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Estabilidade térmica de vírus entéricos em águas de superfície

Resumo: A temperatura é considerada o fator que mais afeta a estabilidade viral no meio ambiente aquático, porém, outros fatores como a irradiação pela luz ultravioleta (U.V.), variações na salinidade e de pH e presença de outros micro-organismos podem também contribuir na diminuição da estabilidade viral. A presença e persistência viral no ambiente aquático deve ser monitorada para assegurar a qualidade da água, entretanto, em análises que envolvem uma grande quantidade de amostras, necessita-se a estocagem das amostras previamente às análises e muitas dúvidas existem em relação à estabilidade térmica dos patógenos virais em diferentes temperaturas de estocagem (22, 4, -20 e – 80 °C). O objetivo da presente tese de doutoramento foi avaliar a estabilidade térmica de diferentes vírus entéricos: adenovírus humano tipo 2 (HAdV2), norovírus murino (MNV-1) e rotavírus humano (RV) cepa vacinal RotaTeq em amostras de água de superfície. Os resultados são aqui apresentados em quatro capítulos: Capítulo I: Otimização das técnicas baseadas em cultura celular: ensaio de placa de lise (PL), citometria de fluxo (CF) e ICC-et-RT-qPCR (qPCR precedido por cultura celular, tratamento enzimático e transcrição reversa) para determinar o limite de detecção de HAdV2 em amostras de água da Lagoa do Peri. Foi possível verificar que a composição da água não interferiu na detecção HAdV2 infecciosos e que o método de PL apresentou maior limite de detecção em relação à CF e ao ICC-et-RTqPCR. As diferenças nos limites de detecção obtidos deveram-se à diferenças inerentes a cada metodologia sendo as três adotadas para avaliar a est abilidade térmica do HAdV2 realizada no Capítulo II. Capítulo II: Avaliação da estabilidade térmica do HAdV2 e MNV-1 semeados em amostras de água de superfície provenientes da Lagoa do Peri e estocadas a temperaturas de 22, 4, -20 e -80 °C. A infecciosidade do HAdV2 foi avaliada pelo período de 230 dias utilizando as técnicas citadas acima e para o MNV-1 pelo período de 180 dias utilizando PL e RT-qPCR. O HAdV2 independentemente da técnica utilizada demonstrou um perfil de decaimento em relação às temperaturas de: – 80<-20<4.

