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Tratamento de água de reservatórios por dupla filtração, oxidação e adsorção em carvão ativado granular

Double filtration, oxidation and granular activated carbon adsorption for treating lake water

Giulliano Guimarães SilvaI; Liliana Pena NavalII; Luiz Di BernardoIII; Angela Di Bernardo DantasIV

IEngenheiro Ambiental e Mestre em Ciências do Ambiente pela Universidade Federal do Tocantins (UFT) – Palmas (TO), Brasil. Professor do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Tocantins (IFTO) – Palmas (TO), Brasil
IIBióloga. Doutora em Engenharia Química pela Universidad Complutense de Madri. Professora Titular do curso de Engenharia Ambiental da UFT – Palmas (TO), Brasil
IIIProfessor Titular aposentado do Departamento Hidráulica e Saneamento da Escola de Engenharia de São Carlos da Universidade de SãoPaulo (USP) – São Carlos (SP), Brasil. Professor da Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP) – Ribeirão Preto (SP), Brasil. Diretor da Hidrosan Engenharia – São Carlos (SP), Brasil
IVEngenheira Civil. Mestre, Doutora e Pós-doutora em Hidráulica e Saneamento pela Escola de Engenharia de São Carlos da USP – São Carlos (SP), Brasil. Professora da UNAERP – Ribeirão Preto (SP), Brasil. Diretora da Hidrosan Engenharia – São Carlos (SP), Brasil

Endereço para correspondência

RESUMO

Este trabalho teve como objetivo avaliar o tratamento de água bruta proveniente de um reservatório de água, utilizando instalação piloto de dupla filtração (DF), composta por filtro ascendente de pedregulho (FAP) e filtro rápido descendente de areia (FRD), seguida de uma unidade de pós-tratamento com carvão ativado granular (CAG). Adicionalmente, foi verificado o efeito da pré e interoxidação (entre o FAP e o FRD) na eficiência global do tratamento e na formação de subprodutos orgânicos halogenados (SOH). Em função dos resultados obtidos, foi observado que a pré-oxidação melhorou a qualidade do efluente do FAP e a interoxidação favoreceu que resultassem valores menores de turbidez e cor no efluente do FRD. O processo de tratamento por adsorção em carvão ativado granular, utilizado como pós-tratamento, mostrou-se eficiente para assegurar a qualidade dos efluentes finais nos ensaios realizados, especialmente, em relação à remoção de matéria orgânica, cianobactérias e cor. As concentrações máximas de SOH encontrados nos efluentes do FRD e do FCAG não ultrapassaram os valores limites da Portaria nº 2.914/2011 do Ministério da Saúde.

Palavras-chave: dupla filtração; oxidação; cloro; adsorção; carvão ativado granular; subprodutos orgânicos halogenados.

ABSTRACT

This study evaluated the treatment of raw lake water using a double filtration (DF) pilot plant consisting of an up-flow gravel filter (UGF) in series with a down-flow sand filter (DSF) and followed by a post-treatment granular activated carbon (GAC) unit. Additionally, the study examines the effect of pre and inter-oxidation (between UGF and DSF) on overall efficiency in the treatment and the formation of halogenated organic byproducts (HOB). According to the results obtained, it was observed that the pre-oxidation improved the quality of the UGF effluent and the inter-oxidation favored lower values of turbidity and color in the DSF effluent. Also, the treatment process by adsorption on granular activated carbon, used as a post-treatment, was efficient to ensure the quality of final effluent in the tests, especially regarding the removal of organic matter, cyanobacteria, and color. The maximum concentrations of HOB found in the effluents from the DSF and GAC did not exceed the limits of the Brazilian drinking water standards (Portaria nº 2.914/2011).

Keywords: double filtration; oxidation; chlorine; adsorption; granular activated carbon; halogenated organic byproducts.

Introdução

O uso inadequado dos recursos hídricos, em decorrência do desenvolvimento de atividades agrícolas e industriais, aliado a fatores relativos à urbanização desordenada e ao crescimento populacional, tem provocado de forma abrangente a poluição dos mananciais superficiais. Tais inconvenientes revelam a necessidade de se avaliar com mais seriedade as medidas tomadas com relação à questão da saúde pública. No caso específico dos sistemas de tratamento de águas para consumo humano, a aplicação de processos e tecnologias adequadas para a produção de água que atenda ao padrão de potabilidade.

