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Avaliação de desempenho de um sistema reator anaeróbio de manto de lodo modificado integrado a processo de lodo ativado tratando esgoto sanitário

Resumo

O reator anaeróbio tem grande aplicação no tratamento de esgotos sanitários, porém precisa de pós-tratamento para atingir os padrões de lançamento, podendo utilizar o sistema de lodos ativados. O objetivo deste trabalho foi avaliar o desempenho do equipamento piloto composto por reator anaeróbio integrado a sistema de lodos ativados. Empregou-se esgoto sanitário afluente à uma ETE, que após passar pelo tratamento preliminar, tem uma parcela encaminhada ao equipamento piloto. Para avaliação do desempenho deste utilizaram-se dados referentes à: caracterização do esgoto bruto, lodo inoculado no compartimento anaeróbio, além das análises de parâmetros físico-químicos das amostras de diferentes pontos do equipamento. O esgoto bruto apresentou valores de caracterização inferiores ao reportado na literatura. A análise de Atividade Metanogênica do Lodo (AME) no lodo inoculado resultou no valor de 0,531 gDQOCH4.gSTV-1.d-1. Os resultados do monitoramento com relação à eficiência foram: para a peneira 26,5% e 24,4%, respectivamente para a DBO e DQO, comparáveis com um Decantador Primário; no reator anaeróbio 54,3% para DBO, 41,7% para DQO e 56,9% para SST; no sistema de lodos ativados 56,3%, 65,6% e 67,5% para DBO, DQO e SST respectivamente. Por fim, a eficiência global do sistema resultou em 64,1% e 55,1% para DBO e DQO.

Introdução

O reator UASB (Upflow Anaerobic Sludge Blanket) foi desenvolvido na Holanda por Lettinga e colaboradores, mas começou a ser utilizado para o tratamento de efluente doméstico no início da década de 1980. Ele é um tipo de reator anaeróbio. A sua grande aplicação pode ser atribuída a algumas características como a alta concentração de biomassa no reator, o que propicia alto tempo de detenção celular; desenvolvimento de grânulos ou lodo denso, composto por diferentes grupos de microrganismos, responsáveis pela transformação de matéria orgânica em metano e dióxido de carbono; baixa necessidade de nutrientes; baixa produção de lodo; alta estabilidade em resposta a flutuações no afluente e baixo consumo de energia elétrica (Foresti, 2002; Chernicharo et al, 2015 ).

Como exemplos de países que utilizam esta tecnologia podem ser citados Brasil, México, Colômbia, Cuba, Uruguai, Índia, entre outros (Foresti, 2002; Chernicharo et al, 2015). No Brasil, segundo levantamento do Atlas Esgotos (Brasil,2017), são encontradas 328 estações de tratamento de esgoto (ETE) que contam com reatores anaeróbios tipo UASB como principal processo. No Paraná são 258 ETEs operadas pela Sanepar que adotaram esta técnica para o tratamento (Chernicharo et al, 2018).

CAMARGO (2016) avaliou o desempenho de um reator UASB, sem defletor de biogás, com volume útil de 24,5 m³, para diferentes tempos de detenção hidráulica (TDH) – 16, 12 ,10 e 8 horas. Em grande parte do período de monitoramento as vazões foram mantidas constantes, porém na última fase, foram determinados dois picos de vazão ao longo do dia. Observou-se que o reator não apresentou o desempenho esperado com relação à remoção de matéria orgânica para TDH de 8 horas. O perfil de sólidos também permaneceu elevado para as duas primeiras fases, no entanto reduziu drasticamente para TDH de 10 horas. Já na última etapa, foi observado arraste de sólidos crescentes no reator.

Levando em consideração algumas características relativas ao tratamento de efluentes em um reator UASB, como a eficiência na remoção da DBO (demanda bioquímica de oxigênio) atingir valores entre 60 a 70% e pelo fato deste reator não remover nutrientes, é preciso adotar um pós-tratamento, e uma das opções é combinar com o sistema de lodos ativados (LA).

