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Modelagem hidrogeoquímica das águas minerais do parque Salutaris, Paraíba do Sul, RJ

Resumo: As águas minerais do Parque Salutaris no município de Paraíba do Sul, região centro-sul do estado do Rio de Janeiro, consistem em um recurso explorado para consumo humano desde 1887. Essas águas são provenientes de aquíferos fissurais com litologias variadas, tais como gnaisse, granulito e diabásio que lhes conferem características hidroquímicas excepcionais. O objetivo desse trabalho foi compreender os processos geoquímicos responsáveis pela mineralização das águas subterrâneas do Parque Salutaris e identificar possíveis riscos quanto ao consumo dessa água pela população. Para tanto, dentro do parque, foi realizado um monitoramento das águas minerais durante 10 meses, a partir de 3 poços tubulares que captam as águas, nas fontes de distribuição dessas águas e em uma cava que acumula água subterrânea dentro de uma gruta. Também foram realizadas amostragens no rio Paraíba do Sul e em uma nascente a montante do parque, como medidas de background. Foram realizadas medidas físico-químicas “in situ” e análises laboratoriais dos íons maiores Na, K, Mg, Ca, Cl, SO4, HCO3, constituintes menores e traços Al, Mn, Fe, e F, dos nutrientes, SiO2, N-NO2, N-NO3 e P-PO4, de coliformes totais e termotolerantes. Para os materiais geológicos considerados produtos do intemperismo na região foram realizadas análises mineralógicas por DRX da fração argila e comparadas com a modelagem das espécies minerais, disponíveis em água através do PHREEQC. Os tipos hidroquímicos das águas foram: águas bicarbonatada sódica na gruta, bicarbonatada sódica a mista para o poço Nilo Peçanha, bicarbonatada mista no poço Alexandre Abraão e bicarbonatada magnesiana a mista no poço Maria Rita. Verificou-se que as concentrações dos íons dissolvidos teriam origens principais a partir do intemperismo químico de minerais como micas, feldspatos, piroxênio e plagioclásio, presentes no embasamento gnáissico e granulítico. A modelagem hidrogeoquímica permitiu identificar que as espécies minerais carbonáticas tendem ao equilíbrio, enquanto os argilominerais e óxidos de ferro tendem a saturação. Os minerais secundários, identificados através do DRX, estão de acordo com a modelagem no PHREEQC, sendo encontrados principalmente a caulinita, gibbsita, goethita, calcita e clorita no material geológico. Também foram confirmadas que concentrações dissolvidas do flúor e manganês possuem origens naturais. Não foi identificado contaminação por efluentes nos poços de captação das águas minerais. A pesquisa considerou a ingestão de flúor e manganês das águas minerais por receptores residenciais na avaliação de risco a saúde humana, sendo constatado que bebês e infantes podem estar submetidos a riscos crônicos no que tange o desenvolvimento de fluorose dentária.

Introdução: A água é um elemento fundamental para a manutenção de todas as formas de vida em nosso planeta. Genericamente, as águas disponíveis na crosta terrestre e na atmosfera fazem parte do ciclo hidrológico e, apesar de dois terços da superfície da Terra estar coberta por água, apenas uma pequena porção é doce e disponível para consumo humano (0,5%). Desse recurso natural, 7% consiste em água de superfície e 93% em água subterrânea, que é encontrada geralmente em poros e fissuras de materiais geológicos que compõem a crosta terrestre.
As águas subterrâneas são um recurso natural imprescindível para a vida e mais da metade da população mundial depende desse recurso para abastecimento público (RIBEIRO, 2009). Essas águas que são extensamente utilizadas pela população e pelo mercado econômico são águas que se acumulam em zonas saturadas chamadas de aquíferos, onde todos os poros, no caso de rochas sedimentares, e fissuras, no caso de rochas cristalinas, encontram-se preenchidos por água (CUSTODIO; LLAMAS, 1983).
Quimicamente, a água é uma substancia muito ativa, que tem grande facilidade de dissolver e reagir com outras substâncias inorgânicas e orgânicas. A característica que dá essa importância à água nos processos geoquímicos decorre principalmente da estrutura dipolar de sua molécula (FENZL, 1986), conferindo a ela a capacidade de agregar cátions, ânions e moléculas orgânicas. A decomposição de grande parte dos minerais das rochas ocorre porque a água é um solvente natural, capaz de dissolver uma infinidade de substâncias.
Reações como dissolução-precipitação, hidrólise, hidratação-desidratação, oxidação-redução entre a água que infiltra e o material geológico alteram sua composição, ou seja, o maior responsável pela composição química das águas subterrâneas consiste no intemperismo químico, que é influenciado principalmente pela intensidade das precipitações, pelas variações de temperatura, troca de gases com a atmosfera (DEUTSCH, 1997; FENZL, 1986).
O comportamento dos íons dissolvidos disponibilizados pelo intemperismo químico pode ser estimado através de modelagem hidrogeoquímica, sendo utilizado, por exemplo, para descrever os processos de evolução hidroquímica de um ou vários tipos de aquíferos que podem ser porosos, cársticos ou fissurais.

