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Saneamento básico e abastecimento de água são imprescindíveis para o desenvolvimento

No progresso em direção à sustentabilidade global, o acesso à água e ao saneamento tem um duplo papel: são simultaneamente ferramentas e objetivos das soluções.

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Imagem: © Dominic Chavez / Banco Mundial

Da agricultura ao abastecimento doméstico, eles fornecem informações essenciais para que os avanços tecnológicos nos levem à conquista do Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS 6: Assegurar a disponibilidade e a gestão sustentável da água e saneamento para todos). Para isso, governos e empresas devem levar em consideração as enormes assimetrias existentes e garantir que ninguém seja deixado para trás.

Um dos poucos aspectos positivos da atual crise climática e ambiental, é que um setor crescente da população voltou a sua atenção para o atual sistema econômico e percebeu que, em escala global existem assimetrias geopolíticas que são um dos principais obstáculos para a plena realização dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) em 2030.

Felizmente, o modelo de produção linear, extrativo e terceirizado (que obtém recursos e mão-de-obra onde possa obter mais benefícios financeiros) está em crise. Sua transformação em direção a um sistema circular, cujo objetivo principal não é esgotar os recursos, usar energias renováveis, considerar o desperdício como uma fonte de valor e aumentar a resiliência através da diversidade, é uma tendência incessável que é vista como a única solução para enorme crise de sustentabilidade que sofremos. Nesse contexto, a tecnologia é uma ferramenta necessária, embora não suficiente para equilibrar a balança.

A água não engana

No setor da água, historicamente prejudicado pela falta de respeito ao meio ambiente, as consequências desse crescimento assimétrico e desordenado são claramente visíveis. Também mostra de maneira muito compreensível qual o papel que a tecnologia desempenha e desempenhará na solução de problemas. Seus números são os melhores indicadores do que está faltando, dos erros cometidos e de como estamos evoluindo em direção aos ODS, especificamente para o ODS 6, que é a base dos 16 restantes.

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Imagem: © ODS Báltico

O último relatório do Programa de Monitoramento Conjunto publicado pela OMS e UNICEF (Progress on drinking water, sanitation and hygiene: Special focus on inequalities, 2000-2017) é uma boa linha de base para monitorar o equilíbrio geopolítico e o progresso internacional em direção a sustentabilidade.

Os dados de 2017, com uma população estimada em 7,5 bilhões são praticamente extrapolados para o presente: apenas cerca de 5,3 bilhões de pessoas têm acesso seguro à água e 2,185 bilhões não possuem. O mais grave é que, destes, 435 milhões são abastecidos por fontes sem qualquer tratamento, enquanto 144 milhões ainda usam água de superfície, diretamente de rios, lagoas, etc. O relatório apresenta outro fato surpreendente: oito em cada dez pessoas sem serviços básicos vivem em áreas rurais e quase a metade vive em países menos desenvolvidos.

Os números são mais preocupantes no que diz respeito ao saneamento, pelo menos quantitativamente: 3,4 bilhões de pessoas usam serviços seguros, enquanto entre os 4,085 bilhões restantes que não o fazem, persiste o flagelo dos 673 milhões que ainda defecam ao ar livre.

Por outro lado, a UNESCO afirma que quase 80% dos efluentes lançados no meio ambiente não são tratados, originando uma carga sanitária insuportável para as áreas mais pobres: a água contaminada causa cinco milhões de mortes por ano e estima-se que 800.000 delas sejam causadas por essas descargas.

Esses números devem nos forçar a enfrentar a realidade, para que possamos monitorar convenientemente o desenvolvimento tecnológico, concentrando-se em fechar as lacunas existentes que dificultam o desenvolvimento dos países mais desfavorecidos e orientar efetivamente a sua governança.

Agricultura inteligente: além da eficiência na irrigação.

Isso é evidente na agricultura, um setor no qual conciliar as crescentes demandas por água com disponibilidade cada vez mais escassa é um dos maiores desafios globais em termos de planejamento e governança, especialmente em áreas com estresse hídrico endêmico, que são mais ameaçados pelas mudanças climáticas.

