Para o Brasil, adotar políticas públicas de estímulo ao desenvolvimento e à produção de biocombustíveis faz sentido econômica e ambientalmente
A transição do uso de combustíveis fósseis para o de fontes renováveis como principal medida mundial de enfrentamento à crise climática ganhou destaque na COP28, em Dubai, quando a intenção foi manifestada pela primeira vez de maneira oficial: está no parágrafo 28 do Balanço Global do Acordo de Paris, documento aprovado por aclamação pelos países presentes no evento. Em março último, China e França revitalizaram o tema ao publicarem uma declaração conjunta, por ocasião dos dez anos do Acordo de Paris, reafirmando o compromisso com a agenda climática e com os esforços para essa transição.
A manifestação aconteceu poucos dias depois do lançamento do relatório Estado do Clima Global pela Organização Meteorológica Mundial (OMM), segundo o qual o ano de 2024 registrou a maior concentração de dióxido de carbono (CO2) em 800 mil anos. As emissões atribuídas ao processamento e uso de petróleo, gás natural e carvão foram estimadas em assustadoras 37,4 bilhões de toneladas de CO2 despejadas na atmosfera nesse período, segundo a rede científica Global Carbon Project (GCP).
Os números traduzem tanto a urgência da transição energética para fontes renováveis quanto a enorme dependência mundial dos combustíveis fósseis. O que mudou nos últimos anos é que a transição energética deixou de ser tratada como um projeto para um futuro sempre adiado, como acontecia até pouco tempo. O acirramento de eventos climáticos adversos e a percepção de que há um mercado consumidor que valoriza a energia de menor pegada de carbono já provocou uma escalada na produção de biocombustíveis e esse movimento deve continuar.
Há bons motivos para isso. Seja qual for sua origem, o biocombustível sempre apresentará um balanço de carbono mais favorável do que seu equivalente fóssil. No mínimo porque o insumo de que é derivado pode ser replantado e vai acumular carbono enquanto cresce, ao passo que, nos fósseis, o carbono e outros gases são simplesmente extraídos e jogados na atmosfera.
Na trajetória para longe dos combustíveis fósseis, o Brasil tem posição privilegiada. Domina tecnologias para a produção de etanol e de biodiesel e ocupa postos de liderança no cultivo de commodities utilizadas por essa cadeia. A principal matéria prima, a cana de açúcar, supre mais de 340 usinas, e o processamento de etanol de milho já alimenta 40 agroindústrias espalhadas principalmente nos Estados do Centro-Oeste, São Paulo, Paraná, Alagoas e Minas Gerais.
E existe uma riqueza de outras espécies com grande potencial para produção de biocombustíveis de forma sustentável. Entre elas, destacam-se a macaúba e a carinata, plantas que combinam alta produtividade com benefícios ambientais significativos. A macaúba, uma palmeira nativa do Cerrado e da Caatinga, tem ganhado atenção por sua versatilidade e eficiência na produção de biodiesel e bioquerosene de aviação. Suas sementes, riquíssimas em óleo, proporcionam um produto final de grande qualidade. Além disso, ela é resistente a condições climáticas adversas e pode ser cultivada em áreas degradadas, contribuindo para a recuperação de solos e a geração de renda em regiões marginalizadas. Sua capacidade de sequestrar carbono durante o crescimento e sua adaptação a solos pobres a tornam uma opção promissora para a transição energética sustentável.
Fonte: Valor