Os aquíferos porosos recobrem apenas de 20% do Rio de Janeiro e as rochas cristalinas cerca de 80% do estado estando, as águas subterrâneas e consequentemente, as águas minerais predominantemente distribuídas em aquíferos fissurais (MARTINS et al., 2006). De acordo com DNPM (2004), captações em aquíferos fissurais no Rio de Janeiro prevalecem em rochas granitóides (granito-gnáissicas-migmatíticas).
Poucos são os estudos sobre condições de ocorrência, tipos hidroquímicos e comportamentos hidrogeoquímicos das águas subterrâneas provenientes de sistemas fissurais no estado do Rio de Janeiro, especialmente na região de produção de águas minerais da Bacia do Rio Paraíba do Sul, onde encontra-se o Parque Salutaris.
Pinto et al. (2006) classificaram as águas subterrâneas provenientes de aquíferos fissurais no norte do estado do Rio de Janeiro (Itaperuna) em bicarbonatadas cálcicas e sulfatadas, na região serrana (Nova Friburgo, Petrópolis e Teresópolis) predominaram faces bicarbonatadas sódicas e cálcicas e na região centro-sul fluminense, na Bacia do Rio Paraíba do Sul, foram identificadas águas minerais bicarbonatadas cálcicas, sódicas e magnesianas atribuídas à presença de gnaisses e migmatitos na zona de recarga.
As águas minerais do Parque Salutaris consistem em um recurso natural de inestimável importância, explorado para consumo humano desde 1887, com produção e engarrafamento industrial datados do início do século 20 (FCPS, 2012). Atualmente, o parque é administrado pela prefeitura de Paraíba do Sul e a disponibilização das águas minerais é feita de forma gratuita para a população, através de fontanário no interior do parque.

Considerando que a população das redondezas do parque ingere suas águas sem tratamento prévio, a necessidade de se entender o comportamento geoquímico dos aquíferos torna-se mais importante, bem como conhecer as características geoquímicas que podem influenciar diretamente a saúde dos indivíduos consumidores.
Além da importância do consumo dessas águas, foi relevante para o desenvolvimento dessa pesquisa considerar o fato que estudos anteriores como o de Lima et al. (2013), Gomes et al. (2013) e Cruz (2014) verificaram distintos grupos hidroquímicos de águas minerais e valores altos de flúor e manganês dissolvidos, que seriam resultantes do intemperismo químico, atuante nos vários sistemas aquíferos fissurais da área.

Baseando-se nas premissas anteriores, este trabalho envolve a compreensão do comportamento geoquímico e caracterização do risco pelo consumo das águas minerais do Parque Salutaris, localizado no município de Paraíba do Sul, na região centro-sul do estado do Rio de Janeiro.
A interpretação do comportamento hidrogeoquímico das águas doces naturais através da modelagem pode auxiliar na compreensão de níveis de toxicidade, biodisponibilidade e mobilidade de elementos no ambiente, bem como suporte para o estabelecimento de indicadores de sustentabilidade ambiental, ações de mitigação e apoio à tomada de decisão, no que diz respeito, por exemplo, às medidas de saúde pública (CESAR, 2011).

Autora: Ingrid Fernandes Dias da Cruz.

Leia o estudo completo: Modelagem hidrogeoquímica das águas minerais do parque Salutaris, Paraíba do Sul, RJ

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