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Destilação solar para fins de dessalinização: aplicação de materiais alternativos e tecnológicos para a produção mais eficiente de água potável

Resumo

A crescente crise hídrica global e o fenômeno da seca que afeta o semiárido brasileiro, evidenciam a real necessidade de se investigar sistemas e processos de dessalinização mais eficientes e baratos. Nesse contexto, o objetivo deste trabalho é investigar a utilização de materiais alternativos e tecnológicos na absorção de radiação solar, com o propósito de aumentar a produtividade de destiladores solares de desenho simples. A aplicabilidade dos materiais selecionados, tais como: ferrite de cobalto, quitosana/Grafite, cinza residual, monazita/alanita e tinta comercial preta, passaram a ser investigadas pelo estudo da cinética de evaporação, conduzida em ambiente fotoassistido e sob irradiação solar real. Para isto, um evaporador fotoassistido foi projetado e construído, seguido pelo desenvolvimento de metodologias para a aquisição da cinética de evaporação nos dois ambientes investigados. Ensaios fotoassistidos com ferritas de cobalto nanoestruturadas promoveram incrementos máximos de 14,8% na taxa de evaporação em comparação ao sistema de referência, com reprodutibilidade superior a 99%, evidenciando que tanto o evaporador quanto a metodologia para a aquisição dos dados cinéticos neste ambiente, são confiáveis. Estudos Fotoassistidos com cinza residual da indústria sucroalcooleira, resultou em aumento de 24,3% na taxa de evaporação, comparado ao sistema de referência. Experimentos de evaporação em ambiente real, fomentaram produtividade melhorada em até 60,7% com a utilização de tinta comercial preta de aspecto fosco, sugerindo acumulado de 4,0 kg/m² de destilado em apenas 3,5 h de exposição solar.

Introdução

O planeta Terra é exuberantemente azul devido à grande quantidade de água presente em sua superfície. No entanto, apenas 2,5% da água é doce, com aproximadamente 68,9% aprisionada nas geleiras, glaciais e neve permanente e o restante se distribuindo entre águas subterrâneas, superficiais e outros tipos de reservatórios (SHIKLOMANOV, 1998). Do modo como a água doce se distribui no planeta, se qualifica como sendo muito poucas as reservas que realmente se encontram acessíveis nos rios, córregos, lagos e aquíferos de curto período de recarga (MIHELCIC; ZIMMERMAN, 2012).

Autoridades mundiais preveem um futuro incerto para a humanidade em razão do aumento da demanda por água potável e à escassez dos recursos hídricos, com os conflitos sendo intensificados pela poluição e pelas mudanças climáticas. Nesse instante, a Organização da Nações Unidas (ONU) estima que mais de 2 bilhões de pessoas vivem o iminente risco de reduzirem o acesso à água potável e, em 2050, a previsão é de que pelo menos 25% das pessoas estarão vivendo em algum país afetado pela escassez crônica ou recorrente de água doce (ONU, 2018).

Diante dessas projeções, muitos pesquisadores apontam para os reservatórios salinos como a solução para a agravante crise hídrica global. Nesse contexto, Austrália e Israel já atendem importantes parcelas de suas populações dessalinizando águas dos oceanos, enquanto Qatar e o Kuwait, segundo Ghaffour et al. (2013), se abastecem exclusivamente por esse meio. De acordo com Zamen et al. (2014), grandes e médias demandas de água doce são apropriadamente atendidas por sistemas convencionais de dessalinização como, por exemplo, a osmose reversa (RO, sigla em inglês). No entanto, para os pequenos volumes geralmente requeridos por comunidades longínquas, os pesquisadores recomendam sistemas de operação mais simples e barata. Bezerra (2001), Bouchekima (2002) apud Bezerra (2004) e Wang et al. (2011), afirmam que os destiladores solares são dessalinizadores que atendem adequadamente as pequenas demandas de água potável de regiões remotas e ensolaradas.

Comunidades difusas em região de seca, cujas águas subterrâneas precisam de dessalinização prévia, são a realidade do semiárido brasileiro. A região compreende os nove estados nordestinos e parte de Minas Gerais. Ela representa aproximadamente 12% do território nacional e abriga por volta de 12% da população do país (BRASIL, 2018a). O enfrentamento da seca na região levou o Governo Federal brasileiro, entre outras medidas, a lançar, em 2004, o Programa Água Doce (PAD). Desde então, o programa diagnosticou 3145 comunidades rurais e tem como meta inicial implantar, recuperar e o gerenciar 1209 sistemas de dessalinização em todo o semiárido (BRASIL, 2018b).

O Brasil dispõe de privilegiada oferta de energia solar, sobretudo no semiárido, devido às condições climáticas que propiciam sol a maior parte do ano. Em qualquer parte da nação, a irradiação global supera a de muitos países da União Europeia (PEREIRA et al., 2006). Por exemplo, o local menos ensolarado do país tem incidência maior que o lugar mais iluminado da Alemanha (PEREIRA et al., 2017). No entanto, infelizmente todo esse potencial energético não é devidamente aproveitado. Em 2016, o recurso representou estarrecedores 0,0% da Oferta Interna de Energia (OIE) entre as fontes renováveis (BRASIL, 2017) e, em 2017, teve um tímido avanço, participando com 0,1% na OIE, entre as fontes renováveis (BRASIL, 2018c).

Pelo exposto, fica evidenciada a real necessidade do desenvolvimento de sistemas de dessalinização baratos, eficientes e seguros, como alternativas para mitigar os efeitos da crescente crise hídrica global, sobretudo no semiárido brasileiro.

Autor: Wildson Ursulino Leite.

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