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Combinação de processos com membranas para remoção de sulfato da água do mar para injeção em reservatórios de petróleo

Resumo

Água do mar é comumente utilizada como fluido de injeção em plataformas offshore na recuperação secundária do petróleo. Porém, a presença de sulfato causa diversos inconvenientes, como a formação de precipitados, que podem se depositar em diversas partes da plataforma de produção. Atualmente, a dessulfatação é realizada em unidades removedoras de sulfato (URS) por processo de nanofiltração (NF), cujas amostras precisam ser pré-tratadas, usualmente em filtros cartuchos. Os sólidos suspensos e os microrganismos que não foram retidos pelo sistema de filtração podem depositar sobre a superfície das membranas de NF, diminuindo a produtividade do sistema e reduzindo o tempo de vida das membranas. O processo de microfiltração (MF) pode ser utilizado como pré-tratamento alternativo e possibilitaria a remoção desses elementos. Neste estudo, foi desenvolvido um processo combinado de MF e NF para a dessulfatação da água do mar, visando a sua injeção em reservatórios de petróleo. Módulos de permeação contendo membranas de poli(imida) no formato de fibras ocas foram utilizados na construção de um sistema piloto de MF integrado a um sistema piloto de NF similar aos já atualmente utilizados nas plataformas. O desempenho dos sistemas foi avaliado por meio do acompanhamento da permeabilidade de ambos durante a filtração da água do mar. Parâmetros como grau de recuperação de água, frequência e eficiência de procedimentos de retrolavagem e limpeza química também foram estudados. Os resultados demonstraram que o pré-tratamento da água do mar por MF é uma alternativa eficaz para a dessulfatação por NF.

Introdução

Usualmente, a extração de petróleo inicia-se a partir de diversos mecanismos naturais em razão da pressão interna do reservatório, porém a pressão tende a decair ao longo do tempo, sendo necessário que outros métodos de recuperação sejam utilizados. Uma das formas de recuperação secundária é a injeção de um fluido no reservatório, geralmente aquoso. A injeção, além de recuperar a pressão e aumentar a recuperação do petróleo, também atua para evitar o colapso do reservatório após a remoção dos hidrocarbonetos (BAILLIE, 2007).

É importante que o fluido de injeção seja quimicamente compatível com a água de formação, a fim de evitar a dissolução ou o inchamento da rocha do reservatório. Além disso, não deve possuir sólidos suspensos e material coloidal, de modo a minimizar o bloqueio dos canais por onde há passagem de fluidos (BADER, 2006; BAILLIE, 2007). A injeção de água do mar é uma operação já bem estabelecida, sendo a opção mais utilizada, especialmente em operações offshore ou costeiras, em razão de sua grande disponibilidade e salinidade razoavelmente compatível com a da água de formação (BADER, 2007).

Um dos maiores problemas envolvendo a injeção de água do mar é a formação de incrustações em razão da precipitação de sais (scaling). Na maioria dos reservatórios, a água de formação contém cátions alcalinos, tais como cálcio, estrôncio e bário (BADER, 2006). Ânions de sulfato divalentes (SO4 -2) presentes na água do mar se combinam com esses cátions, formando precipitados. Esses precipitados são altamente insolúveis, especialmente o sulfato de bário, além de aderentes e difíceis de serem removidos mecanicamente. Pode ocorrer acúmulo de precipitado em diversas partes da plataforma de produção, bem como no próprio reservatório, o que dificulta o escoamento dos fluidos e, consequentemente, a produtividade do sistema. Os danos causados no poço podem, ainda, ser suficientes para causar o desligamento dele (BADER, 2007; BAILLIE, 2007; VASCONCELOS; LIGÓRIO, 2009).

Além dos problemas relativos às incrustações, a presença de sulfato pode acarretar o crescimento de bactérias redutoras de sulfato (BRS), que produzem sulfeto de hidrogênio (H2 S). O H2 S é um agente extremamente tóxico e corrosivo e, quando presente, acarreta etapas de tratamento adicionais no processamento do petróleo e do gás natural, além de requerer a instalação de sistemas adicionais de segurança (BAILLIE, 2007; VASCONCELOS; LIGÓRIO, 2009). Dessa forma, a presença de sulfato na água do mar acarreta inúmeros tipos de problemas operacionais, além do aumento do custo de operação e dos custos de capital.

Uma das maneiras de evitar os danos causados pelo sulfato é a adição de agentes químicos, geralmente inibidores de incrustação (anti- -incrustantes), porém esses produtos possuem eficiência limitada. Após a formação do precipitado, os danos podem ser mitigados com a injeção de produtos químicos para dissolução parcial deste, entretanto o uso de produtos químicos apresenta eficiência limitada e possui alto custo. A remoção mecânica de incrustações é extremamente custosa e dispendiosa (BADER, 2007). Dessa maneira, a melhor opção para minimizar os danos causados pelo sulfato é a sua remoção, antes da injeção da água do mar no reservatório.

Essa remoção deve ser feita de maneira que os íons de sulfato devem ser seletivamente removidos, enquanto a salinidade da água de injeção deve ser parcialmente mantida para preservar a estabilidade da rocha do reservatório. O processo de nanofiltração (NF) apresenta as características necessárias para atingir esse objetivo. Em 1988, a Marathon Oil Brae desenvolveu, em conjunto com a Dow Química, uma membrana de NF capaz de remover mais de 98% do sulfato da água do mar, enquanto permite a passagem de outros sais (SILVA et al., 2015). Dessa forma, foi criado o processo de dessulfatação por NF, instalado em unidades removedoras de sulfato (URS). Em 2015, quase 30 anos depois, mais de 80 URS foram instaladas globalmente, com cerca de cinco a dez projetos de unidades sendo criados todo ano (BOCZKOWSKI, ERIKSSON; SIMIONATO, 2015).

