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Biomassa em alta: Bahia se destaca com potencial inesgotável

Sisal, milho, macaúba, dendê, soja e cana-de-açúcar entrarão na matriz energética do estado

Pouco mais de 92% da capacidade instalada para a geração de energia elétrica na Bahia vem de fontes renováveis – hídrica, biomassa, solar e eólica. Hoje, o estado é o maior produtor de energias limpas do país e tem potencial para crescer muito mais com os novos projetos de geração de energia a partir do hidrogênio verde e de biomassas inéditas na produção de biocombustíveis, como as provenientes do óleo de macaúba, do óleo de dendê e da agave (sisal).

Com investimentos de R$ 100 milhões, a Shell Brasil trabalha em um projeto inovador de geração de biocombustíveis a partir do plantio de agave, em parceria com o Senai Cimatec e a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Trata-se do programa Brave (Brazil Agave Development), cujo objetivo é desenvolver a mecanização e a industrialização do sisal para utilização integral da planta como uma nova fonte de biomassa na produção de etanol, biogás e biochar – biomassa de origem vegetal para ‘sequestrar’ carbono da atmosfera .

As pesquisas possibilitam que seja aproveitada 100% da planta, incluindo o suco e a mucilagem, que têm hoje utilização de apenas 4% da fibra para a produção do sisal. O projeto prevê a mecanização do plantio e da colheita da espécie agave sisalana – que ainda hoje são feitos manualmente na região de Conceição do Coité, no sertão baiano – e 50 hectares da agave tequilana, oriunda do México e que tem 20% a mais de capacidade de armazenamento de água em relação à espécie nativa. De acordo com o Senai Cimatec, nunca se utilizou o agave desse jeito, com o bagaço da tequilana para produzir álcool de segunda geração.

A previsão é que o plantio comece em meados de 2024 e a planta fique madura em três anos, e que possa ser aproveitado também o que sobra da extração da fibra para a produção de biomassa, que irá gerar o etanol de primeira e segunda gerações, em escalonamento industrial. Será uma revolução na economia do sertão e na vida dos produtores, que sofrem há muito tempo com as longas estiagens e o baixo preço do sisal, precisando sempre de apoio estatal.

“Queremos ajudar a criar tecnologia para um novo conceito de produção de bioenergia no país, que pode viabilizar o surgimento de uma nova cadeia industrial, colocando o sertão baiano como potencial polo produtor de biocombustíveis, ao mesmo tempo em que desenvolveremos uma das áreas de maior vulnerabilidade socioeconômica da Bahia”, explica o gerente de Tecnologia de Baixo Carbono da Shell, Alexandre Breda.

“O etanol de segunda geração será produzido com os derivados do sisal, que só precisa de 20% da água que a cana-de-açúcar necessita. Será um projeto gigante que irá revolucionar a região sisaleira”, explicou o deputado Luciano Araújo (Solidariedade), presidente da Comissão de Agricultura da Assembleia Legislativa que promoveu audiência pública para debater a crise do sisal e elencar sugestões.

O secretário estadual de Desenvolvimento Rural, Osni Cardoso, apresentou à equipe técnica do Ministério das Minas e Energia a proposta de incluir o sisal na política energética do país, incentivando com isenção de impostos outras empresas para investir na produção de biocombustíveis a partir da biomassa do produto.

“Estamos no aguardo da avaliação do ministério para colaborar na construção da proposta”, afirmou Cardoso.

O secretário disse que, ao investir na produção de biocombustíveis derivados do sisal, além de abrir novos horizontes para a indústria de energia sustentável, será dado um impulso significativo para as comunidades agrícolas que dependem desse sistema produtivo. “Além de aumentar a busca pelo sisal, essa política incentivará o crescimento da produção, criando um ciclo produtivo para agricultores familiares e produtores locais, promovendo o desenvolvimento econômico e construindo um caminho para uma sociedade mais verde e resiliente”, projeta.

O tamanho do sisal

De acorco com o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), a Bahia tem 6.634 produtores de sisal espalhados em 67 municípios, em uma área total de plantio de 76.316 hectares, sendo a grande maioria de produtores familiares.

Para o presidente do Sindicato das Indústrias de Fibras Vegetais do Estado da Bahia (Sindifibras), Wilson Andrade, a Bahia precisa se preparar para gerar energia renovável a partir de novas plantas no semiárido, que ocupa 85,2% da área total do estado. Ele explica que a produtividade do etanol gerado através da biomassa do sisal será o dobro da proporcionada pela cana-de-açúcar irrigada.

“Se isso acontece, é uma oportunidade enorme de investimentos no semiárido, que tem baixo índice de chuvas e poucas opções de espécies de plantas que podem competir com a agave. Será uma grande alternativa de renda para a região sisaleira e a região seca como um todo”, explicou.

Andrade ressaltou que, entre as suas preocupações, está a questão da integração dos pequenos produtores de sisal, que, em sua maioria, são agricultores familiares, o que aumentaria a importância do programa da Shell.

