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Biogás: evolução recente e potencial de uma nova fronteira de energia renovável para o Brasil

Resumo

Conhecido há muitos anos, o processo de produção de biogás utilizando resíduos e efluentes agropecuários, passou por inúmeros reveses em sua implementação no Brasil. Contudo, mais recentemente, a evolução tecnológica e a difusão do conhecimento técnico no setor têm levado a uma rápida expansão no número de plantas em operação e, consequentemente, no volume de biogás produzido. Embora auspicioso, o crescimento recente ainda é bastante tímido diante do potencial de geração que um país com um agronegócio tão desenvolvido pode atingir. Por suas características, a geração de biogás depende de uma série de fatores, como o tipo de resíduo utilizado, a quantidade de metano, a qualidade do biodigestor, entre outros. Esse montante de variáveis leva a distintas estimativas quanto ao potencial de geração do biogás. Este artigo busca contribuir nesse debate, apresentando algumas estimativas desse potencial.

Introdução

O biogás tem a matéria-prima de sua produção nas biomassas (resíduos orgânicos), notadamente os resíduos sólidos urbanos e da produção agropecuária, aí compreendidos vinhaça, palha e bagaço de cana, caroço de algodão e dejetos de animais (bovinos, suínos, aves etc.). A produção do biogás, quando este deriva de atividades agropecuárias, é também um fator de segurança energética, pois diminui as dificuldades de atendimento da demanda por energia elétrica em áreas distantes, do meio rural.

Como é sabido, o biogás é resultante da digestão anaeróbica de diversos organismos microbianos. Nessa digestão, matérias orgânicas complexas transformam-se em compostos simples, como metano e dióxido de carbono, liberando alguns resíduos, como amônia, sulfeto de hidrogênio e fosfatos (COSTA, 2006).

Em linhas gerais, esse processo envolve três etapas: fermentação, acetogênese e metanogênese. Na primeira fase, há a conversão de matéria orgânica em células menores e sua posterior transformação em ácidos solúveis e outros compostos. Na segunda, esses produtos são convertidos em ácidos acéticos, hidrogênio e dióxido de carbono. Finalmente, na terceira fase, ocorre a formação do metano.

As características do biogás dependem da temperatura, pressão, concentração de metano e outros gases inertes e/ou ácidos. É importante ressaltar esses pontos, pois o potencial energético do biogás está diretamente relacionado com a concentração de metano existente na mistura gasosa.

Teoricamente, é possível estimar a produção de metano por meio da estequiometria da digestão anaeróbica. Contudo, na prática, a produção efetiva costuma ser menor do que a estimada. Isso ocorre porque há diversas perdas associadas ao processo, decorrentes, por exemplo, da dispersão de parte do gás para a atmosfera. Dessa forma, para se calcular com maior precisão o potencial energético do biogás, é fundamental ter uma boa estimativa das perdas de metano associadas ao processo produtivo (SOUZA, 2010).

O Brasil, com sua pujante agropecuária, tem alto potencial de aproveitamento dos resíduos agropecuários na produção de biogás e, consequentemente, alto potencial de geração de energia. O biogás é aproveitado principalmente de três formas: na geração de energia térmica, na produção de energia elétrica e na produção de biometano.

O uso mais tradicional do biogás é sua queima para geração de calor em caldeiras ou em sistemas de aquecimento em geral. A maior dificuldade para sua utilização está na presença de gás sulfídrico (H2S), que aumenta a corrosão, reduzindo a vida útil da máquina; e do dióxido de carbono (CO2), que reduz seu poder calorífico. Esses problemas podem ser contornados por meio de revestimentos com materiais resistentes à corrosão e da instalação de purgadores e linhas de condensação (ARAUJO; FEROLDI; URIO, 2014).

A purificação do biogás leva ao biometano, combustível gasoso com alto teor de metano que, por suas características, é intercambiável com o gás natural veicular (GNV) em todas as suas aplicações. O processo de purificação consiste essencialmente em isolar o metano (CH4) de outras substâncias, resíduos e impurezas. Há vários processos com distintas vantagens e desvantagens, entre os quais, os mais comuns são a purificação por membranas, a purificação criogênica, a purificação por absorção, a purificação biológica e a lavagem por água (SILVA, 2017).

A qualidade do biometano proveniente de resíduos agropecuários é regulamentada pela Resolução ANP 8/2015. Na conversão para energia elétrica, o biogás é transformado em energia mecânica por combustão controlada. A energia mecânica ativa um gerador que produz a energia elétrica. Há várias tecnologias disponíveis, no entanto, as mais utilizadas são as turbinas a gás e os geradores de combustão interna.

Nas turbinas a gás, um compressor eleva a pressão do ar, injetando-o na câmara de combustão. O oxigênio queima o biogás, liberando energia para o acionamento da turbina que, por sua vez, aciona o gerador de eletricidade. Microturbinas têm o mesmo princípio de funcionamento, mas a potência do gerador está limitada a 250 KW.

Os motores a combustão interna também realizam a transformação de uma reação química em energia mecânica. Tal processo se dá por ciclos termodinâmicos que envolvem a expansão, compressão e alteração na temperatura dos gases. Esses motores podem ter ignição por centelha (ciclo Otto) ou por compressão (diesel) e os mais comuns utilizam dois e quatro tempos, ou seja, o ciclo termodinâmico se completando, respectivamente, a cada uma ou duas voltas do eixo.

As potencialidades do biogás como fonte de energia renovável em um país com uma enorme produção agropecuária são claramente gigantescas. Contudo, por suas diversas peculiaridades, há sempre dúvidas sobre o real potencial energético do biogás no Brasil. Este artigo busca contribuir nesse debate buscando ter um panorama das estimativas desse potencial. Para tanto, foi organizado, além desta introdução, em quatro seções. Na próxima, é elaborado um breve histórico do biogás e seu atual estágio no país. Na terceira seção, é realizada uma resenha sobre as principais estimativas da produção de biogás, com destaque para as estimativas agregadas da Associação Brasileira do Biogás (ABiogás).

Na quarta seção, são apresentadas as possibilidades de fomento pelo BNDES e algumas sugestões de políticas públicas. Por fim, são tecidos alguns comentários finais.

Autores: Artur Yabe Milanez, Guilherme Baptista da Silva Maia e Diego Duque Guimarães.

 

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