Introdução:  Nas últimas décadas, a avaliação da infecciosidade dos vírus no Meio ambiente tem sido pesquisada em diferentes estudos, como na avaliação da dose infecciosa mínima, estudos de persistência e resistência do vírus no ambiente, avaliação do nível de contaminação de águas e outras matrizes ambientais, em estudos para a avaliação da eficácia de inativação viral por diferentes tratamentos de águas e efluentes, sendo que a principal ferramenta disponível para esta avaliação é o cultivo celular (GASSILLOUD et al. 2003). A infecciosidade viral é caracterizada pela capacidade das partículas virais transportarem seu genoma de uma célula permissiva infectada para outra célula permissiva não infectada, liberando seu material genético no citoplasma ou núcleo celular para que a replicação ocorra com sucesso. O processo de replicação envolve diversos passos essenciais, como adsorção viral a receptores específicos na superfície celular, processos de sinalização celular, endocitose, penetração, desnudamento, síntese do ácido nucleico e proteínas, maturação e espalhamento para as células vizinhas não infectadas (HELENIUS 2007). Apesar de ser uma metodologia clássica, o uso do cultivo celular com o objetivo de verificar a infecciosidade dos vírus contaminantes de uma amostra ambiental apresenta certas desvantagens, como o fato de possuir custos mais elevados, requerer laboratórios mais equipados e, em alguns casos, não ser factível devido ao fato de alguns vírus contaminantes do ambiente aquático não serem adaptados ao cultivo celular in vitro (YEH et al. 2009). Como alternativa à detecção dos vírus em amostras ambientais utilizando cultura celular, técnicas moleculares como a Reação em Cadeia da Polimerase (PCR) e suas variações já estão bem estabelecidas e, quando comparadas com os métodos que utilizam somente a infecção in vitro, são de mais rápida execução, sendo comumente utilizadas na identificação e detecção de sequências gênicas específicas de diferentes tipos de contaminantes do meio ambiente (WATZINGER et al. 2006). Apesar de rápidas e sensíveis, as técnicas moleculares clássicas e dissociadas da cultura celular não fornecem resultados referentes à infecciosidade dos patógenos virais contaminantes das amostras sendo, desta forma, ferramentas que não podem predizer o risco de desenvolver uma doença associada àquela amostra contaminada (CHARLES et al. 2009)., Dentre os vírus humanos de transmissão fecal-oral e que podem contaminar o meio ambiente aquático destacam-se os adenovírus, poliovírus, norovírus, rotavírus e vírus da hepatite A. Esses são comumente excretados em altas concentrações nas fezes e/ou outras secreções de humanos infectados (na ordem de 108 a 1011 partículas virais por grama de fezes), sendo capazes de contaminar direta ou indiretamente águas destinadas ao consumo humano, águas do mar que recebem esgoto e moluscos bivalves cultivados em águas oceânicas impactadas por esgoto doméstico, sobrevivendo no ambiente com relativa estabilidade e ocasionando surtos de doenças em indivíduos susceptíveis (WYN-JONES, SELLWOOD 2001; ASHBOLT 2004; BOSCH et al. 2008; HAMZA et al. 2009). Atualmente, a pesquisa de vírus contaminantes de diferentes matrizes ambientais apresenta grande destaque no mundo e tem se destacado também no Brasil com grupos desenvolvendo projetos de pesquisa avaliando a presença de vírus em águas de consumo, residuais, lodos, água do mar bem como na carne de moluscos bivalves produzidos nestas águas (DE PAULA et al. 2007; MIAGOSTOVICH et al. 2008; RIGOTTO et al. 2010; SCHLINDWEIN et al. 2010; VECCHIA et al. 2015; XAVIER et al. 2015). Entretanto, poucos grupos de pesquisa tanto no Brasil quanto em outros países têm dedicado a devida atenção ao estudo da infecciosidade de vírus contaminantes do meio ambiente aquático. Crescem no Brasil e no mundo laboratórios especializados, tanto ligados a agências governamentais quanto privadas, que avaliam os tratamentos e proteção da água no que se refere à patógenos virais causadores de doenças. Esse tipo de abordagem também tem crescido nos ambientes acadêmicos e Institutos de Pesquisa, que têm se dedicado à análise da presença de vírus nos ambientes aquáticos. Muitas dúvidas têm surgido quanto a períodos de tempo e temperaturas de estocagem das amostras coletadas, sendo que é importante avaliar-se e chegar-se a um consenso das influências desses parâmetros nos resultados obtidos pelos laboratórios. Com base no acima descrito, o projeto desenvolvido e apresentado na presente tese de doutoramento, contribuiu para o desenvolvimento de metodologias de detecção e verificação da viabilidade e estabilidade térmica de patógenos virais entéricos em diferentes matrizes aquáticas, fornecendo subsídios para um melhor entendimento acerca do comportamento destes patógenos e contribuindo também na elaboração de futuras regulamentações acerca dos procedimentos em relação a estocagem e análise de amostras aquáticas o que refletirá em posteriores estudos de avaliação de riscos no desenvolvimento de doenças veiculadas pelo contato ou ingestão de água e alimentos contaminados por estes patógenos. O presente trabalho teve como hipótese o fato de que os vírus entéricos avaliados possuem graus distintos de estabilidade quando submetidos às mesmas condições de estocagem e temperatura.

Autora: Vanessa Moresco.

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