Segundo o líder do Sindifibras, mais de 300 mil pessoas obtém renda do sisal, direta e indiretamente, com uma produção de 80 mil toneladas por ano em área plantada de 110 mil hectares, enquanto o estado tem oito milhões de áreas degradadas que poderiam ser ocupadas com plantações.

Andrade lembrou que as fibras do bambu e do eucalipto – e todas as naturais – podem contribuir para a geração de biomassa. “A Bahia tem potencial para ser o mais novo protagonista neste novo mundo verde. Tenho confiança de que não irá demorar para termos uma usina de etanol a partir do sisal funcionando na Bahia”, afirmou.

O sisaleiro Juciano de Oliveira, do município de Valente, contou que a equipe do Brave visitou as áreas de plantio da agave e conversou com os produtores para que eles possam fornecer a produção de sisal ao programa. “A renda dos produtores vai aumentar quando forem instaladas as usinas de etanol. Com certeza, haverá muito emprego”, projeta.

Investimento em macaúba

A empresa de energia Acelen investirá mais de R$ 12 bilhões nos próximos dez anos na produção de biocombustíveis renováveis e já deu início à primeira fase do projeto de plantio de macaúba. Essa planta nativa tem grande valor energético e alta produtividade de óleo por hectare, e toda a plantação será feita a partir de cópias geneticamente idênticas de espécies de elite, que têm grande potencial produtivo e resistência a estresse.

A pesquisa e o desenvolvimento desse protocolo de micropropagação de mudas de macaúba e clonagem, realizados em parceria com a MulticanaPlus, são inéditos no mundo. A previsão é que a plantação de alta energia capture 60 milhões de toneladas de dióxido de carbono ao longo de 30 anos.

A expectativa é produzir 20 mil barris por dia e um bilhão de litros de diesel renovável por ano, o equivalente ao abastecimento anual de 1,1 milhão de veículos, além de reduzir em até 80% as emissões de carbono com a substituição do combustível fóssil.

Enquanto as plantações de macaúba são desenvolvidas, a empresa utilizará o óleo de soja e, a partir de 2025, o de dendê, com previsão de plantio em uma área de 200 mil hectares. Já a partir do próximo ano, será construída uma unidade de geração de hidrogênio sustentável para o hidrotratamento dos combustíveis.

De acordo com análise da Fundação Getúlio Vargas (FGV), espera-se que sejam gerados 90 mil postos de trabalho diretos e indiretos.

No ramo do hidrogênio verde, a Shell Brasil, Raízen, Hytron, Universidade de São Paulo (USP) e o Senai CETIQT assinaram um acordo de cooperação para desenvolvimento de plantas de produção de hidrogênio renovável a partir do etanol. A parceria tem como foco a validação da tecnologia desenvolvida através da construção de duas plantas dimensionadas para produzir cinco quilos de hidrogênio e, posteriormente, a implementação de uma planta dez vezes maior, de 44,5 quilos.

O objetivo é contribuir com uma fonte alternativa limpa para que o transporte pesado, incluindo caminhões, ônibus e trens, substitua a combustão interna dos tradicionais motores para passar a utilizar hidrogênio a partir do etanol e máquinas equipadas com células a combustível. A operação já teve início e será uma solução de baixo carbono para as futuras construções de postos de abastecimento veicular a hidrogênio de etanol.

A produção do hidrogênio via conversão do etanol em larga escala para descarbonizar outros setores representa grande avanço na disponibilidade de combustíveis renováveis. A outra forma de obtenção do hidrogênio verde se dá a partir da eletrólise das moléculas da água.

Por meio deste acordo para a produção de hidrogênio verde, as empresas iniciam uma nova etapa na área de renováveis. “A tecnologia pode ser facilmente instalada em postos de combustíveis convencionais, o que não exigiria mudanças na infraestrutura de distribuição, garantindo que o hidrogênio estará pronto para abastecer os veículos de forma rápida e segura”, explica o gerente de Tecnologia em Baixo Carbono da Shell Brasil, Alexandre Breda.

A Hytron é empresa brasileira reconhecida no mercado pela sua capacidade tecnológica e pioneirismo no fornecimento de soluções para a produção de hidrogênio utilizando as fontes solar e eólica, além de biocombustíveis.

O pesquisador do Senai Cimatec, José Luís Gonçalves, afirmou que a Bahia tem um potencial inesgotável de produção de energia por biomassa, e é um estado privilegiado para a fabricação de hidrogênio verde e descarbonização da economia. A pedido da Secretaria de Infraestrutura da Bahia (Seinfra), o Senai Cimatec elaborou um estudo para mensurar o potencial de geração de hidrogênio verde para a produção de eletricidade no estado.

O Atlas do Hidrogênio Verde foi lançado na Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas, no último dia 1º, e está pronto para ser entregue à Seinfra, que já tinha recebido o Atlas da Energia Solar e o Atlas da Energia Eólica, revelando o potencial energético destas matrizes.

O município de Luís Eduardo Magalhães, no Oeste da Bahia, vai receber a primeira unidade de biorrefino de milho do país pela Impacto Bioenergia. Com capacidade para moer 600 mil toneladas do grãos por ano e produzir 258 milhões de litros de etanol e outros coprodutos, a unidade tem previsão de operar a partir do primeiro trimestre de 2025. Uma segunda fábrica deve ser implantada em Correntina.