Existem várias modalidades de lodos ativados. As mais utilizadas são a convencional e a aeração prolongada. O que difere os dois tipos é a idade do lodo, que é como é chamado o tempo de retenção celular. Em um sistema convencional, parte da matéria orgânica é retirada antes de entrar no tanque de aeração, por meio do decantador primário. Neste sistema a idade do lodo varia entre 4 a 10 dias e o tempo de detenção hidráulica no reator é de 6 a 8 horas. Por ser baixa a idade do lodo, é necessário estabilizar a biomassa excedente, em uma unidade externa ao tanque de aeração, já que contém elevado teor de matéria orgânica (von Sperling, 1997). Os sistemas de lodos ativados são muito utilizados no tratamento de esgotos, porque têm a capacidade de reduzir ou eliminar nutrientes, além da remoção eficiente do material orgânico. No entanto tem custo de implantação e operacional elevados, devido ao grande volume das unidades operacionais, e alto consumo de energia para aeração e das operações de digestão do lodo (Silva Filho e van Haandel, 2014).

Na avaliação do desempenho de um processo de lodos ativados existem dois fatores considerados importantes: as reações de remoção de substrato que ocorrem no tanque de aeração e a eficiente separação dos sólidos, que ocorre no efluente final. Uma alta quantidade de sólidos voláteis totais no efluente em suspensão fazem com que este precise de mais oxigênio. Já a capacidade de clarificação dos esgotos domésticos depende da idade do lodo, características hidráulicas e do nível de oxigênio dissolvido no tanque de aeração (Além Sobrinho,1983).

Para reduzir o custo deste sistema é possível aplicar um tratamento anaeróbio a montante. Nesta configuração podem ser citadas as seguintes vantagens: o volume do tanque de aeração é menor que o do sistema unicamente aeróbio; ocorre diminuição da demanda de energia elétrica devido à remoção de parte da carga orgânica na etapa anaeróbia; o biogás produzido pode ser utilizado para gerar energia e a estabilização do lodo aeróbio pode acontecer no reator anaeróbio, o que dispensa o adensador e o digestor de lodo (Aisse et al., 2002; Silva Filho e van Haandel, 2014).

AISSE et al. (2002) apresentam resultados do monitoramento do sistema piloto UASB + LA de alta taxa, operando com esgoto sanitário, onde se aplicaram no tanque de aeração tempos de detenção de 3 horas (Fase I) e 4 horas (Fase II). Na Fase I, o efluente do decantador secundário apresentou valores de 61  25 mg/L, 17  19 mg/L e 27  20 mg/L, respectivamente para DQO (demanda química de oxigênio), DBO e SST (sólidos suspensos totais). Estes valores representaram eficiências de remoção do sistema de 88%, 94% e 89% para os citados parâmetros. Na Fase II o efluente apresentou valores de 97  18 mg/L, 17  8 mg/L e 55  8 mg/L, respectivamente para a DQO, DBO e SST. A idade do lodo utilizado em ambos os trabalhos foi de dois dias. CHERNICHARO et al (2015), citando MUNGRAY e PATEL (2011), apresentam para sistema UASB + LA eficiência de remoção de DQO de 84%, DBO de 94% e SST de 62%. O mesmo artigo também cita CHERNICHARO (2006) e relata eficiências de remoção para os seguintes parâmetros: de 75% a 88% de DQO, de 83 a 93% de DBO e de 83 a 97% de SST. Outro estudo em uma planta, em escala plena, com o mesmo arranjo, atingiu as seguintes eficiências de remoção: 91% para DQO, 94% para DBO e 92% para SST. Porém o lodo aeróbio não retorna ao reator UASB para digestão e adensamento (Saliba e von Sperling, 2017).

O tratamento anaeróbio antes de tratamentos aeróbios deve ser analisado cuidadosamente, porque a remoção de DQO tem efeito negativo na remoção de nutrientes nos sistemas biológicos. As relações de Nitrogênio/DQO e Fósforo/DQO têm valores mais altos do que os desejados para o bom desempenho para a remoção biológica de nutrientes (Chernicharo et al., 2015). Para que ocorram os processos para remoção de nitrogênio o reator anaeróbio deve tratar apenas uma parcela do esgoto afluente, de 50% a 70%. A vazão restante deve ser encaminhada diretamente para o tratamento biológico para que ocorram os processos de nitrificação e desnitrificação. Nessa configuração o lodo gerado no tratamento aeróbio será encaminhado para oreator UASB, fazendo com que possa ser dispensado o digestor de lodo (Chernicharo et al., 2015).

 

Autores: Patrícia Beatriz Baréa; Bárbara Rosa de Azevedo; Bárbara Zanicotti Leite Ross; Bruno Pessotto e Miguel Mansur Aisse.

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