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Avaliação do desempenho de coagulantes recuperados de lodo de ETA por extração via alcalina-ácida

Resumo

No processo de tratamento de água visando sua potabilidade é gerado um resíduo (lodo) cujo manejo e disposição são problemas de caráter urgente, principalmente, devido à escassez de soluções eficazes. Um desafio extra a esses problemas é que esse lodo pode possuir em sua composição uma concentração acentuada de alumínio (elemento com efeitos nocivos aos organismos e ao meio ambiente) devido ao coagulante utilizado no processo de tratamento. Recuperar e reutilizar os componentes coagulantes do lodo pode ser uma alternativa para a sua destinação. Assim, com esse propósito, será possível economizar no custo de dosagem com a reciclagem do produto obtido, além de possibilitar a diminuição do volume final do lodo devido à remoção de água durante o processo. O método consistiu na recuperação, via alcalina-ácida, do coagulante do lodo (desaguado) de duas ETAs distintas. Inicialmente, os lodos foram submetidos a extração em pH 12, com hidróxido de sódio (NaOH – 20%) e, posteriormente, extração em pH 2, testando o ácido sulfúrico (H2SO4 – 20%) e o ácido clorídrico (HCl – 20%). A proporção utilizada foi 1:10 (m:v). A reutilização dos coagulantes recuperados foi realizada em Jar Test utilizando água bruta de um dos pontos de captação do município de Presidente Prudente – SP. O efeito coagulante foi validado fazendo comparativo com o coagulante comercial PAC, por meio dos parâmetros turbidez (NTU) e cor (PCU), além da análise frente aos valores máximos permitidos (VMP) pelo Ministério da Saúde para os mesmos parâmetros. Os resultados mostraram que três dos quatro coagulantes obtidos, se destacaram por apresentarem eficiências de remoção de cor e turbidez de águas brutas, superiores a 99%, com muitos valores próximos ou iguais aos obtidos pelo PAC, além de estarem dentro dos VMP. Com esse trabalho, levando em consideração os parâmetros analisados, foi possível concluir que o método de recuperação possui potencial de ser uma destinação parcial do lodo, uma vez que no processo, além do coagulante recuperado, uma parcela sólida remanescente do lodo necessita de destinação adequada. Mais estudos são necessários para avaliar a viabilidade, econômica e técnica, desse método, levando em consideração os fatores que influenciam na qualidade do produto final obtido, e os diversos outros parâmetros que o validem.

Introdução

A água é um recurso indispensável à manutenção da vida. Suprir todas as atividades relacionadas ao desenvolvimento humano é um grande desafio, pois além da disponibilidade em quantidade, é necessária qualidade satisfatória para cada finalidade a qual é destinada.

As águas retiradas de um manancial de captação para o consumo humano, dificilmente estão de acordo com os parâmetros de qualidade exigidos por legislação, como no caso do Brasil, a Portaria de Consolidação nº 5 de 2017 do Ministério da Saúde (BRASIL, 2017). Sendo assim, é necessário o tratamento prévio da água antes de utilizá-la.

O ciclo convencional do tratamento adotado para a potabilidade das águas em Estações de Tratamento de Água (ETAs) envolvem coagulação, floculação, decantação, filtração e desinfecção (AHMAD, AHMAD, ALAM, 2016a). Nesse sistema é gerado um resíduo (lodo) com alto teor de umidade, geralmente acima de 80% (TANTAWY, 2014), cuja gestão é um problema devido, principalmente, à grande quantidade produzida: mais de 2 milhões de m³ diariamente somente no Brasil (KATAYAMA, 2012; BRASIL, 2019).

A disposição desse lodo em aterros sanitários requer grandes áreas, operação adequada e processos de deságue prévio do material, tornando essa alternativa um método dispendioso (SILVA et al., 2015b; ACHON, BARROSO, CORDEIRO, 2008). Além disso, tal prática contraria a ordem de prioridades da Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS), a qual estabelece que medidas como a reutilização e reciclagem devam ser adotadas para esse tipo de resíduo (BRASIL, 2010).

Diversos estudos sobre o uso alternativo do lodo de ETA já foram desenvolvidos, como a incorporação dele em material cerâmico (TEIXEIRA et al., 2011; SILVA et al., 2015a) e em concreto (TAFAREL et al., 2016), porém eles não apresentaram propostas viáveis para atender o montante gerado. A inexistência de uma solução sustentável, economicamente e ambientalmente, resulta em uma prática que é muito comum em ETAs em funcionamento no Brasil: lançar esses resíduos diretamente nos corpos hídricos próximos (ACHON; BARROSO; CORDEIRO, 2013).

Somada a essa problemática, sais de alumínio convencionalmente têm sido utilizados em todo o mundo no processo de coagulação e floculação. Logo, o lodo produzido em um processo de tratamento de água que utiliza esses sais possui grande quantidade desse elemento em sua composição (ZHAO et al., 2011).

Os efeitos adversos da presença do alumínio de forma não natural no meio ambiente ainda estão sendo estudados. Algumas pesquisas já mostraram resultados com efeitos nocivos em plantas (SINGH et al., 2017), em peixes (OLIVEIRA et al., 2017) e em humanos, em que houve uma importante relação da presença do alumínio com disfunções neurológicas como a doença de Alzheimer (PROLO et al., 2007; EXLEY, 2016).

No Brasil, causar poluição de qualquer natureza que resulte em dano ao meio ambiente e à saúde humana é caracterizado como crime ambiental (BRASIL, 1998). Portanto, o ato de lançar os resíduos de tratamento de água, com elevado teor de alumínio residual, diretamente em corpos hídricos pode ser considerado um ato criminoso. Evidenciando, então, a necessidade de soluções práticas e efetivas para a gestão do lodo de ETA.

Devido às propriedades coagulantes dos compostos metálicos presentes no lodo de ETA, diversos estudos foram conduzidos para avaliar a reutilização desses resíduos, tanto a aplicação direta (JANGKORN et al., 2011; XU et al., 2015) quanto a aplicação dos compostos isolados do lodo (AHMAD et al., 2016). O processo de recuperação do coagulante conduz a uma redução significativa do volume de lodo e melhora das características de desidratação (TSUTIYA; HIRATA, 2001), facilitando a gestão do resíduo remanescente do processo.

Dentre os métodos existentes de extração desses compostos, Xu et al. (2009) destacaram que a digestão ácida possui a melhor relação de eficiência e custo, porém, para aplicar esse método, o processo de solubilização dos compostos metálicos não é seletivo, podendo, então, solubilizar compostos contaminantes também (KEELEY; JARVIS; JUDD, 2014).

Keeley et al. (2015) desenvolveram um trabalho no qual foi utilizada uma rota alcalina-ácida na extração de compostos coagulantes de lodo de tratamento de água a base de ferro, e obtiveram resultados interessantes, devido à diferença de solubilidade em meio alcalino.

Do exposto, este trabalho visou estudar a rota alcalina-ácida de extração, em lodo de duas ETAs que utilizam coagulante a base de alumínio. A proposta de extrair os compostos metálicos, potencialmente tóxicos, está aliada à sua utilização como coagulante, um produto com valor agregado que pode diminuir custos com a dosagem do produto comercial.

Autor: Ruan Larisson Toninatto Vilela.

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