As alterações na qualidade da água, devido às florações de organismos fitoplanctônicos (microalgas e cianobactérias) e microrganismos patogênicos em rios, lagos e reservatórios destinados ao abastecimento, introduzem dificuldades diversas, podendo comprometer seriamente o funcionamento das estações de tratamento de água, sendo que no processo, a pré-oxidação pode representar uma etapa importantíssima para auxiliar a remoção de tais contaminantes. Entretanto, tem sido observado que a maior parte desses contaminantes atua como precursores na formação de subprodutos da oxidação.

Por outro lado, vários estudos têm mostrado que os processos que envolvem o tratamento por ciclo completo não são efetivos na eliminação dos efeitos gerados pela presença de cianobactérias e seus subprodutos. Aliado a isso, torna-se indispensável o desenvolvimento e domínio de tecnologias alternativas de tratamento, ou combinações destas, adequadas às condições técnicas, sociais e econômicas locais.

A filtração direta pode ser considerada como uma das principais tecnologias de tratamento de água para abastecimento público, sendo utilizada com sucesso em diversos países, inclusive no Brasil. Algumas variantes, tais como a filtração direta ascendente (FDA) e a filtração direta descendente (FDD) possuem limitações relativas à qualidade microbiológica e físico-química da água bruta, especificamente para valores de turbidez, cor verdadeira ou concentração algal temporariamente elevados A dupla filtração (DF), que consiste na filtração rápida descendente (FRD) precedida da filtração direta ascendente em pedregulho (FAP) ou em areia grossa (FAAG), além de dispor das vantagens relacionadas à FDA, permite o tratamento de água de pior qualidade, possibilita o uso de taxas de filtração mais elevadas, oferece maior segurança com relação às variações bruscas de qualidade da água bruta, apresenta maior remoção global de microrganismos e pode dispensar o descarte de água pré-filtrada no início da carreira de filtração (DI BERNARDO; DANTAS, 2005).

O sistema de abastecimento da cidade de Palmas vem enfrentando nos últimos anos problemas de produção de água provocada pela redução de vazão dos mananciais. Um bom exemplo deste declínio ocorre na estação de tratamento de água ETA 006, que é suprida pelo Ribeirão Taquarussu Grande, responsável pelo abastecimento de 65% da cidade. No período de estiagem do ano de 2008, esta estação operou com déficit de 20% da sua capacidade nominal de produção, devido à redução histórica da vazão do manancial, chegando a menos de 400 L.s-1. Para suprir essa demanda foi escolhido o reservatório da usina Hidroelétrica Luiz Eduardo Magalhães, conhecida como UHE-Lajeado, que margeia acidade, e com volume armazenado em torno de cinco bilhões de metros cúbicos, tornando-se assim a mais viável fonte de abastecimento futuro da capital. Entretanto, a qualidade da água deste manancial ainda não é bem conhecida, em razão de o seu enchimento ter ocorrido há apenas oito anos. O enriquecimento autóctone devido à decomposição da vegetação submersa seria a principal fonte de transformação da qualidade da água do reservatório.

Silva (2009) realizou um programa de monitoramento visando conhecer melhor a qualidade da água bem como os padrões de distribuição de cianobactérias e cianotoxinas. Os estudos detectaram a formação de três florações de cianobactérias no período de estiagem dos anos de 2007 e 2008. Planktolyngbya limnetica foi a espécie de cianobactéria que melhor se adaptou no período avaliado. Houve uma participação relevante deCylindrospermopsis raciborskii no período. A maior concentração de cianotoxinas ocorreu em julho de 2008, quando foram registradas concentrações acima de 2,0 µg.L-1 de microcistinas.

Sendo assim, este trabalho teve como objetivo avaliar a tecnologia de DF com e sem a pré e interoxidação com cloro e a adsorção em carvão ativado granular, como alternativa no tratamento de água do reservatório UHE Luiz Eduardo Magalhães, Palmas (TO), Brasil.