Também no Oeste, está em fase de negociação a instalação de outra fábrica de etanol à base de milho. No último dia 8, o governador Jerônimo Rodrigues (PT) se reuniu, em Brasília, com executivos da ALZ Grãos, empresa de originação de grãos, comércio de insumos agrícolas e operação portuária, para discutir o empreendimento, que vai aproveitar as condições produtivas já existentes na região.

Ainda não há definição sobre o município onde seria instalada a planta de processamento de grãos. A indústria terá capacidade de esmagamento de um milhão de toneladas de milho por ano.

Além de todas as tecnologias inovadoras em desenvolvimento, a Bahia tem em operação usinas de geração de energia de bagaço de cana, lixívia, capim-elefante, lenha e resíduos sólidos urbanos e outras em processo de construção.

Na nova fronteira agrícola entre Ibotirama e Barra, serão implantados empreendimentos para a produção de etanol a partir da energia da biomassa para as empresas do agronegócio, não só de sisal ou milho, mas de todos os grãos, incluindo o próprio algodão. As informações são do consultor de energia da Secretaria da Agricultura, Pecuária, Irrigação, Pesca e Aquicultura (Seagri), Carlito Souza.

Ele explicou que o governo do estado está construindo uma legislação para abrigar as novas matrizes energéticas que se instalarão na Bahia.

“As leis é que irão dar o respaldo para o início das operações”, completou.

Carlito Souza afirmou que há muita demanda represada no Oeste do estado para a produção de etanol de biomassa, que gerará uma redução nos custos operacionais em até 35% da energia, tanto para autoconsumo quanto para exportar para o sistema de energia elétrica.
Estado oferece incentivos para diversificar e expandir iniciativas

A Secretaria de Desenvolvimento Econômico (SDE) tem uma gama de incentivos para o setor produtivo. O programa Desenvolve oferece isenção de 70% a 90% do imposto estadual para novos empreendimentos industriais e agroindustriais e a expansão, reativação ou modernização de negócios já instalados, além de dilatação de prazo de 72 meses para pagamento do saldo residual.

O objetivo do fomento é complementar e diversificar a matriz industrial e agroindustrial do estado e contribuir para a expansão de iniciativas para a geração de fontes de energia renovável.

Atualmente, a Bahia possui sete usinas termelétricas para geração energética a partir da biomassa, com capacidade instalada de 531,8 MW, e dez hidrelétricas com capacidade instalada para a geração de energia elétrica de 5,7 GW.

Mais um empreendimento de biomassa está sendo construído em Muquém do São Francisco, e outras duas usinas serão implantadas em Ibirapuã e Juazeiro, o que adicionará mais 78,5 MW de potência para geração de energia.

Dados da Secretaria de Infraestrutura da Bahia (Seinfra) mostram que o estado é destaque no ranking nacional da produção energética nas fontes eólica e solar, junto com Rio Grande do Norte e Minas Gerais. O território baiano tem 294 parques eólicos e 71 empreendimentos fotovoltaicos com capacidade instalada de 8,1 gigawatts (GW) e 2,05 GW, respectivamente.

Sobre o potencial energético da biomassa no agronegócio para produzir eletricidade, a Seinfra tem a intenção de mensurar os dados. O superintendente de Energia e Comunicações do órgão, Celso Rodrigues, afirmou que a ideia é adotar processo semelhante ao que foi feito com os atlas Solar, Eólico e do Hidrogênio Verde, realizados pelo Senai Cimatec. O objetivo do governo do estado é substituir, de forma progressiva, a energia suja pela limpa, e ser o líder em geração de energias renováveis do país.

O consultor de energia da Seagri, Carlito Souza, explicou que a Bahia tem luz solar em abundância, com uma faixa de luminosidade muito alta no semiárido como poucos lugares do mundo, com nove horas e meia de luz por dia. Além disso, conta com ventos em todas as direções, o aquífero Urucuia de águas subterrâneas – o maior do Brasil -, e grandes rios como o São Francisco, com mais de 389 km de água em cada margem da usina hidrelétrica de Sobradinho.

“Juntando todas essas fontes de energia limpa, o nosso estado tem um potencial de mais de 80% a ser explorado ainda”, explicou Souza, lembrando que está sendo implantada uma biorrefinaria para a extração do etanol através do milho plantado em 60 mil hectares de terra para gerar energia termelétrica. A previsão é de geração de 1.200 empregos diretos em um investimento de R$ 3 bilhões.

“Em um futuro bem próximo, a Bahia vai deixar de usar combustíveis poluentes nos caminhões e ônibus”, prevê Souza. “O nosso futuro será elétrico, e a Bahia vai trocar toda a sua matriz energética para uma nova matriz de energia limpa e renovável. É a nossa contribuição para reduzir os efeitos das mudanças climáticas com a redução das emissões de carbono”, completou.

Fonte: A Tarde Agro


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