Vicente de Aquino
O problema do saneamento básico (água potável e esgoto tratado) remonta desde os meados do século 19. Para ser mais preciso, em 1849, o inglês John Snow, médico sanitarista, descobriu que o cólera (doença que grassava na época) era transmitido pela água.
Muitos duvidaram das posições de Snow, mas o fato foi realmente comprovado somente cinco anos mais tarde. Na própria cidade de Londres, o médico fez um mapeamento de vítimas fatais provocadas pela doença e chegou à conclusão que todas haviam ocorrido num raio de 230 metros da estação de Broad Street.
A população, então, foi impedida de consumir a água dessa fonte e as mortes, como por encanto, pararam de acontecer. Após esse trágico episódio, talvez o mais clássico da história da Medicina Sanitarista, outras patologias foram descobertas e comprovadamente classificadas como provocadas pela ingestão de água contaminada.
Entre elas, apareceram a febre tifóide, a hepatite e a gastroenterite. Mais tarde se descobriu também que a morte de pelo menos 500 mil soldados aliados durante a 2ª Guerra Mundial, se deveu ao consumo de água contaminada por bactérias que agravaram o quadro de ferimentos ou provocaram a morte de combatentes que gozavam de plena saúde. Isso fez com que o aperfeiçoamento do processo de desinfecção da água se tornasse quase uma obsessão para os norte-americanos. E novas tecnologias foram surgindo até chegarmos ao ponto dos modernos sistemas de filtração para saneamento básico do século 21: a Ultrafiltração e a MBR (Membrana Bio Reatora).
Ultrafiltração
Daniel Brooke, coordenador de pesquisa e desenvolvimento da Perenne, é quem explica a evolução do saneamento público nos últimos três ou quatro anos: “As chamadas tecnologias de membranas têm acelerado o processo de desenvolvimento nos últimos tempos e se tornaram viáveis há, mais ou menos, três anos. As tecnologias antigas, bem mais simples, eram eficientes e atendiam a demanda. Mas hoje podemos atingir um estágio bem mais avançado e, em alguns casos, com um custo menor e uma eficiência bem maior”, afirma.
O coordenador da Perenne explica que no caso da água, o tratamento ainda pode ser feito pelo sistema convencional, mas seu custo é um pouco mais alto: “Por isso adotamos a Ultrafiltração. O sistema é muito mais eficiente e com custo menor. Na equação custo-benefício, não se tem nenhuma dúvida sobre qual sistema adotar. Há um melhor retorno do investimento final”.
Há vários tipos de membranas de ultrafiltração, mas as mais utilizadas ainda são as do tipo fibra oca que, quando projetadas para fluxo de fora para dentro, fazem com que o iodo ativado permaneça do lado de fora, e o permeado limpo passe através da membrana, coletado no interior da fibra oca.
O vácuo, então, é aplicado na parte interna da fibra e a água limpa é extraída através das paredes da membrana, de onde vai para a distribuição. O tamanho do poro da membrana é de aproximadamente 0,05 micron.
MBR
Já no caso da MBR, para tratamento de efluentes (esgoto), o custo é bem maior e, às vezes, torna o novo processo inviável: “Nesse caso é aliado o tratamento biológico, que já existia, com o tratamento por membranas. No processo antigo, a etapa de separação dos sólidos não era totalmente eficiente. Com a utilização da membrana, fica muito mais eficiente. Isso acontece porque ao invés de separar os sólidos pelo sistema de gravidade (esperar pela sedimentação no fundo dos tanques), utiliza-se um tipo de filtro que retém a maior parte deles”, diz.
Daniel afirma que o sistema de MBR é muito superior ao convencional, mas em termos de custo, por enquanto, só se justifica em dois casos: 1) quando é necessária uma economia de espaço. Nesse caso os tanques de sedimentação, que normalmente ocupam grandes áreas, são dispensados; 2) quando se quer fazer o reúso da água do esgoto, pois o sistema de MBR dispensa as etapas pós-tratamento.
”No sistema convencional, a separação é feita biologicamente. Mas isso faz com que muitos sólidos não sejam capturados. É necessária, então, a passagem por etapas de filtração adicionais, utilizando-se carvão, areia ou até mesmo a ultrafiltração. Com a MBR não existem essas etapas. Ela funciona como uma barreira muito restritiva, que consegue segurar bactérias de 0,1 e 0,2 micron. Passam somente vírus, que são mais frágeis e, em consequência, mais fáceis de serem controlados posteriormente”, finaliza.
A MBR também vem sendo adotada para o pré-tratamento de água do mar, sendo o permeado encaminhado para o processo de osmose inversa, quando a água com alto teor salino passa a ser potável e própria para consumo.
Processos com uso de membranas
O uso de membranas no tratamento de efluentes tem se expandido significativamente em função, basicamente, da adoção de Padrões de Emissão mais restritivos estabelecidos para lançamento de efluentes em corpos receptores e sistemas de coleta de esgotos sanitários, a escassez de mananciais e a necessidade de implantação de programas de conservação de água.
Dessa forma, foram viabilizados projetos de reúso do efluente como água industrial, irrigação e muitas outras aplicações de água não potável. A filtração por membrana é uma técnica na qual a membrana age como uma barreira seletiva entre duas fases.
Como resultado da força através da membrana, os componentes são transportados à sua superfície; alguns são, dessa forma, retidos e outros passam por ela. O processo pode ter inúmeras aplicações, cada uma com sua própria característica e separação:
1) Processos orientados pela pressão: microfiltração (MMF), ultrafiltração (UF), anofiltração (NNF), osmose reversa OR);
2) Processos orientados pela concentração: separação de gases, pervaporação e diálise;
3) Processos orientados pela temperatura: destilação por membranas;
4) Processos orientados pela eletricidade: eletrodiálise.