Materiais e métodos

Instalação piloto de dupla filtração

A instalação piloto de dupla filtração (IPDF) foi montada nas dependências da ETA 006 de Palmas (TO), constituída basicamente pelos sistemas de reservação de água bruta e recalque (1), regularização da vazão de água bruta na câmara de nível constante (CNC) (2), coluna de pré-oxidação (3), mistura rápida (4), FAP (5), coluna de interoxidação (6), FRD (7), unidade de carvão ativado granular (CAG) (8), reservatório para armazenamento de água filtrada e lavagem dos filtros (9), tanque de produtos químicos (10) e bomba de água bruta (11). A Figura 1 apresenta o esquema geral da IPDF.

Para execução das carreiras de filtração I, II e III foram adotadas as taxas de filtração de 120 m3.m-2.d-1 para o FAP e de 180 m3.m-2.d-1 para o FRD.

A bomba para recalque de água bruta à CNC foi instalada em um reservatório de 10 m3. A CNC possuía tubulação de entrada de água bruta, extravasor adaptado a uma redução excêntrica de 150 para 100 mm e tubulação de veiculação de água bruta à câmara de mistura rápida. A tubulação de saída de água bruta continha na extremidade superior afogada, um cap com orifício central de 12,5 mm e corpo roscável para permitir a realização de ajustes da lâmina líquida sobre o orifício e consequentemente, da vazão encaminhada à câmara de mistura rápida. A câmara de mistura rápida dispunha de um agitador para garantir a mistura do coagulante com a água bruta, de uma placa com orifícios distribuídos na parte superior, com o objetivo de diminuir a turbulência na região próxima ao dispositivo de sifonamento, por meio do qual era efetuado o ajuste da vazão, variando-se a altura e o diâmetro da mangueira flexível de silicone previamente calibrada.

O FAP, o FRD e o FCAG foram montados pela superposição adequada de segmentos de tubos cilíndricos, sendo o FAP de acrílico com diâmetro interno de 113 mm; o FRD de acrílico com diâmetro interno de 90 mm, e o FCAG também de acrílico com diâmetro interno de 141 mm. Também foi prevista uma unidade de intercloração, construída com segmentos de tubos cilíndricos de acrílico de 110 mm, com tempo de contato de 20 min para a vazão de 50 L.h-1. O FAP possuía altura total de 1,97 m e foi apoiado sobre outro segmento de tubo de 1,5 m de altura. O seu material granular foi composto por quatro subcamadas de pedregulho de 30 cm de altura cada, com granulometria variando entre 2,0 e 25,4 mm, dispostos, estratificadamente, sobre uma placa perfurada, em ordem decrescente no sentido do escoamento. A distribuição da água para lavagem e a coleta da água filtrada foi realizada por meio de uma placa com 9 orifícios de 4,8 mm localizada no fundo do filtro. O FRD também possuía uma tela de aço inoxidável com abertura de 0,30 mm, disposta sobre a placa perfurada, de forma que o material filtrante era colocado diretamente sobre a mesma.

O meio filtrante do FRD foi constituído por areia com as seguintes características: espessura da camada = 0,70 m; tamanho do maior grão = 1,41 mm; tamanho do menor grão = 0,30 mm; coeficiente de esfericidade = 0,80; coeficiente de desuniformidade = 1,6 -1,7; tamanho efetivo (D10) = 0,42 a 0,45 mm; D60 = 0,71 mm; porosidade = 0,42. Nos ensaios em que foi usada a adsorção em carvão ativado, parte da água filtrada foi encaminhada para o filtro de carvão ativado granular (FCAG) com 0,65 m de espessura de CAG.

A IPDF foi provida de derivações nas tubulações de água bruta e de saída da pré e interoxidação, dos filtros ascendentes, descendentes e do CAG, a fim de conduzir continuamente amostras de água bruta e dos efluentes produzidos com vazões ajustadas por pinças reguláveis. As vazões afluentes aos filtros descendentes eram medidas por meio de rotâmetros e ajustadas utilizando-se registros de agulha instalados nas tubulações de desvios. Os filtros ascendente, descendente e de CAG possuíam piezômetros, que permitiam verificar a penetração de impurezas no meio granular, visando a programação das descargas de fundo intermediárias (DFI) no FAP e lavagens no FRD e FCAG.

