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Resíduos do agronegócio são testados na produção de alimentos e bioetanol 2G

Resíduos do agronegócio são testados na produção de alimentos e bioetanol 2G

O processo é focado nas características químicas de biomassas, pré-tratamento, microrganismos e otimização de parâmetros de processo para aumentar o rendimento de etanol para fermentação em escala de bancada

Uma equipe multi e transdisciplinar vem conduzindo pesquisas no Instituto de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro (IQ/UFRJ) para desenvolver alimentos mais seguros e bioetanol 2G (segunda geração), a partir de resíduos da agricultura e da flora nativa brasileira. O grupo publicou os potenciais desses resíduos. Coordena o grupo a pesquisadora Anna Paula Azevedo de Carvalho, em periódicos científicos. Selecionou-se um dos periódicos como destaque da capa frontal da revista norte-americana ACS Omega, da editora American Chemical Society. Apresenta-se a capa frontal em todas as edições da revista. É a primeira a ser exibida no site da publicação e é impressa junto com todas as solicitações de edição impressa.

O Brasil é um dos principais produtores mundiais de alimentos básicos e de bioetanol de 1ª geração, obtido, principalmente, a partir da cana-de-açúcar ou da fermentação do milho. Entretanto, essas duas culturas são importantes para a alimentação humana, sendo que utiliza-se o milho também para a produção de ração animal. A liderança brasileira na produção de bioetanol representa uma oportunidade estratégica em um cenário de crescente demanda global por energia limpa.

Bioetanol 2G

O bioetanol 2G é um combustível com as mesmas características e propriedades do etanol comum, porém, utiliza como fonte o bagaço da cana, um subproduto da agroindústria, e outros resíduos lignocelulósicos, como casca de arroz, sobra da extração do óleo de babaçu, bagaço de laranja, dentre outros resíduos da indústria de alimentos, a partir do biorrefinamento, buscando aumentar o rendimento do etanol. Desta forma, além de valorizar esses resíduos, seu uso diminui o descarte na natureza e a energia produzida é limpa, contribuindo para a redução das emissões de carbono. O processo é focado nas características químicas de biomassas, pré-tratamento, microrganismos e otimização de parâmetros de processo para aumentar o rendimento de etanol para fermentação em escala de bancada.

“Podemos utilizar qualquer resíduo lignocelulósico, desde que a gente consiga transformar/quebrar moléculas mais complexas, como o amido, em moléculas mais simples, como os açúcares fermentáveis. Fazemos isso com a ajuda de ácidos e enzimas, para que esses açúcares sejam depois fermentados por leveduras, gerando o álcool etílico (etanol)”, explica Anna Paula.

A hidrólise

Segundo a pesquisadora, o processo de hidrólise aumenta o rendimento dos açúcares proporcionando uma taxa de conversão energética que varia de 50% a 90%, dependendo do resíduo.

“É na hidrólise que está um dos nossos maiores desafios, que é o de remover a lignina durante esse caminho de acesso à celulose e hemicelulose. Nesta etapa, precisamos avaliar várias condições de processo e evitar a formação de compostos indesejáveis que inibem a fermentação (como furfural e HMF) e prejudicam o rendimento de etanol,” esclarece Anna Paula.

Buscando entender melhor como superar tais desafios, conduziram-se estudos preliminares e publicou-se nas revistas Fermentation e ACS Omega.

“O primeiro autor foi bolsista de pós-doutorado, orientado por mim, no âmbito do edital Jovem Pesquisador Fluminense Sem Vínculo, o doutor Douglas Jose Faria, que hoje conduz pesquisa em biocombustíveis no Senai Cimatec. O terceiro autor é o coordenador do Laboratório de Análises Avançadas em Biologia Molecular (LAABBM) e do Núcleo de Análise em Alimentos (NAL), anfitrião do BioNano na UFRJ, o professor Carlos Conte”, acrescenta Anna Paula, que também integra a equipe de pesquisa da Rede de Nanotecnologia da Faperj.

Extração de óleo de babaçu

Mas a equipe de Apoio à Pesquisa em Nanomateriais, Polímeros e Interação com Biosistemas (BioNano) no IQ/UFRJ não se dedica apenas ao estudo do bioetanol 2G após a extração bioquímica dos ativos. Outros artigos publicados esse ano descrevem o aproveitamento da biomassa resultante da extração de óleo de babaçu, cujo resíduo (casca e mesocarpo) representa 90% do total do coco. O estudo mostrou que o biorrefinamento desse resíduo proporcionou a obtenção de compostos bioativos que atuam como conservante natural para queijo minas frescal, permitindo reduzir em 50% o teor de sódio no alimento.

“Reduzir o sódio nos alimentos é um desafio, pois ele é essencial para equilibrar o sabor, a textura e a conservação dos produtos. No entanto, o consumo excessivo de sódio está associado a doenças graves, como hipertensão e problemas cardíacos. A Organização Mundial de Saúde (OMS) afirma que a redução da ingestão de sódio pode salvar milhões de vidas, sendo, portanto, relevante que a indústria alimentícia busque alternativas nesse sentido, sem comprometer as características sensoriais e a segurança dos alimentos,” explica Anna Paula.

