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Tubos de ferro dúctil aplicados em sistemas hidráulicos de alta pressão

As características mecânicas dos sistemas em FD – ferro dúctil são reconhecidas por suportarem elevadas material apresentou-se como uma solução diante das opções mais utilizadas. A PCH foi instalada próxima pressões dentre as aplicações no saneamento, indústria e mineração. O artigo mostra um caso real de aplicação em uma PCH – Pequena Central Hidrelétrica com elementos como encostas íngremes, trecho em túnel, desnível de aproximadamente 400 m e terreno rochoso.

O mercado brasileiro é ávido por novas tecnologias e soluções de engenharia. Este artigo apresenta um caso real de implantação de uma PCH – Pequena Central Hidrelétrica Itapocuzinho que utilizou tubulações em FD – ferro dúctil sob pressões internas elevadas. Tal a ao rio Itapocuzinho, na divisa entre Jaraguá do Sul e Joinville, SC, com potência de 11,7 MW. Esta PCH entrou em operação em 2019 e até a presente data não há qualquer registro de ocorrências ou de não conformidade referente aos produtos de ferro dúctil instalados.

O sistema hidráulico para condução da água utilizada na geração de energia começa em uma barragem com um canal para captação, por gravidade, no Rio Itapocuzinho, sendo pressurizado ao entrar em um túnel com 1000 m de extensão e 4 m de diâmetro. Ao final, conecta-se com uma extensão de tubulação FD de 1200 m até à casa de máquinas onde estão instaladas duas turbinas Pelton. A figura 1 ilustra o perfil do sistema adutor e a classe de espessura dos tubos em função da pressão.

 

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Tubulação

Para atender às exigências do projeto, foi especificada uma tubulação em ferro dúctil em classes de espessura K7, K9, K10 e K11. Devido à declividade da tubulação ao longo do perfil, bem como o aumento da pressão interna do tubo, foram determinados tipos de juntas capazes de trabalhar em condições mais severas tanto para o assentamento, enterrado ou aéreo, como para o trecho de pressão mais elevada. Os tipos de juntas recomendadas foram as JGS – Standard, JTE – Travada Externa, e JTE PN 25 – Travada Externa PN 25 (tabela I). A energia disponível ao final da linha pode ser calculada em função do desnível geométrico e da perda de carga, considerando aqui um índice de vazão de 3,814 m3 /s:

Edisponível = Desnível Geométrico (m) – Perda de Carga Total (m)

Edisponível = 362 – 6,65 = 355,35 mca

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A pressão de carga estática atinge o valor máximo de 362 mca. As pressões transientes foram calculadas considerando-se uma variação máxima de 15% sobre a pressão de serviço admissível quando ocorrer o fechamento da válvula para controlar a vazão de água para a turbina, elevando a pressão máxima de serviço para 416 mca. Com isso, permanecerá dentro dos limites estabelecidos para a PMS – pressão máxima de serviço (tabela I).

tabela1

Interferências a jusante do túnel 

Saída do túnel - Bloco de Ancoragem e o Flange de espera

 

A barreira natural existente no trecho após o desemboque no túnel apontou o assentamento aéreo da tubulação como a melhor opção técnica e econômica. No caso da escavação em rocha, o método foi descartado por ser mais oneroso e pelo local ser de difícil acesso, tanto para os equipamentos quanto para a movimentação dos tubos.

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Suporte de apoio e movimentação

O suporte de apoio foi dimensionado para permitir um ângulo de apoio do selim de 1200°, conforme recomendação do fabricante. Devido à rigidez diametral do tubo de FD, não é necessário um valor maior. Para evitar danos na superfície externa dos tubos provocados por atrito e/ou corrosão devido à diferença de potencial dos materiais envolvidos, foi utilizada uma manta de neoprene entre o tubo, o berço de apoio e a abraçadeira de fixação (figura 2)

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A NBR 12595:1992 – Assentamento de Tubulações de Ferro Fundido Dúctil para Condução de Água Sob Pressão – Procedimento define as larguras das bases de apoio conforme os diâmetros da tubulação (tabela II).

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Nesta obra, a singularidade no processo de montagem dos tubos ficou por conta da metodologia utilizada no deslocamento da tubulação a partir do ponto mais elevado. Dessa forma, ao contrário de tracionar o tubo para cima, optou-se por deixá-lo descer, utilizando seu próprio peso para o deslocamento.

Os tubos de ferro dúctil DN 1200 têm um comprimento útil de 7 m, fator preponderante para que a obra fosse realizada em um local com topografia tão acidentada. Em função dessa característica construtiva, foi possível movimentar as tubulações através de um caminhão poliguindaste, facilitando assim a transferência dos tubos do caminhão para o trolley e reduzindo custos com a locação de guindastes ou equipamentos de maior porte.

Anel com bidureza em elastômero para vedação

Para o trecho de pressão mais elevado, foi escolhido o tubo DN 1200, com classe de espessura K11, capaz de suportar uma pressão de teste de até 4,9 Mpa. Além disso, foi utilizada junta elástica do tipo JGS e anel de vedação com bidureza e alma em elastômero com dureza mais elevada que o produto padrão. O anel de vedação com dureza mais elevada em seu núcleo aumenta a rigidez e evita o deslocamento, permitindo à junta elástica trabalhar sob pressões mais elevadas sem qualquer risco quanto à estanqueidade e segurança do conjunto. Já o procedimento de montagem é o padrão, com cuidados básicos amplamente divulgados em sites, catálogos e manuais técnicos dos fabricantes.

