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Uso da fitorremediação na remoção de metais de águas contaminadas por rejeitos de mineração: estudo de caso da barragem de Fundão, Mariana-MG

Resumo

Os produtos resultantes da atividade de mineração são essenciais ao desenvolvimento socioeconômico e apresentam posição de destaque no cenário brasileiro. Entretanto, tal fato não pode ocultar os inúmeros impactos ambientais negativos inerentes a esta atividade. Além destes impactos, a atividade de mineração no Brasil acumula um histórico de desastres que resultaram em enormes danos sociais e ambientais. Em novembro de 2015 ocorreu, em Mariana-MG, o rompimento de uma barragem de rejeitos da mineradora Samarco S.A., estima-se que 34 milhões de metros cúbicos de rejeitos foram liberados para o ambiente nesse episódio que ficou conhecido como o maior desastre ambiental do Brasil. Visto que elevado volume deste material atingiu cursos d’água por grande extensão e dada a presença de diferentes metais em sua constituição, este estudo teve como objetivo avaliar o potencial da espécie Salvinia auriculata de remover os metais Ferro, Manganês e Alumínio, existentes no Rio Gualaxo do Norte através da técnica de fitorremediação. Foram realizados dois experimentos, no Experimento I, a Salvinia auriculata foi submetida a período de aclimatação e se mostrou eficiente na remoção dos metais em 37,41%, 67,68% e 68,52%, e no Experimento II, em que não houve aclimatação, a média de remoção foi de 36,4%, 70,3% e 44,07% para o Ferro, Manganês e Alumínio, respectivamente.

Introdução

A mineração caracteriza-se por atividade de exploração de minerais ou compostos minerais, que se concentram naturalmente na superfície terrestre e possuem valor econômico. O setor minerário fornece matéria-prima para indústrias secundárias através da exploração e/ou modificação dos recursos naturais, transformando-os em produtos primários, portanto, é essencial ao desenvolvimento econômico e melhoria da qualidade de vida das pessoas (LOPES, 2017).

Concomitante aos processos de exploração e transformação dos recursos naturais realizados pela mineração surgem impasses ambientais que variam quanto à diversidade e amplitude. Para Farias (2002), no Brasil, os impactos negativos causados pela atividade de mineração podem ser agrupados em quatro categorias: poluição da água, poluição do ar, poluição sonora e subsidência do terreno.

De acordo com Mechi e Sanches (2010), a qualidade das águas a jusante da mineração pode ser alterada pelo aumento da turbidez, devido à presença de sedimentos finos em suspensão e por contaminação com substâncias como metais pesados, óleos e graxas, que são lixiviadas para os cursos d´água próximos ou estão presentes nos efluentes gerados pelo empreendimento. Já poluição atmosférica e sonora se dá basicamente pela emissão de material particulado e gases, e por vibrações ocasionadas devido à utilização de explosivos para o desmonte de rochas. Além disso, a atividade implica na supressão de vegetação, o solo superficial de maior fertilidade é removido, sendo submetidos a processos erosivos que podem ainda resultar no assoreamento de corpos d’água no entorno.

Dois tipos de resíduos, por serem gerados em grande escala, se destacam na atividade mineradora: os estéreis e os rejeitos, devido ao grande volume gerado. Os estéreis são resíduos sólidos sem nenhum valor econômico produzidos no decapeamento da jazida, são dispostos em estruturas implantadas para acumular material sólido, conhecidas como pilhas de estéril. Os rejeitos são materiais descartados na etapa de beneficiamento de minério, também sem valor econômico, possuem alto grau de toxicidade e presença de partículas dissolvidas e em suspensão, metais pesados e outros reagentes. As características granulométricas do rejeito de minério de ferro têm a classificação de areias finas (lama) e médias, de alta permeabilidade (LOZANO, 2006; CAMPOS et al., s.d.).

