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Análise da viabilidade do reúso de água para recarga de aquíferos na região metropolitana de São Paulo/SP

Resumo

Eventos de escassez hídrica como o recente episódio vivenciado na Região Metropolitana de São Paulo – RMSP têm levado a população a adotar medidas para a redução do consumo e uso racional de água, apontando para a necessidade de buscar alternativas como o reúso de água, como fonte alternativa de água para diversos fins. Nesse sentido, esse trabalho apresenta uma avaliação da viabilidade do reúso da água produzida nas estações de tratamento de esgotos da RMSP para fins de recarga de aquíferos, a partir da adoção de requisitos mínimos de qualidade para essa aplicação, com base na experiência internacional. A partir do estudo realizado, observou-se o potencial da tecnologia de recarga de aquíferos com água de reúso, para contribuir com a resolução de problemas de estoque de água para épocas de seca, bem como para a reposição de volumes de aquíferos superexplotados. Pode-se concluir que o efluente tratado nas ETEs estudadas da RMSP, que realizam tratamento em nível secundário, não cumpre os requisitos mínimos de qualidade do efluente com finalidade de recarga de aquíferos, ressaltando que uma condição fundamental para a aplicação dessa prática não foi atendida, que é a remoção de nitrogênio. Somente o Aquapolo, que trata o efluente da ETE ABC, possui tecnologia suficiente para alcançar padrões exigidos para a recarga de aquíferos.

Introdução

As civilizações antigas, desde os tempos remotos, construíram suas formas de organização em torno das bacias hidrográficas e costas marítimas. A água era um elemento vital para todas as culturas e foi objeto de veneração e temor (PITERMAN e GRECO, 2005). Tomasoni et. al. (2009) afirmam que a água é componente essencial para a vida humana e para a dinâmica dos sistemas ambientais, determinando as características dos ecossistemas, do potencial humano e econômico a ser manejado sob as mais diversas condições ambientais de sua oferta, gerando, portanto, tensões e conflitos de interesses em todo o mundo.
A classificação adotada pela Organização das Nações Unidas define quatro níveis para a disponibilidade hídrica:

  • Abundante (acima de 20.000 m³/hab/ano); Correta (2.500 a 20.000 m³/hab/ano);
  • Pobre (1.500 a 2.500 m³/hab/ano);
  • Crítica (inferior a 1.500 m³/hab/ano).

O Brasil é considerado “abundante” em relação à classificação de disponibilidade hídrica, com 35.000 m³ de oferta de água por habitante por ano. Para o estado de São Paulo, o índice cai para 2.209 m³/hab/ano, sendo classificado como “pobre”. Este índice diminui ainda mais quando se considera a Bacia Hidrográfica do Alto Tietê, que concentra em torno de 20 milhões de habitantes: são 200 m³/hab/ano, sendo classificada como “crítica”.

Dos fatores que conduziram diversas regiões do mundo à situação crítica de abastecimento de água, incluem-se a limitação da oferta nas cercanias das populações, descuido com os mananciais, assoreamento dos rios devido ao desmatamento, práticas agrícolas inadequadas e crescimento desordenado das populações.
Além destes, há também as questões climáticas. Na Região Metropolitana de São Paulo, cujo território coincide 99% com a Bacia Hidrográfica do Alto Tietê, durante os anos de 2014 e 2015 ocorreu um período de estiagem que originou a denominada “crise hídrica”. Este extenso período, marcado pelos baixíssimos níveis de água nos reservatórios que abastecem a RMSP, fragilizou o sistema de abastecimento de água da região como um todo e agravou a baixa disponibilidade hídrica previamente relatada. Outra consequência foi o aumento da explotação das águas subterrâneas para abastecimento público.
Para enfrentar a escassez hídrica, diversos países recorrem a tecnologias de dessalinização, reúso de água, explotação de aquíferos, derretimento de geleiras, dentre outros, com objetivo de abastecer a população e suas atividades. O reúso de água, por exemplo, é amplamente utilizado em todo o mundo, mas no Brasil é pouco empregado e se mostra avançando lentamente, seja pela falta de incentivo, por questões culturais, pela falsa sensação de abundância de água, ou mesmo pela regulamentação recente.
A intenção do reúso da água é aumentar o suprimento deste recurso e gerenciar nutrientes no efluente tratado. Seus benefícios incluem a melhoria da produção agrícola, redução do consumo de energia associado à produção, tratamento e distribuição de água, e outros benefícios ambientais significativos, como a redução da carga de nutrientes nas águas receptoras devido à reutilização das águas residuais tratadas (USEPA, 2012).
Diante do cenário apresentado e dentre as tecnologias de reúso de água, a recarga artificial de aquíferos com efluente tratado se mostra interessante e pode ter seu espaço no Brasil. Segundo a USEPA (1999), a recarga de aquíferos com efluentes tratados apresenta diversas vantagens, pois possui capacidade de armazenamento para variações sazonais de oferta e demanda. Levando em conta a sazonalidade, esta técnica pode se encaixar na necessidade existente na RMSP para enfrentamento de eventos climáticos extremos, armazenando água quando há muita oferta e abastecendo a população quando a oferta convencional for baixa.
Hespanhol (2004) complementa afirmando que, quando esta técnica for adequadamente regulamentada e praticada no Brasil, trará benefícios e representará uma nova dimensão para a disposição de efluentes domésticos, pois além de contribuir para o aumento da disponibilidade de água, ainda se mostra eficiente na proteção de aquíferos costeiros contra salinização, controle de subsidência de solos e sustentação de níveis de aquíferos freáticos submetidos a condições inadequadas de demanda.

Autores: Wanderley da Silva Paganini; Marina Westrupp Alacon Rayis; e Miriam Moreira Bocchiglieri.

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