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Identificação de perfil de consumo de água domiciliar por equipamento hidráulico e modo de uso via fuzzy-clustering como ferramenta de gestão de recursos hídricos no ambiente urbano

Resumo

A oportunidade de conhecimento mais apurado sobre o consumo d’água residencial possibilita grande avanço no desenvolvimento de políticas de melhor distribuição e preservação d’água, além de consequente redução da produção de efluentes. Atualmente, informações quanto ao consumo de água por residência conta com dados mensais provenientes do hidrômetro, que fornece volumes mensais de uso, contudo o mesmo não permite verificação da frequência e modo de uso dos equipamentos hidráulicos a partir dos consumidores. Essa limitação pode ser suprimida com o uso de medidores inteligentes pois propiciam uma visão mais precisa através da medição em intervalos curtos de tempo (minutos, segundos), produzindo perfis aproximados do consumo. Assim, com base nessas informações, este trabalho teve o objetivo de produzir um modelo de identificação de equipamentos a partir dos dados de perfis de uso não agregados; avaliar a regularidade de uso e volume de consumo por equipamento e a partir desses propor indicadores de uso d’água mais adequados à realidade local. Os dados foram provenientes de residências do bairro Chapada do Rio Vermelho, Salvador, por representarem a faixa de baixa renda, que é predominante na cidade. O modelo de reconhecimento de padrão foi construído com base na técnica de análise de componentes principais (PCA) e do algoritmo fuzzy c-means probabilístico. Os resultados indicaram considerável dificuldade na classificação dos perfis por conta da incapacidade do algoritmo de criar grupos que separassem os equipamentos sem confundi-los. A limitação apresentada se deu pela natureza dos dados pois, uma vez que os equipamentos variam entre semiautomáticos e manuais, há uma multiplicidade de usos que torna os perfis variados e, por conseguinte, com grande espalhamento, dificultando a criação de subespaços vetoriais com mínimo possibilidade para associações equivocadas. No entanto, apesar dos resultados obtidos, este estudo tem sua importância na exposição dessa característica dos dados, que direciona os próximos estudos a modelos que abarquem essas peculiaridades e possibilitem uma avaliação mais precisa do comportamento local.

Introdução

O caráter não renovável da água potável e sua aplicabilidade diversa e em diferentes seguimentos instigam a necessidade de melhor entendimento acerca do seu uso para desenvolver e aperfeiçoar estratégias de gestão da demanda. No quesito estudo da demanda residencial, há diversos trabalhos que buscam relacionar o volume d’água utilizado com características dos moradores e o contexto local no qual estão inseridos. Cominola et al. (2015) esperam que haja grande crescimento urbano mundial, que por consequência levará ao aumento demanda residencial, a qual hoje cobre uma grande parte do abastecimento público de água potável. Já Jorgensen et al. (2009) asseguram que problemas como aumento da população, poluição da água, desenvolvimento urbano, irrigação agrícola, mudanças climáticas e secas contribuem para disparidades entre a disponibilidade de fontes de água de qualidade e demanda de consumo. Complementando, Vašak et al. (2015) afirmam que as autoridades estão enfrentando problemas de escassez de água em muitas partes do mundo e que a redução desse consumo deve ser feita com a informação de como e quando a água é empregada. Assim, aprofundar o estudo sobre o consumo de água potável nesse setor possibilitará uma melhor gestão desse recurso, além de indiretamente contribuir para a redução de gastos energéticos necessários ao processo de tratamento do esgoto, e diminuição do impacto ambiental ocasionado pelo descarte dos efluentes de forma inadequada.

Os estudos relacionados à caracterização do uso de água intradomiciliar foram favorecidos pelas informações provenientes de medidores inteligentes (BENNETT et. al., 2013; NGUYEN et. al., 2014; LIU et. al., 2016). Diferindo dos hidrômetros usuais, os medidores inteligentes são dispositivos eletrônicos de alta resolução, capazes de medir o consumo de água, energia ou gás natural em intervalos de tempos curtos, com emissor de sinal integrado, unidos a equipamentos de captação automática e quase instantânea do sinal emitido. Os dados captados fornecem um perfil de consumo mais preciso e, portanto, torna-se uma importante fonte de informações acerca do consumo interno. Liu et al. (2016) mostram que, para melhorar a conservação da água utilizada em residências urbanas, é necessário que o consumidor conheça seu consumo interno de forma detalhada e o uso de medidor inteligente, tecnologia recente, tem uma contribuição muito importante nisso. Nguyen et al. (2014) e Bennett et al. (2013), com preocupações similares, têm seus estudos focados no consumo residencial de água na Austrália, que há certo tempo vem sofrendo com secas, e ressaltam que o acesso a dados fornecidos por medidores inteligentes foi um facilitador para modelagem do consumo por aparelhos. Neste trabalho, os perfis de consumo foram utilizados num modelo de identificação de padrões.

