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Wetlands construídos para o tratamento de esgoto doméstico: uma análise comparativa do custo do ciclo de vida

Resumo

Devido à carência de saneamento básico no Brasil, muitas habitações realizam o tratamento descentralizado de esgotos sanitários. Assim, estudos de custo das alternativas de tratamento são importantes. Uma análise do custo do ciclo de vida foi realizada para investigar o custo dos sistemas wetlands construídos para o tratamento de esgoto sanitário, comparando três cenários com as configurações mais comuns utilizadas. O cenário 1 foi constituído por uma ETE em escala real, localizada no sul do Brasil, composta de um tanque séptico e de um WCFV com recirculação ao tanque séptico. Os demais cenários foram criados: o cenário 2 foi formado por um WCFV, e o cenário 3 foi composto de um tanque séptico, um WCFV e um WCFH. Os valores presentes líquidos obtidos pela análise do custo do ciclo de vida para os cenários 1, 2 e 3 foram decrescentes. O cenário 3 apresentou menor custo do ciclo de vida. O cenário 1 foi o pior em relação à análise, entretanto, devido à utilização da recirculação, este apresentou melhor desempenho ambiental. A análise do custo do ciclo de vida, por levar em conta os custos ao longo da vida útil, mostrou-se uma ferramenta importante e adequada para a escolha da forma de tratamento de menor custo.

