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Contaminantes emergentes – fármacos: monitorização, avaliação do risco ambiental e do risco para a saúde humana

Resumo: O impacto dos fármacos nos ecossistemas aquáticos é ainda pouco conhecido e os dados existentes sobre a sua biodegradação, toxicidade e destino no ambiente são escassos. Consequentemente, os potenciais efeitos adversos crónicos na saúde humana são alvo de preocupação. Nesta perspetiva e no âmbito de uma tese de doutoramento, otimizou-se e validou-se um método de extração em fase sólida (SPE) e cromatografia líquida de ultra eficiência associada à espectrometria de massa tandem (UPLC-MS/MS) para a análise de fármacos em amostras de água. Em 2013, analisaram-se 34 fármacos em 243 amostras de água (superficial, subterrânea e água para consumo humano), pertencentes a 20 pontos de amostragem do sistema de abastecimento da EPAL. Foram quantificados 16 fármacos, com concentrações máximas entre 0,46 e 46 ng/L nas captações e entre 0,09 e 46 ng/L na água para consumo humano. Dos fármacos analisados, apenas a eritromicina apresenta um risco elevado para o ambiente (quociente de risco (RQ) superior a 1). A probabilidade de ocorrência de efeitos adversos na saúde do consumidor é baixa, uma vez que nenhum fármaco apresentou valores de RQ superiores a 1 ou 0,1.

Introdução: Os processos de urbanização, as descargas de efluentes industriais, domésticos e agropecuários e a transferência de poluentes durante a escorrência de águas pluviais têm um forte impacte no meio aquático. Consequentemente, é cada vez mais importante uma gestão sustentável do ciclo urbano da água e são necessárias novas metodologias de ação, assim como, um conhecimento mais integrado dos pontos de vista científico, técnico, ecológico e socioeconómico (Bertrand-Krajewski et al. 2000). Os contaminantes emergentes são uma das tendências ou desafios globais que irão afetar o setor da água nos próximos vinte anos. Os denominados “contaminantes emergentes” são contaminantes não regulamentados, que se podem tornar candidatos para futuras regulamentações, dependendo dos resultados dos estudos sobre a sua toxicidade e/ou efeito nefasto sobre o ambiente e na saúde humana e animal, e de dados de monitorização relativos à sua ocorrência no ambiente (Kummerer 2010). Os contaminantes emergentes englobam uma diversidade de compostos, incluindo cianotoxinas, micotoxinas, aditivos de gasolina e industriais, retardantes de chama bromados, hormonas esteroides, substâncias tensioactivas, produtos farmacêuticos e de cuidado pessoal, compostos polifluorados, nanomateriais e subprodutos de desinfeção, bem como os produtos de transformação resultantes dos mesmos. Nos últimos anos, os fármacos têm recebido especial atenção, facto refletido no número de estudos de ocorrência referentes a esta classe de contaminantes emergentes. Uma publicação de 2013, que analisa esta temática a nível global, refere a análise de 203 fármacos em 41 países, o que representa, no entanto, apenas 4% da totalidade de fármacos, considerando que só no mercado Europeu, aproximadamente 5000 produtos farmacêuticos tiveram autorização de introdução no mercado (Hughes et al. 2013). Estes contaminantes são particularmente importantes, porque, contrariamente à maioria dos poluentes, eles foram concebidos para terem uma ação específica no corpo humano e atuarem em concentrações muito baixas. A exposição crónica a concentrações baixas de alguns dos fármacos encontrados no ambiente, como os antineoplásicos, hormonas, antidepressivos, antibióticos, analgésicos, antiinflamatórios, antipiréticos e antidislipidémicos, pode originar efeitos muito adversos na saúde humana, nomeadamente, lesão celular, desregulação endócrina, infertilidade, alteração comportamental, resistência aos antibióticos e alteração da pressão arterial, entre outros, o que torna relevante e necessário o estudo da ocorrência destes compostos no ambiente e estudos de avaliação do risco de exposição (Kummerer 2010). A maior fonte de entrada de fármacos no ambiente aquático é através das estações de tratamento de águas residuais (ETAR), sendo importante reconhecer que independentemente da área geográfica, as águas residuais urbanas contêm resíduos de fármacos, diferindo apenas no tipo, quantidade e abundância relativa dos diferentes fármacos. Os antibióticos têm sido alvo de grande interesse, uma vez que a sua libertação para o ambiente aquático pode estar relacionada com o desenvolvimento de genes e bactérias resistentes a antibióticos (Rizzo et al. 2013). A Figura 1 representa os diferentes componentes do ciclo urbano da água constituído pelo ambiente aquático natural e pelas estruturas ou partes do ambiente aquático construídas pelo Homem e a forma como ambas se interligam, ilustrando que, devido a esta interligação, os fármacos 18 movimentam-se entre os dois ambientes, podendo, desta forma, causar potenciais riscos no Homem e organismos aquáticos e terrestres que dependam dos recursos hídricos para sobreviverem e se desenvolverem (Deo e Halden 2013). Face aos vários estudos de ocorrência, nacional e internacional nas várias matrizes de água, como por exemplo, os das hormonas e os dos fármacos (Henriques et al. 2010, Verlicchi et al. 2012, Gaffney et al. 2014, Gaffney et al. 2015, Pereira et al. 2015), é de prever que a curto e médio prazo poderão vir a ser tomadas medidas legislativas relativas aos limites de descarga de fármacos no ambiente por parte da indústria, agropecuária e hospitais, e desenvolver uma política de sensibilização do cidadão para a eliminação correta dos medicamentos excedentes e/ou fora de prazo.

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Autores: Vanessa Gaffney; Vítor Cardoso; Maria João Benoliel e Cristina Almeida.

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