No contexto deste trabalho, a importância de identificar qual ou quais aparelhos (uso simultâneo) estão sendo utilizados decorre da possibilidade de conhecer, de modo mais detalhado, como os moradores direcionam o uso d’água e, por conseguinte, quais os aparelhos mais utilizados e seus volumes associados, além do volume diário residencial consumido. Embora campanhas de estímulo a conservação da água já sejam utilizadas, o feedback à sociedade sobre o uso desagregado d’água é mais preciso e pode promover conservação a nível individual e residencial (LIU et al, 2016); espera-se que o conhecimento gerado neste trabalho possa futuramente ser levado ao consumidor final e assim permitir uma gestão individual e consciente do consumo da água.

Através da obtenção de resultados de classificação consistentes é possível derivar informações de grande utilidade, e dessas, novos indicadores de gestão do recurso, para ambos concessionárias e consumidores. Liu et al. (2016) propõem um aplicativo de interface amigável, o HWU (Home Water Update), no qual se podem visualizar informações como porcentagem de consumo do tipo de aparelho pelo total volume d’água, tempo e volume médios de uso por tipo de equipamento, comparação do consumo médio da residência com outra(s) dentro do mesmo bairro (com características parecidas como o número de moradores) e, baseado no setor que mais consome água, fornecer dicas personalizadas de como reduzir o consumo. Vašak et al. (2015), com o COP (Customer On-line Portal), apresentam os resultados num formato mais simples com informações sobre frequência de uso por aparelho e o volume mensal médio por aparelho.

Nguyen et al. (2014) têm uma proposta similar a Liu et al. (2016), com a adição de informação a respeito do valor associado ao consumo e ainda uma versão para as concessionárias que deve incluir médias de consumo por localidades, para comparações de acordo com característica(s) relevante(s); padrões demanda diurna diária; relatórios de previsão de demanda de água para regiões selecionadas com base em dados fornecidos em tempo real. Eles ainda ressaltam que tais informações podem auxiliar no desenvolvimento de programas de conservação mais direcionados e também na modelagem de redes de tubulações otimizadas.

O estudo, com foco em residências de baixa renda, foi realizado no bairro Chapada do Rio Vermelho, Salvador e os dados foram obtidos através da instalação de medidor inteligente e data logger por unidade. A escolha deste bairro deveu-se ao fato do mesmo representar o perfil da população de baixa renda, que é uma parcela expressiva da população de Salvador, no aspecto socioeconômico. Sendo assim, conhecer o consumo de água residencial dessa parte da população é de grande importância. O sistema de monitoramento captou o consumo intradomiciliar a cada dez segundos, entre dezembro de 2010 a abril de 2014. Em comparação com os aparelhos hidráulicos residenciais utilizados por classes com rendas superiores, nota-se que aqui existe um predomínio de aparelhos de uso manual em detrimento dos automáticos, que são mais caros e despendem custos extras de energia elétrica. Essa característica torna esse estudo mais desafiador por conta dos diversos usos possíveis dos equipamentos.

O objetivo deste trabalho é desenvolver uma ferramenta de identificação do uso e modo de uso de equipamentos hidráulicos intradomiciliar com base no algoritmo fuzzy c-means probabilístico como forma de aprimoramento da gestão do consumo de água em centros urbanos, possibilitando a proposição de indicadores adequados à realidade socioeconômica local, o acompanhamento de seus hábitos de consumo e o desenvolvimento de políticas públicas de maior efetividade na redução de perdas e desperdício.

Autores: Adelmo Menezes de Aguiar Filho; Mariza Souza de Mello; Karla Patrícia Santos Oliveira Rodríguez; Gabriella Laura Peixoto Botelho e Asher Kiperstok.

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