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Fabricação e estudo de um coletor solar não convencional: uma alternativa para aquecimento da água utilizada no tratamento hidrossanitário térmico da manga (THT)

Resumo

No nordeste brasileiro, a manga é cultivada em vários estados. Barreiras fitossanitárias são impostas à fruta destinada ao mercado internacional, sendo a imersão em tanques com água a 46,1ºC recomendada na solução de dois problemas típicos: a antracnose e a eliminação da mosca da fruta. Os níveis de temperatura requeridos para o tratamento térmico da manga e as excelentes condições climáticas locais apontam para a viabilidade técnica do uso do aquecimento solar em substituição de grande parte do GLP consumido. Para estudo de viabilidade de aplicação no aquecimento da água utilizada no processo de tratamento hidrossanitário térmico (THT) da manga, esse trabalho tem por objetivo a fabricação de um coletor solar multitubo, trabalhando em regime de fluxo contínuo, com serpentina absorvedora formada por tubos de PVC ligados em série, dispostos em forma labirinto sobre chapa absorvedora de alumínio e conectado a uma fonte alimentadora de água fria. O sistema foi ensaiado para o diagnóstico de seu desempenho térmico e levantamento dos parâmetros necessários para sua caracterização.

Para um período de 9:00 às 16:00 horas, foram coletadas periodicamente as temperaturas em pontos internos e externos ao coletor; as temperaturas de entrada e saída do fluxo de água para variadas vazões (60l/h,80 l/h, 100l/h) em regime permanente e a radiação solar global ao longo do período de realização dos ensaios. Calculou-se o coeficiente global de perdas e o rendimento térmico do coletor. Para estimativa da demanda de energia térmica, simulou-se as condições esperadas no período de safra e então avaliou-se as características técnicas para inserção dos coletores no sistema de aquecimento. Foi demonstrada a viabilidade térmica do sistema de aquecimento para o tratamento hidrossanitário térmico (THT) da manga proposto, com resultados mais expressivos para a vazão de 60 l/hora para a área estudada. Para resultados mais viáveis para os outros níveis de vazão estudados, 80 e 100 l/hora, poder-se-ia aumentar a área de superfície absorvedora, plenamente viável nos campos térmico e econômico.

Introdução

Fontes renováveis de energia vêm se tornado o centro das atenções das nações desenvolvidas nos últimos anos, pela abundância e correção ambiental quando comparadas às demais fontes que compõem a matriz energética mundial. É necessário e importante desenvolver novas tecnologias e utilizar energia limpa e renovável de forma eficiente e extensiva para lidar com os desafios de uma crise energética e sérios problemas ambientais. (BAI, 2018) Segundo o estudo de Pottmaier et al. (2013) em 2012, cerca de 66% da energia gerada no Brasil vem de usinas hidrelétricas, e estas estão sujeitas a ter seu potencial de geração diretamente afetado pela mudança dos ciclos de chuvas ou variações climáticas, isso porque a geração de energia depende da água da chuva armazenada em reservatórios. Em outras palavras, a matriz energética brasileira é extremamente vulnerável à variação climática e, portanto, a variabilidade climática plurianual, como as secas, pode afetar a capacidade das usinas de fornecer a demanda de eletricidade. (BESSA e PRADO, 2015) Essa situação obriga a ativação de fontes termelétricas a gás natural, que agora correspondem a 10,6% da energia gerada no Brasil. (POTTMAIER et al., 2013). Além disso, o uso de 1,6% de energia nuclear, 1,5% de carvão e 5,7% de derivados de petróleo, gás e outras energias não renováveis, representa a maior causa de poluição do ar no meio ambiente. (SOUZA et al., 2012) O aproveitamento da energia solar, através de sistemas de aquecimento de água, tem se tornado uma alternativa viável, e apresentam crescimento significativo especialmente em países desenvolvidos. Contudo, tais sistemas são geralmente conhecidos pelo alto custo inicial e baixo custo operacional.