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Imagem: © Fundação Vicente Ferrer

A irrigação é responsável por 70% das extrações globais de água, fornecendo até 40% das calorias alimentares disponíveis no planeta. Alcançar a máxima eficiência na irrigação e reduzir o consumo de água são os dois objetivos imprescindíveis para a humanidade, que nem sempre avançam proporcionalmente.

Um estudo de especialistas europeus, norte-americanos e australianos, publicado há um ano na revista Science, mostra que as melhorias na eficiência da irrigação nem sempre economizam água no nível da bacia para realocá-la para outras atividades ou no meio ambiente, o que seria apropriado para a sustentabilidade geral do sistema e para a segurança hídrica.


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Em muitos casos, os subsídios para tecnologias avançadas de irrigação aumentam a área irrigada e intensificam os cultivos, de modo que o volume total de água usada pelos agricultores aumenta em vez de diminuir. O estudo se concentra em algumas bacias hidrográficas da Índia, Marrocos, EUA, Espanha e Austrália, onde os investimentos em sistemas de irrigação por gotejamento e a melhoria das tubulações não levaram adequadamente em consideração seus efeitos nos fluxos de retorno recuperáveis, aquíferos e os rios, que diminuem em relação às expectativas.

Contas físicas da água

O estudo conclui que as contas físicas da água, devem ser desenvolvidas a partir da escala da propriedade rural até a bacia, para determinar claramente “quem recebe o que e onde” e para apoiar a tomada de decisão do interesse público. Isso requer a medição ou estimativa de todas as entradas, consumo de água, taxas de evaporação, fluxos de retorno para drenos e níveis de águas subterrâneas e superficiais. Neste caso, os dispositivos de sensoriamento remoto permitem a obtenção de dados precisos para a contabilização em tempo real da água existente na bacia, que, junto com os registros pluviométricos, com base em sensores conectados via satélite, permitem que algoritmos sejam desenvolvidos utilizando a big data (análise e a interpretação de grandes volumes de dados de grande variedade) para controlar a água a um custo razoável.

Diante de previsões climáticas pouco promissoras, é necessário oferecer aos governos mais facilidades para assumir o controle hidrológico e planejar recursos a longo prazo com base em dados reais sobre oferta e demanda. Os sistemas inteligentes de monitoramento e blockchain (ferramenta que pode ser usada nas cadeias de suprimentos desde fornecedores até as linhas de transporte e transmissão) também devem permitir a concepção de seguros eficazes para ajudar os agricultores em períodos de seca, transferindo riscos para o setor financeiro e aliviando a sociedade.

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Imagem: © Danilo Pinzon / Banco Mundial

Tudo isso em uma escala que pode ser estendida além da bacia, em nível nacional e por meio da rede inteligente de água, globalmente, que seria necessária para garantir a realização do ODS 6.

Como essas tecnologias podem ser implementadas em escala global? É realista pensar que, no atual estado de desequilíbrio geopolítico, os países mais pobres poderão acessar as redes de água inteligentes? Somos obrigados a crer que sim e notáveis avanços ​​na filosofia das principais empresas do setor mostram um roteiro esperançoso. A importância do valor da responsabilidade social e a adoção de sistemas circulares em direção à sustentabilidade possibilitam oferecer uma fonte de riqueza aos países mais afetados pelos resíduos que não são tratados. No entanto, muitos desses países precisam eliminar a falta de transparência na governança e na corrupção política, a fim de atrair os mais de 100 bilhões de dólares por ano que o Banco Mundial estima que precisavam ser investidos em 2015, para atingir as metas 6.1 (até 2030, alcançar o acesso universal e equitativo à água potável, segura e acessível para todos) e 6.2 (até 2030, alcançar o acesso a saneamento e higiene adequados e equitativos para todos, e acabar com a defecação a céu aberto, com especial atenção para as necessidades das mulheres e meninas e daqueles em situação de vulnerabilidade) de acesso a água e saneamento do ODS 6 até 2030.