Previamente aos ensaios na ETA piloto, foram realizados testes de bancada de filtração direta e de oxidação com cloro.

Após a obtenção dos dados nos ensaios de bancada, realizaram-se três ensaios na IPDF. Em cada ensaio foi usada uma configuração de tratamento, conforme ilustração da Figura 2. A duração do ensaio foi fixada em 36 horas.

Ensaios de coagulação e filtração em bancada

Foram realizados ensaios de filtração direta com a água bruta coletada, variando-se a dosagem do sulfato de alumínio (produto comercial líquido com 7,5% Al2O3), objetivando-se a determinação do par de valores dosagem de sulfato x pH de coagulação que eliminasse a necessidade do uso de acidificante/alcalinizante, cuja turbidez do filtrado resultasse inferior a 0,50 uT.

As características dos ensaios foram: mistura rápida (tempo de 30 s e gradiente de velocidade médio de 1.000 s-1); coletas dos efluentes dos filtros de laboratório de areia (FLA) efetuadas após 20 e 30 min de filtração com taxa de 60 m.d-1 (areia dos FLA com grãos de 0,30-0,59 mm); leitura de cor aparente e de turbidez das amostras de água filtrada.

Ensaios de pré e intercloração em bancada para determinação das demandas de cloro

Os ensaios da pré-oxidação com cloro em equipamento de jarteste objetivaram a determinação das demandas de cloro na pré-oxidação da água bruta e na interoxidação da água pré-filtrada (coleta de 24 L de amostra na saída do FAP no término do Ensaio I realizado na IPDF). Foi utilizado hipoclorito de cálcio para a preparação da solução de cloro. As condições dos ensaios foram: tempo de pré-oxidação (Tox) = 30 min; tempo de interoxidação (Tox) = 20 min; gradiente de velocidade (Gox) = 100 s-1. O parâmetro de controle da água após a pré ou interoxidação foi o cloro residual.

Operação de limpeza dos filtros

O FAP foi operado com a execução de descargas de fundo intermediárias (DFI) e de descargas de fundo finais (DFF), realizadas com esvaziamento total do filtro com taxa inicial da ordem de 1000 m3.m-2.d-1. A DFF foi realizada no final do ensaio, antes da execução da lavagem do FAP, enquanto as DFI foram efetuadas durante a carreira de filtração. As DF foram realizadas com esvaziamento total do FAP com duração de 1,0 a 1,5 min, a cada 12 h após o início do ensaio.

A lavagem do FAP foi efetuada com a aplicação de água com velocidade ascensional de 0,5 m.min-1 durante cerca de 10 min, enquanto a lavagem do FRD foi executada com água para promover expansão de 30 a 40% na camada de areia (velocidade ascensional de 0,80 m.min-1) durante cerca de 15 min.

Parâmetros de controle e eficiência

A Tabela 1 mostra os parâmetros de controle da qualidade da água monitorada nos ensaios, assim como a frequência com que foram analisados. As análises das amostras foram realizadas segundo os métodos indicados no Standard Methods (APHA; AWWA; WEF, 1998). Na Tabela 2 são apresentadas as especificações dos equipamentos utilizados e os métodos adotados na determinação dos parâmetros monitorados.

Pós-cloração e formação de subprodutos orgânicos halogenados

A etapa de pós-cloração (desinfecção) foi realizada nos três ensaios. As amostras de 0,5 L de água filtrada e de água após a adsorção em CAG foram coletadas na saída do FRD e na saída do FCAG após 18 horas de funcionamento da IPDF. Uma solução de cloro, recém-preparada, foi adicionada a cada frasco para obter uma dosagem de 5 m.L-1 de cloro (pós-cloração). Os frascos eram fechados e lacrados com papel parafinado para evitar perdas de compostos voláteis por evaporação. A seguir, os frascos eram armazenados à temperatura de 25±1ºC, em câmara de demanda bioquímica de oxigênio (DBO) termostatizado. Após 30 min e 24 h, os frascos eram abertos e rapidamente coletados 100 mL de amostra em um frasco contendo aproximadamente 1 g de agente desclorante (ácido ascórbico) com objetivo de paralisar a reação do cloro. Os frascos identificados eram imediatamente lacrados e acondicionados em geladeira à temperatura de 4ºC. As amostras foram enviadas para o laboratório da Universidade de Ribeirão Preto (UNAERP), Ribeirão Preto (SP), para extração líquido-líquido e para análise em cromatógrafo gasoso com detector de captura de elétrons (CG-DCE). A Tabela 3 apresenta um resumo das condições dos ensaios de pós-cloração para quantificação dos subprodutos orgânicos halogenados (SOH).