Introdução

No Brasil somente 52,36% dos municípios são atendidos por rede coletora de esgotamento sanitário, e deste total de esgoto coletado 46% recebem algum tipo de tratamento anterior ao lançamento em um corpo hídrico (SISTEMA…, 2017). Reconhecendo a importância do setor do saneamento para a garantia da saúde dos indivíduos, as regiões desprovidas de um sistema de esgoto adequado, como áreas rurais e municípios de pequeno porte, precisam de alternativas viáveis para o tratamento individual de seus efluentes. Os wetlands construídos são sistemas descentralizados com relativamente baixos custos de operação e manutenção, simplicidade operacional e satisfatórios índices de remoção de poluentes. Há diversos trabalhos com bons resultados reportados no tratamento de esgoto doméstico para essa tecnologia no Brasil, como Platzer, Hoffmann e Cardia (2007), Cota, Von Sperling e Penido (2011), Lana et al. (2013), Sezerino et al. (2014), Horn et al. (2014), Trein et al. (2015), Von Sperling (2015) e Santos et al. (2016). Os sistemas wetlands construídos são ambientes constituídos por plantas aquáticas, micro-organismos e o meio filtrante (areia, cascalho ou outro material inerte), que se encontra saturado ou parcialmente saturado. São também sistemas flexíveis na operação, ou seja, permitem que sejam controladas algumas características, como o fluxo empregado e o tempo de detenção hidráulica. Dessa forma, ocorre bom desempenho na remoção de contaminantes como os compostos orgânicos, sólidos em suspensão, nitrogênio, fósforo, metais e patógenos (VYMAZAL, 2007). Além disso, trata-se de sistemas eficazes no tratamento de diversas águas residuárias, tais como esgoto sanitário e efluentes industriais (CHEN et al., 2006; CHANG et al., 2012; SEZERINO et al., 2012a, 2012b; PELISSARI et al., 2013; LANA et al., 2013; ROUSSO; PELISSARI; SEZERINO, 2015), águas pluviais (ARIAS; BERTRAND-KRAJEWSKI; MOLLE, 2014), águas residuárias da pecuária (PENG et al., 2012; PELISSARI, 2014) e lixiviados de aterros sanitários (VYMAZAL, 2009; WU et al., 2014; SEZERINO et al., 2014; SCHOLZ, 2016).
Wetland construído de fluxo vertical (WCFV) é uma configuração em que o efluente é disposto de forma intermitente e homogênea na superfície do filtro, o qual percola verticalmente através do material filtrante e, posteriormente, é coletado no fundo por meio da tubulação de drenagem/coleta (VYMAZAL; KRÖPFELOVÁ, 2009). Essa forma de aplicação do efluente promove uma elevada transferência de oxigênio atmosférico ao interior do sistema. No WCFV a demanda por área é inferior aos wetlands construídos de fluxo horizontal porque a distribuição do efluente ocorre em maior área devido à verticalidade da infiltração e porque o volume do filtro é mais bem aproveitado (SILVEIRA, 2015). Entretanto, esses sistemas não retêm quantidades significativas de fósforo, nem realizam a desnitrificação (COOPER et al., 1996).
Os custos envolvidos no sistema wetland construído se referem a sua implantação, operação e manutenção. Não há um custo padrão para esse sistema, que é variável de acordo com diversos fatores, tais como configuração do sistema, área a ser ocupada, região da implantação, macrófita utilizada e valor da energia local. Contudo, em comparação aos demais sistemas de tratamento de águas residuárias de semelhante eficiência, o wetland construído se destaca por seu reduzido custo de manutenção e operação (KADLEC; WALLACE, 2009). Os custos da operação e manutenção dos sistemas wetlands, em geral, são baixos. Para a operação desses sistemas é importante que seja realizado o monitoramento dos parâmetros qualitativos para observar se a estação está alcançando a eficiência de tratamento desejada. Também há os gastos operacionais devido ao bombeamento do efluente, porém o gasto energético desse processo é mínimo em comparação às outras formas de tratamento mecanizado convencionais. Segundo Brix (1999), o gasto energético em wetlands de fluxo subsuperficial é inferior a 0,1 kW h m-3 de efluente.
Segundo Thierry Jacquet, paisagista fundador da empresa francesa Phytorestore, que detém patentes desse sistema em vários países, inclusive no Brasil, o custo de implantação do sistema é similar ao custo de implantação de um projeto de paisagismo decorativo, sendo, porém, 30% mais baixo do que o custo de implantação de uma unidade convencional de tratamento de água. Quanto ao custo de funcionamento, corresponde a 10% a 20% do custo de uma estação convencional e apresenta baixo consumo elétrico, não utilizando produtos químicos e sendo de simples manutenção (JARDINS…, 2011). Rai et al. (2013), que apontam a ampliação de utilização do sistema nas últimas décadas, reforçam esse aspecto ao identificarem que ele se mostra atrativo devido ao menor custo de implantação, operação e manutenção em relação a sistemas de tratamento tradicionais.
O custo do ciclo de vida (CCV) em um projeto é o valor total gasto com a implantação, operação, manutenção e desativação. A análise do custo do ciclo de vida (ACCV) é uma metodologia de estimativa de custos que contempla os possíveis custos envolvidos ao longo da vida útil de um projeto e resulta em um valor global dele (GLUCH; BAUMANN, 2004). Dessa forma, a ferramenta de ACCV pode ser útil na escolha de um arranjo tecnológico ou de uma tecnologia de tratamento de águas residuárias. Uma vez que não existe um custo padrão para a construção de sistemas do tipo wetland construído, estudos que utilizem ferramentas de avaliação das diferentes configurações operacionais são fundamentais. Em relação ao projeto de wetland construído, os custos de operação geralmente são inferiores aos de outras tecnologias de tratamento de águas residuárias. Como consequência, também a análise do CCV, representado pelo valor da implantação, manutenção e operação, é inferior em relação a outras formas mecanizadas de tratamento (KADLEC; WALLACE, 2009). Entretanto, poucos foram os estudos que buscaram realizar essa análise em wetland construído (CORBELLA; PUIGAGUT; GARFÍ, 2017; DIMURO et al., 2014; PUIGAGUTA et al., 2007). Assim, este estudo realiza a ACCV de sistemas wetland construídos para o tratamento de esgoto sanitário, tendo sido comparados três cenários, que incluíram as configurações mais comuns dos wetlands construídos para o tratamento de esgoto sanitário, de fluxo subsuperficial vertical e horizontal.
Autores: Taise Perondi; Delmira Beatriz Wolff; Samara Terezinha Decezaro e Ronaldo Kanopf de Araújo.
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