Desperdício e escassez

Isto é evidente nas dificuldades em controlar o desperdício de água nos países em desenvolvimento. A Água Não Registrada (ANR) atinge mais de 40% da água potável em todo o mundo. Isso significa cerca de 45 milhões de m3 por dia, o equivalente a 45.000 piscinas olímpicas, é a água que se perde no processo de abastecimento, a partir de vazamentos, quebras e erros. É uma quantia que poderia satisfazer as necessidades de 200 milhões pessoas. Em alguns países africanos e asiáticos, a taxa de ANR excede 60%. Das fontes até os pontos de consumo, passando pelas estações de tratamento de água (ETA), sistemas de condução e estações de tratamento de esgoto (ETE), os operadores usam e usarão ainda mais dados em tempo real para otimizar custos e riscos, avançando em direção das redes inteligentes de água para economizar milhões de metros cúbicos.

Assim, no mundo industrialmente desenvolvido, em que o binômio tecnologia/ investimento dispõe relativamente de uma boa saúde, a gestão inteligente da água, unida com todos os outros recursos, aparece como uma ferramenta essencial para garantir a segurança hídrica das comunidades contra o consumo excessivo e desperdício.

Mas a maioria dos países mais pobres, onde vivem 2,185 bilhões de pessoas sem acesso seguro à água e outras 4,085 bilhões que não dispõem de sistemas de saneamento adequados, enfrentam o problema endêmico da falta de investimentos para enfrentar a custosa regeneração e o desenvolvimento de sistemas capazes de fornecer cobertura universal contra o crescimento urbano, o envelhecimento da infraestrutura e as piores previsões da crise climática.

Monitoramento de ponto de consumo, uma ferramenta de conscientização

Os 5,3 bilhões de pessoas que têm acesso seguro à água e os 3,4 bilhões que usam serviços de saneamento seguro geralmente vivem em países nos quais a tecnologia pode ajudar bastante a acabar com a confusão tradicional entre o próprio recurso, um bem público e o suprimento, que é um serviço industrial e, portanto, sujeito a variáveis socioeconômicas e tecnológicas. Essa confusão, principalmente devido à falta de visibilidade no processo de suprimento e despesa, pode ser encontrada nos níveis doméstico e empresarial no ciclo urbano da água.

Por meio da automação residencial e da Internet das Coisas (IoT), os usuários domésticos dos países economicamente desenvolvidos terão, no curto prazo, a capacidade de gerenciar todos os serviços contratados, o que resultará, sem dúvida, em uma maior conscientização sobre a oferta / despesa emparelhada e sua relação com a segurança da água.

Ter informações transparentes e compreensíveis sobre o abastecimento permitirá que governos e empresas abordem o ciclo da água urbana de uma maneira mais inclusiva para os cidadãos e comuniquem o valor da água de uma maneira melhor. Os usuários estarão mais conscientes dos riscos, como rupturas, secas e contaminação, e saberão quanta água é usada ou desperdiçada e onde, um contexto em que a delicada questão do preço da água será abordada com maiores garantias de consenso. No entanto, para aqueles que vivem nas favelas doentias das cidades emergentes que mais crescem, o objetivo principal é diferente: simplesmente o acesso a um suprimento e saneamento seguros para acabar com as doenças e alcançar uma vida digna.

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Imagem: © Mahmud Rahman / Banco Mundial

Neste ponto, ninguém nega que é difícil alcançar a Agenda 2030. A situação da crise climática e a falta de consenso político sobre estratégias ambientais não ajudam (as últimas notícias dos EUA e do Brasil, por exemplo, não são exatamente esperançosas). A esperança reside principalmente na conscientização dos cidadãos, que é um valor crescente que se traduz na expansão de iniciativas empresariais que enxergam um enorme potencial de crescimento na erradicação das assimetrias. Seria conveniente para instituições, empresas e a cidadania global focarem sua atenção no mundo da água, tanto como um objetivo essencial para a humanidade quanto como um indicador do progresso inclusivo do desenvolvimento tecnológico.

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Referência:  We Are Water Foundation, adaptado por Portal Tratamento de Água

Traduzido por Gheorge Patrick Iwaki

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