Os SHO foram determinados de acordo com a metodologia recomendada pelos métodos 551.1 USEPA (2005a) e 552.2 da USEPA (2005b). Os seguintes subprodutos foram investigados:

i) Trialometanos (TAM): clorofórmio, bromodiclorometano, dibromoclorometano, bromofórmio;

ii) Haloacetonitrilas (HAN): dicloroacetonitrila, tricloroacetonitrila, dibromoacetonitrila, tribromoacetonitrila, bromocloroacetonitrila;

iii) Halopicrinas (HP): cloropicrina;

iv) Haloacetonas (HK): 1,1-dicloropropanona, 1,1,1-tricloropropanona;

v) Tricloroacetaldeído (TCA);

vi) Ácidos haloacéticos (AHA): monocloro ácido acético, monobromo ácido acético, dicloro ácido acético, tricloro ácido acético, bromocloro ácido acético, bromodicloro ácido acético, dibromo ácido acético, clorodibromo ácido acético, tribromo ácido acético.

Resultados e discussão

Caracterização da água bruta

Na Tabela 4 são apresentadas as principais características da água bruta do Reservatório da UHE Luiz Eduardo Magalhães na ocasião da coleta. Observa-se que a água bruta possuía baixo teor de matéria orgânica dissolvida, comprovados pelos valores de COT e cor verdadeira obtidos. Cabe ressaltar que elevadas concentrações de matéria orgânica na água bruta contribuem para a formação expressiva de SOH.

Segundo o monitoramento realizado por Silva (2009), a maior densidade de cianobactérias encontrada no Reservatório UHE foi evidenciada em novembro de 2007 (28.600 cél.mL-1). A maior concentração de cianotoxinas ocorreu em julho de 2008 (>2 µg.L-1 de microcistinas). Tais florações mantêm sempre a possibilidade de liberação de toxinas na massa de água. No presente trabalho, a água bruta utilizada nos ensaios realizados apresentou baixa densidade de cianobactérias (433 cél.mL-1) quando comparada aos dados de Silva (2009). Mesmo assim, foram realizados os ensaios para verificar a formação de SOH e a remoção de células de algas e cianobactérias na IPDF.

Ensaios de bancada

A condição de coagulação escolhida para uso nos ensaios na IPDF foi dosagem de sulfato de alumínio de 27 mg.L-1 (produto comercial líquido) e pH de coagulação de 6,83.

Com base nos resultados dos ensaios de bancada de pré e de intercloração, foram fixadas as dosagens de cloro de 1,7e 1,5 mg.L-1, respectivamente. As dosagens foram ajustadas na IPDF de modo que o residual de cloro na saída das colunas de pré-oxidação e de interoxidação resultassem em no máximo 0,1 mg.L-1.

Ensaio I

Conforme apresentado na Figura 3, o FAP produziu na maior parte do tempo de operação, efluente com turbidez menor que 2,5 uT, embora fosse observado carreamento dos flocos após 12 h de funcionamento, o qual foi interrompido para a execução de DFI. Ressalta-se que as DFI realizadas no FAP proporcionaram uma melhora na qualidade do efluente em função da diminuição dos valores de turbidez. Observou-se ainda que a turbidez foi gradualmente aumentando até o momento da execução da DFI, que acontecia a cada 12 h, resultando valores máximos de 2,4 uT. Os valores de turbidez encontrados durante o ensaio variaram entre 0,42 e 2,4 uT no FAP.