Deflexão angular

O tipo de junta ponta/bolsa e anel de vedação das tubulações de ferro dúctil traz uma grande vantagem durante o assentamento dos tubos, pois possibilita fazer uma deflexão angular entre os tubos acompanhando a topografia do terreno e eliminando algumas curvas ao longo do traçado. Outra vantagem da deflexão angular e o afastamento em relação ao eixo de cada tubo é o excelente comportamento em caso de movimentação do solo, permitindo a acomodação da tubulação no terreno natural. A análise dos esforços gerados pelo peso total do tubo (próprio + massa líquida), em terreno com forte inclinação, foi objeto de atenção quanto ao empuxo hidráulico nas curvas verticais e o decorrente do fechamento da válvula gaveta instalada entre a saída do túnel e a curva de 22°30’ localizada no ponto 1.

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Nos trechos de forte inclinação foram utilizados tubos JTE – Junta Travada Externa, que permitem a deflexão angular do tubo, porém impedem o deslocamento axial da tubulação, assegurando a estabilidade do sistema em toda a sua extensão. Para isso, foram calculados os esforços máximos de tração gerados pelo próprio peso do tubo e o da massa líquida.

Resistência da junta travada

Para o dimensionamento da extensão do trecho com tubos JTE PN 25, levando-se em conta os esforços axiais, foi considerada a força máxima de 3,5 MPa atuando sobre um flange cego, que é a força provocada quando se a aplica a PTA – Pressão de Teste Admissível. O projeto demandou a construção de um bloco de ancoragem intermediário para distribuir os esforços, respeitando o limite de cada junta travada. Empuxo hidráulico nas curvas Para as curvas de 22°30’, e considerando a PTA em cada uma, foram obtidos os resultados mostrados na tabela III.

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Dilatação térmica do ferro dúctil 

As tubulações metálicas instaladas em trechos aéreos estão sujeitas a variações de temperatura e, consequentemente, submetidas à dilatação térmica que, em muitos casos, demanda a utilização de juntas de expansão para evitar deformações permanentes e/ou colapso dos materiais. Diferentemente de outros materiais metálicos, os tubos de ferro dúctil com junta tipo ponta/bolsa compensam e absorvem a pequena dilatação térmica gerada em cada tubo devido ao dimensionamento das juntas elásticas, diminuindo o custo de instalação.

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Resistência à corrosão e proteção catódica

A elevada resistência à corrosão, bem como a longa vida útil, são características reconhecidas e evidenciadas em muitos casos onde os tubos de FD estão em uso contínuo por mais de 100 anos. Sua proteção é formada por uma camada passivadora em zinco metálico (200 g/m2 ) aplicado por eletrofusão e pintura betuminosa (70 ㎛) ou epóxi (90 ㎛). A proteção catódica galvânica (zinco) elimina a necessidade de aterramento e proteção por corrente impressa, utilizada obrigatoriamente para proteger tubulações contra a corrosão, normalmente provocada pela diferença de potencial tubo/solo ou devido à presença de correntes parasitas. Outra característica é o isolamento elétrico a cada 6 ou 7 metros, conforme o DN, feito pelo anel de vedação em elastômetro presente em cada bolsa dos tubos. Com isso, a continuidade elétrica da corrente é barrada, motivo principal pelo qual não é recomendado utilizar proteção catódica para tubulações de ferro dúctil. Para trechos enterrados e casos específicos de aplicação deve-se fazer, antes da instalação, uma análise da resistividade elétrica do solo através do método de Wenner. A técnica verifica a presença de sulfatos, sulfetos e lençol freático. Caso seja verificada a necessidade de proteção adicional, é recomendada a utilização de uma manta de polietileno.

Conclusão 

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O conhecimento sobre as tecnologias e materiais disponíveis permite alcançar melhores resultados com soluções pouco exploradas, como é o caso do sistema FD para alta pressão na PCH Itapocuzinho. É possível avaliar a grande capacidade técnica dos projetistas na elaboração deste projeto e a expertise da empreiteira em aproveitar os recursos e as características da tubulação, contando com suporte técnico do fabricante. A possibilidade de usar recursos de menor custo, sem comprometer a qualidade do projeto e obra, evidencia que devemos estar atentos ao que o mercado oferece. O case utilizou tubo de FD DN 1200, K11, além de outras classes. Uma das ações mais importantes foi a especificação do anel de vedação com bidureza em elastômero, etapa que aumentou a segurança do empreendimento. O revestimento interno liso e o diâmetro interno útil maior que o DN permitem um excelente desempenho quanto à perda de carga, aproveitando ao máximo a energia disponível. A oferta de diversos tipos de juntas, de travamento interno ou externo, bem como classes de espessura dos tubos variadas, permite a execução de um projeto otimizado e mais econômico. Tubos, conexões, acessórios e válvulas fabricados em FD compõem um sistema completo, e não somente o fornecimento da tubulação. A facilidade para transpor terrenos íngremes, com grandes deflexões, só foi possível em decorrência da flexibilidade da junta elástica e do comprimento útil dos tubos.

Para finalizar, é importante ressaltar que o suporte de engenharia dedicado ao cliente, as visitas à obra, o acompanhamento da montagem e a disponibilização do software para cálculos foram fatores decisivos para garantir que todos os detalhes técnicos e construtivos fossem tratados com a relevância necessária.

Autores: Daniel Silas, Fernando Puell, Tiago Leite e Washington Cardoso, engenheiros do departamento técnico & qualidade da Saint-Gobain Canalização

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