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Saúde em piscinas / Água-qualidade química

[1] Heitor, A M.

RESUMO

A qualidade da água é a face visível da concepção e funcionamento de uma piscina. A análise química pode reflectir falhas nos processos operativos e alertar para a presença de substâncias indesejáveis susceptíveis de provocar efeitos nocivos na saúde, por ingestão, inalação ou contacto.

O trabalho que se apresenta diz respeito à avaliação físico-química efectuada em águas de piscina do Distrito do Porto nos anos 2003 e 2004.

Num total de 1698 amostras, constatou-se ser a desinfecção, o processo que revelou maior nº de deficiências.

INTRODUÇÃO

Uma piscina, durante a sua utilização pode ser contaminada por banhistas, por água de má qualidade, pelo ambiente ou por produtos químicos utilizados no tratamento. A contaminação química é a causa de intoxicações agudas por ingestão ou inalação de produtos utilizados no tratamento (riscos a curto prazo) ou intoxicações crónicas, associadas a irritações oculares, do sistema respiratório ou da pele (riscos a médio prazo).

Uma água de piscina deve ser desinfectada, desinfectante, transparente e agradável.

A qualidade química reflecte o modo de funcionamento do processo operativo

destinado à recolha da água, tratamento e retorno à bacia do realizado para clarificar a água e reter substâncias coloidais e da desinfecção cuja finalidade é eliminar riscos de contaminação e impedir o crescimento de algas. Também fornece indicações sobre outros elementos, sobretudo ligados à contaminação dos banhistas.

Com o objectivo de avaliar as variações da qualidade química da água, detectar deficiências dos processos e promover medidas correctivas, o Instituto Nacional de Saúde -Porto em colaboração com o Centro Regional de Saúde Pública – Norte implementou um programa de monitorização para piscinas públicas e privadas. Foram seleccionados para o efeito os indicadores: Turvação, pH, Cloro residual (total, livre e combinado), Cloretos, Condutividade e Oxidabilidade ou Carbono Orgânico Total e estabelecidos Valores Indicativos Limite, baseados na experiência adquirida, na legislação nacional relativa a águas destinadas ao consumo humano, na legislação internacional e nas orientações da OMS.

Turvação – parâmetro associado ao processo de filtração. A fraca turvação da água permite maior velocidade de filtração e aumenta a eficácia da desinfecção alguns parasitas não destruídos pela desinfecção, são eliminados pela filtração. A turvação diminui a transparência da água e facilita a disseminação de microrganismos. Valor Indicativo – 1- 4 Unidades Nefelométricas de Turvação.

pH – mede a acidez ou alcalinidade da água . O valor de pH < 6,9 acelera a corrosão dos materiais e provoca a irritação dos olhos e das mucosas. O valor de pH > 8 facilita a precipitação dos sais de cálcio, o bloqueio dos filtros, o aumento de turvação e exige um consumo elevado de desinfectante (super cloragem) pode provocar irritações na pele e mucosas. Valor Indicativo – 6,9-8,0.

Condutividade – indicador da mineralização da água. Valores elevados alertam para a sobrecarga de banhistas e envelhecimento da água. Valor Indicativo – 1500mS/cm a 20º

Cloretos – Associados a contaminação com origem nos banhistas, deficiências na renovação da massa de água provoca a corrosão dos equipamentos metálicos e são indicadores do envelhecimento da água. Valor Indicativo – 500mg /L .

Oxidabilidade (m.ácido) – Indicador de poluição por substancias oxidáveis ao permanganato. Valores elevados podem revelar deficiências no processo de desinfecção e aumento de matéria orgânica com origem nos banhistas (urina, suor, pele, cosméticos, etc.). Valor Indicativo – 5mg/L.

Cloro Residual – Oxidante com propriedades desinfectantes tem como finalidade a inactivação de organismos patogénicos ou indesejáveis, cuja sobrevivência depende do pH, temperatura, turvação, oxigénio e matéria orgânica, entre outros factores. A acção desinfectante não é instantânea, desenvolve-se de forma gradual ocorrendo etapas físicas, químicas e bioquímicas.

Cloro Residual Livre – Quantidade de cloro que permanece na água sob a forma de ácido hipocloroso e hipoclorito . Valor Indicativo – 1.5 mg /L (Cl2).

Cloro Residual Combinado – Fracção do cloro presente na água sob a forma de cloraminas e outros compostos orgânicos de cloro. A monocloramina e a dicloramina, têm algum poder desinfectante, contrariamente ao tricloreto de azoto. É a forma de cloramina mais volátil e irritante. Existe uma relação directa entre a presença deste composto e a ocorrência de irritações oculares, nasais, faríngeas e respiratórias. Responsável pelo cheiro característico a cloro nas piscinas cobertas. Valor Indicativo – 0.5 mg /L (Cl2).

Cloro Residual Total – Soma do cloro livre e do cloro combinado Valor Indicativo – 2,0 mg /L (Cl2).