Quanto à remoção de turbidez no FRD, a unidade foi capaz de produzir efluentes com turbidez menor que 0,50 uT, sendo que a remoção variou de 97,7 a 99,5%. Resultados semelhantes no desempenho da IPDF para a remoção de turbidez foram encontrados por Dantas e Di Bernardo (2006), que realizaram uma investigação experimental com água de estudo preparada com caulinita (turbidez em torno de 100 uT), concluindo que a IPDF foi capaz de produzir água filtrada com turbidez menor que 0,5 uT.

Na Tabela 5 é apresentado um resumo dos resultados obtidos referentes aos parâmetros medidos no Ensaio I. Os valores de oxigênio consumido e de absorvância a 254 nm indicam baixa concentração de matéria orgânica dissolvida nos efluentes do FAP, FRD e FCAG.

Ensaio II

O desempenho do FAP no Ensaio II foi similar ao do Ensaio I com relação à remoção de turbidez, com produção de água pré-filtrada com valores na faixa de 0,38 a 2,74 uT. Os valores máximos de turbidez do efluente do FAP ocorreram por volta das 12 e 24h, respectivamente, antes da realização das DFI Após a execução das DFI, houve redução significativa dos valores de turbidez do efluente. O FRD produziu um efluente com turbidez menor que 0,50 uT em praticamente todo o tempo de operação, com valor máximo de 0,79 uT após 18 h de operação. Esse acréscimo de turbidez pode ter sido devido a problemas de funcionamento da bomba dosadora ocorridos neste ensaio (Figura 4).

Observa-se na Tabela 6 que o emprego da pré-oxidação favoreceu a remoção da matéria orgânica, sendo que os valores de oxigênio consumido e de absorvância dos efluentes dos FAP, FRD e FCAG resultaram menores que aqueles obtidos no Ensaio I.

Ensaio III

No Ensaio III, o FAP produziu efluente com turbidez consistentemente menor que 1,5 uT (Figura 5). O FRD, que recebeu água interclorada, produziu efluente com turbidez sempre menor que 0,50 uT. Já o FCAG produziu efluente com turbidez menor que 0,30 uT durante as 36 h de operação. Di Bernardo e Dantas (2010) afirmam a importância da obtenção de baixa turbidez na água de consumo para reduzir o risco associado a vírus e protozoários, considerando a facilidade dos oocistos dos protozoários se aderirem a compostos orgânicos e inorgânicos que conferem turbidez. Pode-se observar na Figura 5 que a turbidez no efluente do FCAG variou entre 0,13 e 0,28 uT.

Na Tabela 7 é apresentado um resumo dos resultados obtidos no Ensaio III. Neste ensaio foram obtidos os menores valores de oxigênio consumido e de absorvância a 254 nm no efluente do FCAG, indicando que o uso da intercloração contribuiu para que fosse obtida maior eficiência de remoção de matéria orgânica em relação aos Ensaios I e II. Resultados semelhantes foram obtidos por Sales et al. (2006), que avaliaram vários oxidantes em uma instalação piloto de dupla filtração, e concluíram que a intercloração foi a melhor opção para uso da oxidação.

Remoção de cianobactérias

Apesar da densidade relativamente baixa de cianobactérias, é importante salientar o desempenho da IPDF em remover tais organismos. No Ensaio I, não foi utilizado oxidante no processo de tratamento. Já nos Ensaios II e III foi utilizado o cloro, sendo que na pré-oxidação foi aplicada a dosagem de 1,5 mg.L-1 (Ensaio II) e na interoxidação, de 1,7 mg.L-1 (Ensaio III).

No Ensaio II, a remoção de cianobactérias foi superior quando comparada ao Ensaio I, sendo de 95,8% na pré-oxidação, 96,5% no FAP; 97% no FRD e de 99,5% no FCAG. No Ensaio III foi observada remoção de 100% de cianobactérias nos efluentes do FRD e do FCAG, conforme apresentado na Figura 6.

Quanto à eficiência do sistema, o uso da pré e da interoxidação nos Ensaios II e III, respectivamente, favoreceua remoção de células de cianobactérias nas unidades de tratamento estudadas.

Formação de subprodutos orgânicos halogenados

Nas Figuras 7 e 8 são apresentados os resultados das concentrações dos SOH nos tempos de 30 min e 24 h após a pós-cloração dos efluentes do FRD e FCAG.

