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Técnica brasileira pode transformar bagaço de cana em carvão ativo

Nanotecnologia

Transformado pela nanotecnologia, que manipula objetos na escala dos átomos, o bagaço que sobra da moagem da cana-de-açúcar pode dar origem ao carvão ativo, um dos principais componentes dos sistemas de purificação da água e do ar. O método, desenvolvido por brasileiros, também produz uma cobertura especial de partículas de prata no carvão ativo, com capacidade antimicrobiana (eliminando, por exemplo, bactérias nocivas da água).

“O trabalho surgiu a partir da demanda de uma usina de álcool, que tinha interesse em dar um destino mais adequado ao bagaço, de preferência produzindo algo com valor agregado”, explica o químico Mathias Strauss, do LNNano (Laboratório Nacional de Nanotecnologia), que fica em Campinas (SP).

Com efeito, das mais de 655 milhões de toneladas anuais da safra brasileira de cana, um terço corresponde ao bagaço da planta após a produção de álcool e açúcar. Já existem iniciativas para usar esse excedente de matéria orgânica como fonte de energia ou para a produção do chamado etanol de segunda geração (obtido a partir das partes quimicamente mais “duras” da planta), mas em escala relativamente modesta.

Por outro lado, o bagaço seria uma matéria-prima interessante para a obtenção do carvão ativo (ou ativado), material produzido fora do país, a partir de fontes como cascas de coco ou ossos.

Entenda como funciona o carvão ativado e o que a cana de açúcar tem a ver com isso

NOVIDADE

Pesquisadores brasileiros conseguiram elaborar um protótipo do que pode ser o novo destino para os 200 mil toneladas de bagaço de cana que sobram anualmente no país: virar carvão ativado

FABRICAÇÃO

O carvão ativado é feito a partir de carvão (proveniente, por exemplo da casca de coco e do bambu), depois de passar por processo químicos e por aquecimento a altas temperaturas

PRA QUE SERVE?

O carvão ativado é usado para eliminar poluentes no ar e na água, além de remover toxinas do organismo, tratar overdoses e até purificar bebidas alcoólicas

ESTRUTURA

Isso porque ele tem uma superfície de contato gigantesca, por causa das reentrâncias de sua superfície — uma colher de chá da substância tem uma área de contato equivalente à de um campo de futebol

FUNÇÃO

Isso permite que ele retenha poluentes, em especial moléculas orgânicas, com as quais possui afinidade química. Com um tratamento químico com prata, ele pode também se tornar bactericida

PENEIRA

Diferentes moléculas e e partículas, dependendo do tamanho, são capturadas por diferentes poros. Com o tempo de uso, o carvão ativado fica ‘cheio’ de poluentes e precisa ser trocado

MINÚSCULOS

Nas partes mais finas de suas reentrâncias, o carvão ativado tem de uma infinidade de pequenos poros, que podem ter meros nanômetros (bilionésimos de metro) de diâmetro

O primeiro passo para obter o carvão ativo é a queima incompleta da matéria-prima, seguida de um tratamento químico que produz no material queimado uma grande quantidade de minúsculas porosidades (no caso da pesquisa brasileira, da ordem de poucos nanômetros, ou bilionésimos de metro, de diâmetro).

Tais buraquinhos microscópicos no carvão ativo funcionam, grosso modo, como um sorvedouro, permitindo que partículas poluentes, em especial as moléculas orgânicas, sejam adsorvidas (ou seja, fixadas) na superfície do material, pelo qual possuem afinidade química. É óbvio que a capacidade de adsorção do material é limitada – após certo tempo, é preciso trocá-lo.

Coube aos pesquisadores brasileiros otimizar um coquetel adequado para produzir as porosidades no bagaço de cana queimado, com a quantidade e o tamanho desejados para um carvão ativo eficiente. O trabalho rendeu o depósito de uma patente, em parceria com a usina de cana.

“Do nosso ponto de vista, no estágio de bancada, é uma tecnologia praticamente pronta. É preciso agora o interesse empresarial para que ela ganhe uma escala maior”, diz Strauss. Enquanto isso não acontece, testes de campo da tecnologia já estão sendo feitos em território chinês, por meio de uma parceria organizada pelo Centro Brasil-China de Pesquisa e Inovação em Nanotecnologia.

Em túneis da rede viária da cidade de Xangai, o carvão ativo brasileiro está servindo para retirar parte dos poluentes que ficam parados no ar naquele espaço reduzido. Outras aplicações incluem o tratamento de esgoto e o de água para consumo humano.

A equipe do LNNano também descobriu como recobrir o carvão ativo com aglomerados de prata, que possuem atividade antimicrobiana. “Por ser uma tecnologia cara, é algo mais adequado para filtros domésticos ou aplicações médicas”, diz o especialista em nanobiotecnologia Diego Martinez, que também participa da pesquisa.

Nesse caso a produção industrial do carvão ativo “turbinado” não está tão próxima porque é preciso analisar melhor os efeitos dos aglomerados nanométricos de prata sobre o ambiente. De fato, estruturas na escala nanométrica têm propriedades químicas pouco usuais e às vezes potentes, o que demanda cautela.

Fonte: Folha de S. Paulo

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