Apesar de não possuírem valor econômico agregado, os rejeitos devem ser devidamente armazenados para proteção ambiental devido às suas características poluidoras, que variam de acordo com o tipo de mineral explorado e de seu beneficiamento. Para a sua disposição é necessária a construção de grandes estruturas, que são as barragens feitas ao longo do tempo, um dique de partida é construído inicialmente e há alteamentos sucessivos durante a vida útil da barragem, que pode ser construída com materiais provenientes da área ou com opróprio rejeito (ANA, 2016). A disposição final dos rejeitos de mineração é um investimento sem retornofinanceiro para as mineradoras, portanto, durante muitos anos, as variáveis consideradas para determinar o local e demais critérios de construção destas estruturas se limitaram às econômicas. Com o tempo, normas ambientais foram elaboradas, assim como critérios estruturais de segurança e risco, obrigando mineradores considerarem outras variáveis (LOZANO, 2006).

É considerável a frequência de acidentes no ramo da mineração que resultam em intensos e extensos danos ao meio ambiente, entre estes, o rompimento de barragens de rejeitos é recorrente no Brasil e já causou enormes danos ambientais e sociais. Dentre os fatores que levam ao rompimento destas estão as legislações negligentes, a corrupção dos agentes públicos e fatores naturais, como solos instáveis e ausência de planejamento e tecnologias adequadas nas construções. O número de barragens rompidas no Brasil nos últimos anos é alarmante, principalmente no estado de Minas Gerais, onde 6(seis) se romperam até o ano de 2015. Recentemente, em 25 de janeiro de 2019, houve o rompimento de uma das barragens de rejeito da mina Córrego do Feijão, da Vale, em Brumadinho – MG, o maior desastre em termos de tragédia humana (MACHADO; AZEEZ, 2018, VALE, 2019).

Em 05 de novembro 2015, na cidade de Mariana-MG, houve o rompimento de uma barragem de rejeitos de minério de ferro da empresa Samarco Mineração SA, subsidiária da Companhia Vale do Rio Doce e da anglo-australiana BHP – Billiton. A barragem de Fundão, pertencente ao complexo de Germano, se rompeu e liberou cerca de 34 (trinta e quatro) milhões de metros cúbicos de rejeito no meio ambiente. Esta tragédia, apesar de não ter sido a pior em termos de fatalidade, ficou conhecida como o maior desastre ambiental do Brasil devido ao volume de lama despejado no meio ambiente e a extensão atingida pela onda de lama (IBAMA, 2015).

A lama de rejeitos proveniente da barragem de Fundão dizimou o Distrito de Bento Rodrigues, que era situado a jusante do ponto de rompimento. Em seguida alcançou o Rio Gualaxo do Norte, primeiro curso d’água atingido pela lama de rejeitos, que posteriormente desaguou no Rio do Carmo e Rio Doce, onde percorreu cerca de 680 quilômetros até a cidade de Linhares, no Espírito Santo, adentrando cerca de 60 quilômetros no Oceano Atlântico (FEAM, 2016). Além de destruir o Distrito de Bento Rodrigues, a onda de lama causou sérios transtornos a outros 7 (sete) distritos de Mariana – MG, aniquilou vidas humanas, soterrou nascentes, causou a contaminação de recursos hídricos por grande extensão, destruiu áreas de preservação permanente e causou prejuízos sociais, econômicos e culturais de grande amplitude.

Diante de estudos realizados pelo Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis – IBAMA verificou-se que o evento provocou diversas alterações no meio ambiente aquático, como, por exemplo, o aumento de índices de turbidez e dos níveis de contaminantes inorgânicos associados à lama de rejeito. A onda de lama ocasionou a mortandade de organismos aquáticos (em especial peixes e invertebrados), principalmente pela quantidade de sedimentos que ficaram disponíveis na coluna d’água (IBAMA, 2015).

Segundo dados divulgados pela no portal da Samarco sobre o rompimento da barragem, o maior impacto à qualidade da água ocorreu nos primeiros 80 quilômetros da bacia. A pluma de rejeitos afetou a captação direta de água do Rio Doce, comprometendo o abastecimento de água em nove cidades. O município de Governador Valadares, em Minas Gerais, e o de Colatina, no Espírito Santo, tiveram a captação de água afetada por oito e sete dias respectivamente (SAMARCO, 2019). O minério de ferro é composto tanto de metais que apresentam valor econômico agregado, quanto de outros que não possuem valor econômico. Assim, no processo de beneficiamento do material explorado são gerados rejeitos com diferentes minerais em sua composição (ANDRADE, 2014).

