti-higiênico — relata a estudante.

Ao saber que Imbé não conta com tratamento de esgoto, a jovem ficou espantada.

— Eu não sabia. É surpresa pra mim — disse a garota ao olhar para o risco de esgoto pluvial ao seu lado.

Também na beira da praia, o aposentado José Vidal, 65 anos, afirmou conhecer os problemas causados pela ausência de tratamento de esgoto ao meio ambiente. Assim como Maria Eduarda, evita pisar no que sai dos dutos pluviais.

— Eu tenho casa em Imbé há 10 anos. A gente sabe que, embora seja pluvial, pode ter risco de alguma contaminação. Eu sei que o poder público está tentando tratar o esgoto, mas parece muito parado o negócio — lamenta o aposentado.

A mesma opinião é compartilhada pelo vendedor Luciano Coelho Filho, 36 anos.

— Dinheiro não falta. O que falta é vontade de fazer — afirmou.

Índices de tratamento de esgoto no Litoral Norte

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Fonte: Corsan

Problemas gerados pela ausência de tratamento de esgoto

Técnica do Centro de Estudos Costeiros, Limnológicos e Marinhos (Ceclimar) da UFRGS, em Imbé, Cacinele Mariana da Rocha afirma que a ausência de tratamento de esgoto nessa região do Estado é ainda mais prejudicial ao meio ambiente do que em outras localidades.

— Para o ambiente é muito ruim de forma geral, porque como se trata de um substrato arenoso, provavelmente essa contaminação não vai ficar restrita ao local — explica a química e doutora em Oceanografia, ao se referir às casas que possuem fossas sépticas.

Ela lembra que o problema se torna ainda maior durante o verão, já que o número de pessoas aumenta significativamente.

— Se tem problemas com as fossas, porque são muitas pessoas usando as casas e elas não dão conta do volume de resíduo que é gerado.

A pesquisadora conta que há estudos que constataram a movimentação das águas subterrâneas e que esse resíduo que ingressa no solo por infiltração acaba sendo descarregado no mar ou nas lagoas.

A especialista ainda afirma que muitas casas possuem poços artesianos para captação de água e, com a utilização do sistema fossa e filtro, em que o esgoto é lançado ao solo por infiltração, o que sai na torneira, muitas vezes, tem cor e cheiro de efluente, já que ambos os sistemas ficam próximos. Ela também reforça que as ligações clandestinas não são poucas, levando o esgoto cloacal diretamente para a rede pluvial.

Ações do MP

De acordo com o promotor Daniel Martini, coordenador do Centro Operacional de Defesa do Meio Ambiente do Ministério Público, afirma que a solução ideal, mas que nem sempre é viável em razão do custo, é a construção de redes e estações de tratamento. Segundo Martini, onde não há rede e estação, a lei determina que é da responsabilidade do morador a construção de uma alternativa, como a fossa, filtro e sumidouro.

— Aquela limpeza da fossa, o recolhimento e o transporte até uma estação de tratamento de esgoto pode e deve ser feito pelos municípios, inclusive fazendo a devida cobrança dos usuários — alerta Martini.

O promotor lembra que essa ação minimiza danos ao meio ambiente, evitando que o esgoto seja lançado a céu aberto. O promotor admite que esse tipo de sistema não é ideal para o tipo de solo do Litoral, que é arenoso e com lençol freático superficial. Por isso, um projeto-piloto está em andamento na praia de Atlântida Sul, segundo ele.

O que dizem Corsan e Fepam

O diretor de expansão da Corsan, Marcus Vinicius Caberlon, afirma que diversas obras estão sendo feitas no Litoral Norte para ampliar o tratamento de esgoto na região.

— Nas principais praias os investimentos são bastante significativos — diz o diretor ao afirmar que estações estão sendo construídas em Tramandaí e Imbé.

Caberlon também relata que estão sendo concluídas outras estruturas em Capão da Canoa e Santo Antônio da Patrulha. Além disso, afirma que outra estação foi terminada há pouco em Torres e que as redes coletoras estão sendo ampliadas na cidade. Situação semelhante ocorre em Xangri-lá, onde a estação será ampliada. Conforme o diretor, o plano de investimentos da Corsan em água e esgoto para o Litoral Norte chega a R$ 450 milhões. O diretor admite que existem ligações clandestinas, que levam o esgoto cloacal para a rede pluvial, e que isso precisa ser coibido.

Em nota, a Fepam demonstrou preocupação com o sistema de fossas no Litoral Norte e disse que trabalha em parceria com as prefeituras, Corsan e Ministério Público para buscar soluções para o problema.

Fonte: Gaúcha ZN

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