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Amazônia à prova de fogo exige planejamento, política pública e ciência

Desafios na Amazônia: Políticas Emergenciais Contra Incêndios e Impactos Ambientais

Amazônia à prova de fogo exige planejamento, política pública e ciência

Para a pesquisadora da Universidade de Oxford, Erika Berenguer, transformar a Amazônia numa região à prova de fogo e evitar que incêndios e fumaça virem o “novo normal” demanda planejamento e políticas públicas que enfrentem as causas dos incêndios florestais

Após bater recorde de queimadas na série histórica do mês de outubro e ter mais de dois milhões de pessoas respirando ar classificado entre os de pior qualidade do mundo, em Manaus, o Governo do Amazonas anunciou suas medidas de controle dos incêndios florestais: aplicação de R$ 140 milhões em multas e detenção de ao menos 100 pessoas por crimes ambientais. Para a pesquisadora da Universidade de Oxford, Erika Berenguer, transformar a Amazônia numa região à prova de fogo e evitar que incêndios e fumaça virem o “novo normal” exige mais. É necessário planejamento e políticas públicas que enfrentem as causas dos incêndios florestais.

Berenguer destaca que a ciência “cantou a pedra da seca extrema na Amazônia. “A academia já sabia que esse era um ano de seca extrema na Amazônia, agências nacionais e internacionais climáticas já tinham dito isso”. Em exposição no TedX Amazônia, em dia de intensa fumaça que vinha pelo rio Negro e cercava o local do evento no início de novembro, Erika Berenguer propôs que os governos elaborem plano e fundo emergenciais para anos de vazantes e baixas extremas.

“Acredito que, com essas soluções implementadas, a gente não estaria vivendo o que estamos vivendo agora”, falou apontando para o céu cinza, que está tomado de fumaça em Manaus há cerca de doze semanas.

A pesquisadora afirmou que os três principais tipos de uso do fogo na Amazônia são: desmatamento para grilagem, o manejo de pastagem de gado e o roçado (método da agricultura familiar que tradicionalmente usa queimadas como preparo da terra para plantio). “Em comum, nos anos de seca extrema, são fogos que podem escapar para a floresta”, explicou a pesquisadora.

Para controle do fogo provocado pelos roçados, a cientista defende a criação de “bolsa defeso florestal” aos moldes do seguro defeso da pesca, que tem como objetivo respeitar o período de reprodução de peixes e assistir quem depende do pescado.

“Os povos da floresta, que dependem do uso do fogo, não podem ser proibidos de usá-lo mesmo em ano de seca extrema. Precisam de alternativas para não cair em insegurança alimentar”, argumentou.

Durante a coletiva no TedX Amazônia, a ministra de Meio Ambiente e Mudança do Clima, Marina Silva, afirmou que o Fundo Amazônia disponibiliza, desde 2017, R$ 35 milhões por estado para a Defesa Civil e contratação de brigadistas para incentivar ações de prevenção e combate a incêndio. Segundo a ministra, o recurso não foi requisitado pelo Governo do Amazonas.

No início de setembro, quando os incêndios intensificaram nos municípios do interior do estado, ribeirinhos, indígenas e secretários de meio ambiente dessas cidades reclamavam que faltava estrutura e recursos humanos. Não havia brigadistas, que geralmente são contratados pelos municípios a partir de convênios com o estado.

“O Ibama tem responsabilidade nas áreas federais, mas quando os estados não dão conta do recado, nós mobilizamos nossas equipes para ajudar. Para cá (Amazonas), já vieram mais de 300 brigadistas, dois aviões de combate ao fogo e quatro técnicos especializados em planejamento e enfrentamento de fogo. Mas essas questões precisam ser trabalhadas estruturalmente. Por isso, está pré-aprovado o recurso de R$ 35 milhões para que o Estado fortaleça sua brigada, sua Defesa Civil, seu Corpo de Bombeiros “, declarou Marina Silva.

Nos últimos cinco anos, o Amazonas passou do status de estado mais preservado para o epicentro de crises socioambientais e climáticas. Hoje, os 62 municípios do estado estão em emergência ambiental em função dos efeitos da pior vazante em 121 anos. O Amazonas também é um dos líderes em degradação e violência contra populações tradicionais.

Em função dos baixos níveis do rio Madeira, a Hidrelétrica de Santo Antônio, quarta maior do País, ficou paralisada por duas semanas durante a estiagem de 2023. O transporte fluvial de matéria prima e produto acabado da Zona Franca de Manaus passou a ser feito em cargas menores nas balsas para evitar encalhe. Nos rios, peixes, jacarés, arraias e botos morreram por falta de oxigênio ou aumento da temperatura da água. Comunidades ribeirinhas, indígenas e cidades do interior sofrem com falta de água potável e abastecimento de alimentos.

O planejamento defendido por Berenguer e apontado como ausente pela ministra, no Amazonas, poderia ter contado com as previsões antecipadas de que 2023 era um ano de El Niño que, junto com o aquecimento das águas ao norte do oceano Atlântico, potencializaram a seca na região e a diminuição acentuada do volume de chuvas.

“O El Niño na floresta amazônica deixa a bacia mais quente e mais seca. A floresta já passa por mudanças climáticas. Quando a gente junta essa combinação de um evento climático extremo – o El Niño – e as mudanças climáticas, a gente torna a Amazônia, essa floresta ombrófila densa que no ‘cientifiquês’ quer dizer um lugar úmido para caramba, numa caixinha de fósforo”, explicou a cientista.

No último final de semana de outubro, o Governo do Amazonas, ao comentar a onda de fumaça e a piora da qualidade do ar em Manaus, disse que a cidade sofria uma injustiça porque os focos de queimada – desta vez – vinham do Pará. Além de Manaus, cidades amazonenses que ficam próximas à fronteira entre os dois estados também sentiram os efeitos da fumaça.

Há três semanas, durante uma coletiva em Brasília, o climatologista e meteorologista do Inpe Gilson Sampaio explicou que o El Niño estava migrando do sudoeste para o leste do Amazonas – fronteira com o Pará – e o norte do estado. O resultado seria piora no volume de chuvas nessa região, o que favorece que incêndios se alastrem.

No período entre 1º e 6 de novembro, o Amazonas chegou a oitavo no ranking do Inpe em focos de calor (131), o Pará liderando em disparado (2.188). Quando o parâmetro é todo o ano de 2023, os dois estados ficam no topo. De 1º de janeiro a 6 de novembro, o Pará teve 33.307 focos de incêndio e é o estado que mais pegou fogo este ano. Em segundo lugar, com 18.791 registros, aparece o Amazonas.

No ano passado, dois meses antes da fumaça tomar os céus de Manaus após um incêndio de 1.800 hectares na região do rio Manicoré, no sul do Amazonas, o governador do Amazonas, Wilson Lima (União Brasil) visitou a área e prometeu ir às últimas consequências para impedir a criação da RDS (Reserva de Desenvolvimento Sustentável) no local. Foi aplaudido, na ocasião.

O sul do Amazonas, na área de influência da BR-319, se tornou nos últimos anos a que mais tem focos de queimadas no Estado e é conhecida como a nova fronteira do desmatamento. Em 2023, os municípios da região metropolitana de Manaus entraram no curso do fogo e queimaram suas florestas, ajudando a produzir a fumaça respirada na capital do estado.

Fonte: UM SÓ PLANETA


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