Os metais provenientes das atividades de extração, quando entram na dinâmica do sistema hídrico, representam riscos consideráveis de contaminação porque não se degradam, permanecendo solubilizados nas águas ou precipitados dependendo das condições físico-químicas. O conhecimento sobre estas alterações causadas no meio pelas atividades de mineração é fundamental para a tomada de decisões na implementação de medidas mitigadoras de impactos ambientais (COSTA, 2001). Em análises preliminares realizadas pelo IBAMA no ano de 2015, logo após o desastre os resultados das amostras de água dos rios afetados pelo rejeito apontam para alteração dos seguintes parâmetros de acordo com os limites de concentração de metais sendo eles: Metais totais: Alumínio (Al); Bário (Ba); Cálcio (Ca); Chumbo (Pb); Cobalto (Co); Cobre (Cu), Cromo (Cr); Estanho (Sn); Ferro (Fe); Magnésio (Mg); Manganês (Mn); Níquel (Ni); Potássio (K) ; Sódio (Na) e Metais dissolvidos: Alumínio (Al); Ferro (Fe) e Manganês (Mn).

Além da presença destes metais nos cursos d’água, o acúmulo de rejeitos da mineração de ferro nas margens e sedimentos dos rios pode ser revolvido aos cursos d’água na ocorrência de eventos climáticos ou por influência do homem. As águas do Rio Doce estarão sujeitas a novos picos de turbidez, quedas nos teores de oxigênio e aumento nas concentrações de metais, causando prejuízos para dependentes destes recursos hídricos por um período incalculável (SASSINE, 2015). Estes metais, mesmo quando ingeridos em pequenas concentrações, podem causar efeitos tóxicos ao homem, pois possuem capacidade de bioacumulação e biomagnificação na cadeia trófica (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2008).

De acordo com Ruppenthal (2013), os efeitos nocivos dos metais pesados ao organismo humano podem ocorrer em médio ou longo prazo, devido às suas propriedades de bioacumulação e biomagnificação. Quanto a parte toxicológica, estes metais possuem capacidade de afetar diferentes órgãos e tecidos do organismo, por serem altamente reativos do ponto de vista químico e não destrutíveis. A presença de outros metais e alteração de diversos parâmetros indica a necessidade de monitoramento contínuo do ambiente afetado, assim como sua remediação ou recuperação, que devem ser executadas com base no comportamento dos parâmetros alterados no ambiente hídrico (IBAMA, 2015).

Diante deste cenário, torna-se essencial o estudo de métodos que visem recuperar as condições originais de todo o ambiente afetado. Neste trabalho, será analisado o potencial de uma macrófita aquática, a espécie Salvinia auriculata, em remover os metais Fe, Mn e Al, de amostras de água do Rio Gualaxo do Norte através da fitorremediação. A fitorremediação é uma técnica que consiste em utilizar plantas para reduzir as concentrações de poluentes orgânicos ou inorgânicos no solo, sedimentos ou águas contaminadas. Este método é frequentemente aplicado na remediação de metais pesados e poluentes orgânicos. Concomitante à redução destes contaminantes, contribui com melhorias físicas, químicas e biológicas no meio em que é aplicada (LAMBERT et al., 2012).

Alguns requisitos devem ser atendidos para a utilização de determinada espécie vegetal na fitorremediação, a planta deve ser tolerante a altas concentrações do poluente, produzir grandes quantidades de biomassa, ser capaz de se adaptar as condições do ambiente impactado e apresentar resistência a pragas e doenças (OLIVEIRA et al., 2006).

A Salvinia auriculata é uma pteridófita pertencente à família Salviniaceae. Presentes em ambientes aquáticos, estas plantas são amplamente encontradas em regiões de clima tropical, e tem sido uma das espécies estudadas no processo de bioacumulação de íons metálicos encontrados em águas e efluentes, o que associado ao baixo custo da técnica de fitorremediação viabiliza seu emprego em larga escala (DELAQUA, 2016).

Autores: Mariana de Oliveira; Jocilene Ferreira da Costa; Tamara Daiane de Souza e Bárbara Carolina Reis.

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