Neste trabalho apresentam-se os resultados de 1384 amostras analisadas nos anos 2003 e 2004, no âmbito de programas de monitorização implementados em piscinas públicas e piscinas colectivas privadas localizadas nos catorze concelhos do Distrito do Porto

METODOLOGIA

Para o programa de monitorização, os requisitantes procederam à identificação e codificação de todos os pontos de colheita. A amostragem foi efectuada no período das 9h às 13h em dias úteis, seguindo os procedimentos preconizados para a colheita em profundidade destinada à análise bacteriológica. Na maioria dos casos, no local determinaram-se os parâmetros pH, temperatura e cloro residual. As amostras foram transportadas em malas térmicas para o Centro de Qualidade Hídrica do Porto e as análises efectuadas de imediato, de acordo com a metodologia seguinte:

Turvação – Nefelometria pH, condutividade e cloretos – Electrometria, Cloro residual – Colorimetria , Oxidabilidade – M. ácido a quente e Carbono Orgânico Total –Combustão e infravermelho.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Nº TOTAL de AMOSTRAS – 1698

pH %
£ 6,9 5,9
> 6,9 £ 8 84,7
> 8,0 9,4

 

Condutividade %
£ 500 65,9
>500 £ 1500 23,6
> 1500  7,8

 

Cloretos %
£ 250 88,6
> 250 £ 500  6,9
> 500  4,5

 

Oxidabilidade %
£ 5 94,6
£ 5  5,4

 

Cloro residual total   %
£ 2 73,7
>2 £ 5  23,9
> 5  2,4

 

Cloro residual livre %
£ 1,5 71,6
> 1,5  28,4

 

Turvação %
£ 1 97,3
> 1 £ 4  2,7

 

A observação dos resultados permite-nos constatar ser a desinfecção o processo que maior nº de falhas apresenta (26,5% das amostras apresentam valores elevados de cloro combinado). Associando este facto aos teores em cloretos > 250mg/L e condutividade > 500 mS/cm parece-nos encontrar uma relação entre estes três factores. Os valores de oxidabilidade > 5 mg/L coincidiram com níveis de cloro combinado, cloretos e condutividade superiores aos indicativos.

CONCLUSÕES E RECOMENDAÇÕES

No período em que decorreu o estudo apresentado, observou-se por parte de concessionários, operadores e técnicos de saúde uma atenção crescente aos indicadores de natureza físico química, como sinais de alerta dos processos operativos. Sempre que algum parâmetro revelou estar em não conformidade com os Valores Indicativos, foi imediatamente dado conhecimento aos requisitantes e as medidas correctivas verificadas laboratorialmente. Neste período foram analisadas bacteriologicamente 4043 amostras nas mesmas piscinas: 7,7% foram classificadas como impróprias pela presença de indicadores patogénicos (0,73% E.coli.0,80 % Enterococos, 1,52 % Coliformes Totais, 1,52 % Staph.coag.posit , 2,60% Pseudomonas) e 12,9% das amostras apresentaram valores superiores ao máximo recomendável (8,15% por germes aeróbios e 4,72 % pela presença de Staphylococos), o que revela as deficiências no processo de tratamento.

O cloro é o produto mais utilizado na desinfecção da água, mas nos últimos anos têm sido levantadas algumas questões devido à possibilidade de formação de compostos nocivos à saúde humana. Nas águas de piscina, além das substâncias orgânicas naturais, acresce a poluição humana. A amónia resultante da ureia reage rapidamente com o ácido hipocloroso dando cloro residual combinado, enquanto que os compostos orgânicos nitrogenados provenientes da urina e do suor reagem com o hipoclorito formando cloraminas orgânicas, possíveis percursores da formação de trihalometanos.

Em Saúde Pública é fundamental o papel reservado à prevenção e informação. O INSA-Porto, em colaboração com uma Autoridade de Saúde local e alguns responsáveis por piscinas públicas, tem em curso um trabalho com vista a estabelecer valores indicativos para trihalometanos e outros parâmetros, possíveis indicadores da formação daqueles compostos, nomeadamente o Carbono Orgânico Total (em substituição da oxidabilidade). Os dados disponíveis permitem reconhecer que a formação de trihalometanos em águas de piscina é uma realidade. O aparecimento de bromofórmio ou de clorofórmio depende da natureza da água e do tipo de tratamento. Verificou-se haver uma relação directa entre a presença daqueles compostos em concentrações elevadas (> a 100 µg / L ), valores de oxidabilidade ³ 5mg/L e de cloro combinado ³1,5mg/L. Num total de 310 amostras , constatou –se que 78,4% apresentou um valor inferior a 15 mg/L de C. Para além de novos parâmetros a determinar em programas de monitorização e a inclusão de valores de alerta para alguns parâmetros, como medida preventiva, o Centro de Qualidade Hídrica-Porto elaborou, para apoio aos utentes, um folheto informativo que aborda os temas – contaminação, monitorização e medidas de prevenção em piscinas.

AGRADECIMENTOS

Agradeço a todos os que directa ou indirectamente contribuíram para a realização deste trabalho nomeadamente à equipa do Centro de Qualidade Hídrica.

1 Centro de Qualidade Hídrica – Instituto Nacional de Saúde Dr. Ricardo Jorge – Porto

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