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Estudo mostra que obras para provas olímpicas podem ter agravado concentração de metais pesados na Lagoa/RJ

Pesquisa da UFRJ fez testes com sedimentos depositados no fundo, que afetam microcrustáceos e ouriços-do-mar, base da cadeia alimentar

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Engenheira ambiental Mariana Vezzone, que participu da análise das amostras em 2015 e 2017 logo após a dragagem da Lagoa para as Olimpíadas. Foto: Custódio Coimbra/Agência O Globo

A água turva da Lagoa Rodrigo de Freitas esconde um perigo invisível aos olhos. Um estudo da UFRJ, que fez testes com sedimentos depositados no fundo, mostra que a quantidade de metais pesados aumentou, afetando microcrustáceos e ouriços-do-mar, base da cadeia alimentar. A pesquisa, publicada mês passado na revista acadêmica “Environmental Pollution”, comparou amostras coletadas antes e depois da Olimpíada e revela que os índices de cádmio, cobre e níquel cresceram depois dos Jogos.

A presença de zinco, chumbo e cromo também foi avaliada. Níquel e cromo são os únicos metais que não passaram do “nível 1”, estabelecido pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama) como limite para baixa probabilidade de efeitos adversos ao ecossistema. Os demais, porém, estão acima. Embora não tenham atingido o “nível 2”, que indica altos riscos ao ambiente marinho, os testes com microcrustáceos e ouriços-do-mar mostraram alta toxicidade, segunda a autora da pesquisa, a engenheira ambiental Mariana Vezzone, que coletou as amostras em 2015 e 2017.

— Os bioensaios sugerem que os sedimentos coletados em 2017 são extremamente tóxicos. O ambiente contaminado desestrutura o ecossistema, desde a base até chegar às pessoas. Em algum momento, (a contaminação) atinge o homem — observa Mariana. — O esgoto é a maior fonte de contaminação — afirma ela, que também coletou material dos rios no entorno da Lagoa.

Presença de zinco e cádmio

A concentração de cádmio despertou a atenção da especialista. Em 2015, o metal, que também é encontrado em pilhas e baterias, estava abaixo do nível de detecção do equipamento usado. Dois anos depois, a concentração média era de 1,6mg/kg, acima do valor de referência estabelecido, que é de 1,2mg/kg. O zinco — cuja concentração máxima, em que não se espera efeito nocivo à biota, é de 150mg/kg — passou de 178mg/kg em 2015 para 241mg/kg em 2017. As concentrações de cobre e de chumbo também estão entre os níveis 1 e 2.

— Não podemos nos esquecer da presença natural dos metais. O zinco, por exemplo, é essencial, mas numa concentração muito baixa. Em níveis altos, porém, é danoso. Já o chumbo é tóxico, e não precisamos dele em nenhuma concentração — explicou Mariana, que agora se dedica a um estudo dos peixes também coletados na Lagoa. Ela quer saber o impacto dessa poluição nas espécies.

A dragagem da Lagoa antes das provas olímpicas de remo e canoagem de velocidade pode ter afetado a qualidade da água, diz Mariana. Embora a diminuição de esgoto tenha sido observada com a intervenção, o trabalho pode ter provocado a suspensão dos metais. Na época, a prefeitura realizou a limpeza no trecho onde foram instaladas as raias. O objetivo da obra era garantir uma profundidade mínima de três metros, conforme exigência do Comitê Olímpico Internacional.

O oceanógrafo Denis Abessa, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), salienta que os contaminantes afetam a flora e a fauna marinha e podem contribuir para grandes mortandades, como a de dezembro passado, quando foram recolhidas 89 toneladas de peixes mortos na Lagoa.

— Historicamente, há episódios de mortandade massiva de peixes. Mesmo que exista um fenômeno natural, a suspeita nesses casos é das fontes poluidoras — disse Abessa.

Segundo a Secretaria municipal de Meio Ambiente, a contaminação na Lagoa “é originária principalmente das indústrias que existiam no Jardim Botânico no século XIX e na primeira metade do século XX, quando não havia legislação ambiental”. A pasta informou que uma avaliação após o desassoreamento da raia olímpica apontou dispersão potencial de metais na água, “mas sem que acarretasse mortandade de peixes à época”. A nota acrescenta que “a experiência acumulada permitirá um controle ambiental cada vez mais apurado em futuros desassoreamentos”.

Fonte: O Globo.

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