Esses sistemas precisam ser cuidadosamente avaliados, especialmente devido ao aumento de aplicações de energia solar nos últimos anos. Nesta avaliação, os componentes do conjuntodevem ser projetados considerando-se o efeito do clima, energia e custo na satisfação das condições térmicas e econômicas. (YAMAN e ARSLAN, 2018) De forma ainda discreta, o Brasil vem apresentando pequenas perspectivas de mudanças voltadas para o aproveitamento da energia solar, tanto no setor residencial como no setor industrial, no qual se destacam aplicações no âmbito das indústrias de processamento de alimentos em regiões que possuem alto potencial, como o nordeste brasileiro, mais especificamente na produção de manga. (PEREIRA, 2007) Na exploração da manga no Brasil convivem sistemas extensivos, em áreas esparsas, quintais e fundos de vales em pequenas propriedades, formando bosques subespontâneos; e sistemas, normalmente irrigados e em extensas áreas, visando a produção de variedades selecionadas para os mercados interno e externo. (SEBRAE, 2018) A escolha da variedade de manga a ser plantada está relacionada a vários fatores: às preferências do mercado consumidor; o potencial produtivo da variedade para região; as limitações fitossanitárias e de pós-colheita da variedade e, principalmente, ao comportamento ou tendência de mercado do tipo de fruto a ser produzido.

Dentre as muitas variedades, a Tommy Atkins (de origem norte-americana) é a mais produzida e que possui a maior participação no volume comercializado de manga no mundo, devido principalmente à sua coloração intensa, produções elevadas e resistência ao transporte a longas distâncias. As pragas e doenças constituem fatores limitantes à cultura da mangueira. Dentre as pragas, as moscas-das-frutas são o principal problema. As larvas desses insetos sobrevivem no interior dos frutos e causam queda prematura e a inutilização destes para o comércio e indústria. A antracnose (causada pelo fungo Colletotrichum gloeosporioides Penz) é uma doença que causa grandes prejuízos na produção e comercialização da manga. O seu controle é importante para garantir a produtividade e manter a qualidade dos frutos. No Nordeste brasileiro, a manga é praticamente cultivada em todos os estados, em particular nos estados da Bahia e Pernambuco que respondem por 61,5% da produção nacional. Os municípios de Juazeiro (BA), Petrolina (PE) e Livramento de Nossa Senhora (BA) se destacam na produção e exportação de manga. Entretanto, barreiras fitossanitárias são impostas à manga brasileira destinada ao mercado internacional. As exigências de países importadores de frutos “in natura” têm sido crescentes em relação à qualidade do produto, especialmente quanto à presença de resíduos de agrotóxicos. (PEREIRA, 2007) Os tratamentos oneram os custos e exigem instalações próprias “packing house” para serem realizados, aumentando substancialmente o investimento. Como forma de prevenir a proliferação de pragas em países importadores o tratamento mais comum refere-se ao tratamento térmico à qual a manga é submetida.

A imersão em água quente recomendada na solução de dois problemas típicos: a antracnose e a eliminação da mosca da fruta. A antracnose é uma doença dependente decondições climáticas como alta umidade e cujo tratamento térmico consiste na imersão em água quente a 55ºC por 5 minutos. Para o controle da mosca da fruta, os Estados Unidos, Japão e Chile seguem o Protocolo Mango Board que consiste na imersão das frutas em tanques com água a 46,1ºC, conforme Assis (2004). O tempo de permanência das frutas nesta temperatura depende de seu peso: 75 minutos para manga com peso inferior a 425g e 90 minutos para frutas com peso acima de 425g. Para o mercado japonês, o controle é feito na temperatura da polpa que deve atingir 46,1º C, independentemente do tempo requerido para tal. Os níveis de temperatura requeridos para o tratamento térmico da manga e as excelentes condições climáticas locais apontam para a viabilidade técnica do uso do aquecimento solar em substituição de grande parte do GLP consumido, agregando valor ao agronegócio pelo aumento da competitividade das empresas exportadoras brasileiras e pela incorporação de tecnologias limpas e renováveis. Como pode ser visto sistemas de energia solar podem ser usados para uma ampla gama de aplicações e fornecer benefícios significativos, portanto, segundo Kalogirou (2004) eles devem ser usados sempre que possível.

Buscando-se formas para baratear o custo dos sistemas de aquecimento, vemse estudando há mais de 35 anos no âmbito do LMHES/UFRN sistemas alternativos para tornar viável o uso da energia solar para o fim proposto. Esse trabalho tem por objetivo a concepção, fabricação e estudo de um coletor solar de fluxo contínuo com tubos absorvedores de PVC associados em série, para estudo de viabilidade de aplicação no aquecimento da água utilizada no processo de tratamento hidrossanitário térmico (THT) da manga. Serão apresentados resultados de testes que demonstraram a viabilidade do sistema de aquecimento proposto, para três níveis de vazão. Ressalte-se os simples processos de fabricação, montagem e operacionalidade do sistema proposto e seu baixo custo, características que ampliam as possibilidades de utilização do sistema, pelo menos para contribuir para a diminuição da utilização de combustíveis convencionais para o tratamento da manga.

Autor: MARCOS VINICIUS SOUSA DOS SANTOS.

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