Já os polifenóis extraídos do mesocarpo de babaçu pela equipe apresentaram capacidade antioxidante e ação antimicrobiana contra bactérias contaminantes de alimentos, e, portanto, podem ajudar nessa redução de sódio, como uma alternativa sustentável e mais saudável para conservação de alimentos, diz Anna Paula. Inicialmente, o grupo buscou entender os possíveis benefícios dos resíduos do babaçu, o que rendeu uma publicação na revista Food & Function, da Royal Society of Chemistry.

“Em uma primeira fase da pesquisa, buscamos extrair o máximo possível de compostos bioativos do resíduo do babaçu, através de um processo de extração mais limpo, sem uso de altas temperaturas e solventes tóxicos, tradicionalmente utilizados”, explica a pesquisadora.

“Usamos um método mais sustentável de extração com água e álcool (solventes ambientalmente amigáveis), auxiliado pela tecnologia de ultrassom (rápida e de baixo custo) para recuperar altos teores de compostos fenólicos e flavonoides”, detalha Anna Paula, acerca do estudo publicado na revista Food Applied Research.

Os extratos apresentaram alta capacidade antioxidante e atividade antimicrobiana contra as bactérias Escherichia coli e Salmonella spp.

“Posteriormente, em uma segunda fase, avaliamos a aplicação desse extrato na produção de queijo minas frescal com teor de sódio reduzido, observando a manutenção das características físicas, químicas e microbiológicas desse queijo durante o período de estocagem”, acrescenta a cientista, sobre o estudo publicado na revista Innovative Food Science & Emerging Technologies, pela pesquisadora de mestrado Rayssa Cruz Lima.

Os queijos

Ao longo do período de estocagem, os queijos produzidos com extrato de resíduo de babaçu apresentaram uma contagem de microrganismos ainda menor do que o queijo com alto teor de sódio, mostrando uma eficácia superior na segurança microbiológica do produto, em comparação ao cloreto de sódio. Segundo ela, utilizam-se também os aditivos antimicrobianos e antioxidantes junto a nanomateriais pelo grupo na tecnologia inovadora de “embalagens ativas”. Assim a embalagem, o conteúdo e o ambiente interagem para manter a qualidade do produto, ao mesmo tempo em que prolonga o prazo de validade e aumenta assim a segurança alimentar.

Além de Rayssa e de Douglas, compõe a equipe dois bolsistas de Iniciação Cientifica (IC) da Faperj. São eles a Mayara Regina da Silva Figueiredo e o Pedro Henrique Thimotheu Chaves. Ambos obtiveram bolsas de IC no âmbito do edital Jovem Pesquisador Fluminense Sem Vínculo. Também estudam a extração de metabólitos secundários (ácidos fenólicos, terpenos e alcaloides) de outros resíduos de babaçu, que poderão ser usados como antioxidantes pela indústria alimentícia e cosmética.

“Os resíduos lignocelulósicos também podem ser valorizados na nanocelulose, um supermaterial biodegradável e biocompatível que pode ser usado como veículo para drogas quimioterápicas e como material para embalagens ativas”, conforme mostrado no artigo publicado pelo grupo na revista International Journal of Pharmaceutics, acrescenta Anna Paula.

“Estamos comprometidos em estudar o enorme potencial desses resíduos para criar produtos sustentáveis e inovadores, que promovam a economia circular e contribuam para os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (ODS), especialmente em relação ao consumo e Produção Responsável (ODS12), Fome Zero e Agricultura Sustentável (ODS2),” ressalta Anna Paula.

Graduada em Química e em Tecnologia em Polímeros, mestre e doutora em Ciência e Tecnologia de Polímeros, Anna Paula atribui a viabilidade do seu grupo de pesquisa à iniciativa da Faperj de lançar o edital Jovem Pesquisador Fluminense Sem Vínculo. “Financiou-se inteiramente este grupo de pesquisa com auxílio e bolsas Faperj do edital E40-2021. Como coordenadora, consegui liderar a equipe com autonomia, independência e ser autora correspondente nas publicações”, enfatiza Anna Paula.

“Além do financiamento das pesquisas, o apoio da Faperj permitiu a minha dedicação integral, onde também pude contribuir com a formação de recursos humanos, a exemplo de alguns ex-membros da equipe que deram continuidade à pesquisa na pós-graduação ou na indústria. O pesquisador de Iniciação Científica Raphael Érthola, que hoje é mestrando em Engenharia de Materiais na Coppe/UFRJ; Rayssa Cruz Lima, membro do BioNano e coorientada de mestrado, que se prepara para realizar o doutorado sanduíche na Universidade de Oregon, nos Estados Unidos; e o orientando de pós-doutorado Douglas Faria, que foi contratado como pesquisador de Biocombustiveis no Senai Cimatec”, revela Anna Paula. Com informações da Faperj

Fonte: labnetwork


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