O processo de dessulfatação é iniciado com o pré-tratamento da água do mar antes da NF, o que geralmente ocorre com uma série de filtrações consecutivas (SILVA et al., 2015). Na filtração fina, são utilizados usualmente filtros do tipo cartucho, para remoção parcial de sólidos suspensos. Na etapa de NF, as membranas possuem configuração no formato de módulos espirais, que são acomodados em vasos de pressão. Diversos vasos são instalados em paralelo para atender a capacidade de tratamento desejada. Para aumentar a eficiência da unidade, deve-se aumentar a recuperação da água dessulfatada e, para isso, diversos vasos também são instalados em série, representando um novo estágio de permeação. Frequentemente, para atingir a especificação da concentração de sulfato na água de injeção, a corrente permeada pela membrana é novamente pressurizada para uma nova etapa (ou passo) de permeação (PEDENAUD, HURTEVENT; BARAKA-LOKMANE, 2012). Dessa forma, a configuração da NF pode incluir dois estágios e dois passos.

A NF oferece diversas vantagens atrativas para o processo de dessulfatação, como baixa operação de pressão, altas vazões, custos de investimento, manutenção e operação relativamente baixas. As membranas também estão sujeitas a incrustações, que podem ser causadas igualmente por precipitações inorgânicas, microrganismos e/ou sólidos suspensos, e podem diminuir a vazão de produção, aumentar os custos de operação e diminuir o tempo de vida das membranas (HILAL et al., 2004). A adição de agentes anti-incrustantes e biocidas pode minimizar esses efeitos, mas não é completamente eficiente. Por isso, periodicamente, limpezas químicas são necessárias para recuperar o fluxo permeado das membranas.

A escolha do agente de limpeza é altamente dependente do tipo de incrustação, e a combinação de dois ou mais agentes pode apresentar melhor capacidade de recuperação. Estudos descrevem que soluções alcalinas são eficientes na remoção da incrustação por compostos orgânicos e microrganismos. Para a remoção de compostos inorgânicos é mais eficiente a limpeza com soluções ácidas (MOHAMMAD et al., 2015; WOO et al., 2015), porém a utilização de limpezas químicas pode afetar os materiais que constituem as membranas, diminuindo o tempo de vida delas, que pode ser de três a mais de seis anos, e é altamente dependente do pré-tratamento (PEDENAUD, HURTEVENT; BARAKA-LOKMANE, 2012).

Mesmo quando é operado de forma apropriada e com devida manutenção, o pré-tratamento convencional com filtros cartucho não é capaz de promover uma remoção apropriada dos sólidos suspensos e dos microrganismos (JEZOWSKA et al., 2009), afetando significantemente o tempo de vida útil das membranas. Os filtros apresentam outras desvantagens, como necessidade frequente de substituição e equipamentos com grande volume e peso. Além do custo envolvido, paradas para limpeza e substituição de filtros e membranas acarretam perda de injetividade.

Recentemente, os processos de microfiltração (MF) e ultrafiltração apareceram como alternativas ao pré-tratamento convencional, possibilitando melhor estabilidade para o processo de dessulfatação (JEZOWSKA et al., 2009). Em alguns sistemas, a ultrafiltração já tem sido utilizada em substituição aos filtros cartucho convencionais e possibilitou uma melhora significativa na produtividade da URS (ALAM et al., 2017; BOCZKOWSKI; ERIKSSON; SIMIONATO, 2015; JEZOWSKA et al., 2009; PEDENAUD; HURTEVENT; BARAKA-LOKMANE, 2012). A MF também aparece como alternativa promissora, visto que as membranas podem ser capazes de remover sólidos suspensos e microrganismos, possuem fácil manutenção, além de possibilitar a diminuição de tamanho e peso do sistema de pré-tratamento. Para melhor desempenho, o sistema de MF requer a utilização periódica de retrolavagem e de limpezas químicas para restituição do fluxo permeado.

No Brasil, a Petrobras utiliza diversas URS e produz mais de três milhões de barris de água de injeção por dia, pois a água de injeção apresenta importância vital para a economia dos campos de exploração, tornando-se uma das prioridades da empresa (SOUZA et al., 2005). Nesse contexto, a substituição do pré-tratamento convencional por MF apresenta-se como tecnologia promissora para melhor estabilidade na produção de água para injeção. Assim, este trabalho avaliou, em escala piloto e condições semelhantes às existentes em URS, a eficácia do pré-tratamento da água do mar por MF a montante da unidade de NF.

A variação do fluxo permeado nos sistemas de MF e de NF foi estudada para avaliação do desempenho dos sistemas. Outros parâmetros também foram avaliados, como grau de recuperação de água e eficiência da retrolavagem da MF, assim como a adição de agente anti- -incrustante durante a dessalinização. A recuperação da permeabilidade das membranas de MF e de NF após limpezas químicas também foi avaliada. É importante enfatizar que a natureza modular dos processos de separação com membranas permite que esse sistema integrado seja facilmente escalonado para aplicação em escala industrial.

Autores: Amanda Loreti Hupsel; Cristiano Piacsek Borges; Gisele Mattedi Barbosa e Nityananda Yudice Gonzalez.

 

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