Observa-se na Figura 7 que, com a pré-cloração (Ensaio II), os resultados evidenciaram a maior formação de SOH quando comparada com a intercloração (Ensaio III) e sem oxidação (Ensaio I). Tal comportamento foi observado no efluente do FCAG (Figura 8). Com a pré-cloração, foram observadas as concentrações máximas de AHA no efluente do FRD e FCAG de 48,96 e 27,01 µg.L-1 respectivamente (reação de 24 h). Os valores encontrados na saída do FRD e FCAG estiveram abaixo do limite preconizado pela Portaria nº 2.914/2011 de 0,08 mg.L-1 (BRASIL, 2011). No ensaio em que não foi utilizada a oxidação (Ensaio I) houve menor formação de SOH, visto que as concentrações de TAM foram de 9,46 µg.L-1 (tempo de 30 min) e de 10,99 µg.L-1 (tempo de 24 h). Após a filtração em FCAG, as concentrações de TAM reduziram, nos tempos de reação de 30 min e 24 h, para 1,94 e 6,94 µg.L-1, respectivamente. Com relação a formação dos AHA após a filtração em FCAG, resultaram percentuais de remoção de 77,2 e 21,5% nos tempos de reação de 30 min e 24 h, respectivamente.

Com relação à intercloração (Ensaio III), as concentrações de AHA encontradas nos efluentes do FRD e do FCAG foram menores quando comparadas aos valores obtidos no Ensaio II. Após a filtração em FCAG, as concentrações de TAM e AHA foram de 6,19 e 11,94 µg.L-1 respectivamente no tempo de reação de 30 min, e de 7,59 e 20,68 µg.L-1 respectivamente, no tempo de reação de 24 h. Ou seja, a unidade de filtração em carvão ativado granular foi eficiente na remoção dos SOH conforme os limites preconizados pela Portaria nº 2.914/2011 de 0,1 mg.L-1 de TAM e de 0,08 mg.L-1 de AHA (BRASIL, 2011).

As maiores concentrações de SOH foram de ácidos haloacéticos, conforme as Figuras 7 e 8, mas os resultados obtidos resultaram abaixo do permitido na Portaria nº 2.914/2011 (BRASIL, 2011).

Os outros SOH analisados nos Ensaios I, II e III (tricloroacetaldeído, cloropicrinas, haloacetonitrilas e haloacetonas) resultaram concentrações abaixo do limite de detecção dos métodos empregados nas análises, de 0,01 µg.L-1.

Conclusões

Em função dos resultados obtidos, concluiu-se que:

• os ensaios realizados na IPDF evidenciaram que o uso da intercloração associada à adsorção em carvão ativado granular (Ensaio III) mostrou-se plenamente capaz de produzir água em conformidade com a Portaria nº 2.914/2011;

• as eficiências médias obtidas referentes à remoção de células de cianobactérias foram de 98,8% no Ensaio I, de 99,5% no Ensaio II (pré-cloração) e de 100% no Ensaio III (intercloração); as concentrações máximas de SOH encontradas nos efluentes do FRD e do FCAG não ultrapassaram os limites preconizados pela Portaria nº 2.914/2011, de 0,1 mg.L-1 de TAM e de 0,08 mg.L-1 de AHA;

• as concentrações de haloacetonitrilas, halocetonas e halopicrinas nos ensaios resultaram inferiores aos limites de detecção do método empregado; houve maior formação de SOH com a pré-oxidação em comparação aos outros ensaios, e a interoxidação promoveu uma melhor eficiência de remoção dos parâmetros de controle como cor, turbidez e células de cianobactérias;

• a adsorção com carvão ativado granular, como pós-tratamento, mostrou ser bastante eficiente para assegurar a qualidade dos efluentes finais no ensaios realizados, especialmente com relação à matéria orgânica, remoção de cianobactérias, turbidez, cor e formação de SOH;

• pelas características da água bruta em estudo, somente a tecnologia da DF atenderia à Portaria nº 2.914/2011, evidenciado que nem sempre a pré ou a intercloração são necessárias.

Agradecimentos

À SANEATINS pelo uso da instalação piloto de dupla filtração e ao apoio dado na realização do trabalho.

Referências

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