BIBLIOTECA

Avaliação da presença de resíduos de anti-inflamatórios não esteroides nos córregos veado e cedro do município de Presidente Prudente (SP), Brasil

Resumo: Estudos realizados em diferentes países apontam a crescente ocorrência de compostos anti inflamatórios não esteroides em águas naturais, principalmente em grandes centros urbanos cuja gestão ambiental dos resíduos e efluentes não acompanha de forma adequada o crescimento econômico e populacional. Isso, consequentemente, pode ocasionar ônus ambiental e de saúde pública devido à emissão de uma diversidade de compostos nocivos em seus corpos hídricos. Dessa forma, o presente trabalho avaliou a presença de naproxeno, paracetamol, diclofenaco e ibuprofeno ao longo dos córregos do Veado/Limoeiro e Cedro, em Presidente Prudente, São Paulo, tanto no período de chuvas quanto de estiagem. O diclofenaco e o ibuprofeno foram os compostos que apresentaram as maiores concentrações, 11 e 42 mg.L-1, respectivamente, indicando a contaminação por esgoto doméstico. Os maiores níveis de concentração foram observados nos períodos chuvosos, provavelmente devido à formação geológica do município ou a mecanismos de dessorção dos fármacos a partir dos sedimentos de rios.

Introdução: É inquestionável a importância dos fármacos na sociedade moderna, desde seu papel fundamental no combate às doenças até funções mais recentes como a de proporcionar o prolongamento da longevidade humana (UEDA et al., 2009). Nesse sentido, tais substâncias são desenvolvidas para serem persistentes e resistentes o bastante a fim de evitar que se tornem inativas antes do efeito desejado alcançando, assim, o seu propósito terapêutico (ALMEIDA & WEBER 2005). Dessa forma, após sua ingestão, cerca de 40 a 90% da dose administrada de medicamento é excretada na sua forma inalterada ou como um metabólito biologicamente ativo juntamente com urina e fezes no esgoto doméstico (ALVARENGA & NICOLETTI, 2010; VALCÁRCEL et al., 2011, AMÉRICO et al., 2013) que, posteriormente, é lançado, com ou sem tratamento adequado, nos recursos hídricos superficiais. Em razão do contínuo aporte desses compostos para o ambiente, já é possível verificar aumento da ocorrência de resíduos farmacológicos ou de seus metabólitos em recursos hídricos em diferentes países, tais como Romênia (MOLDOVAN, 2006), Coréia do Sul (KIM et al., 2009), Espanha (CAMACHO MUNOZ et al., 2010; VALCÁRCEL et al., 2011; LOPÉZ SERNA; PETROVIC; BARCELÓ, 2012) e França (VULLIET; CREN OLIVÉ; GRENIER LOUSTALOT, 2011). No Brasil, também é relatada a ocorrência de fármacos em águas superficiais (ALMEIDA & WEBER, 2005; AMÉRICO et al., 2009; MONTAGNER & JARDIM, 2011; MELO & BRITO, 2014; AMÉRICO et al., 2015; CAMPANHA et al., 2015; NUNES et al., 2015; TORRES et al., 2015), porém, a maioria dos estudos se concentram na determinação de compostos hormonais, como o 17α etinilestradiol, o que pode implicar na falta de informação, tanto qualitativa quanto quantitativa com relação à classe dos anti inflamatórios não esteroides (AINEs). Os AINEs constituem um grupo heterogêneo de fármacos, na maioria ácidos orgânicos, amplamente utilizados como analgésicos, anti inflamatórios e antipiréticos, cuja presença no ambiente é potencializada devido ao alto consumo desses medicamentos, às elevadas doses diárias administradas (100 a 4.000 mg.L¬1 ), ao alto percentual de excreção tanto do fármaco inalterado quanto de seus metabólitos (BECKER, 2012) e à eliminação incompleta nas estações de tratamento de esgoto (ETEs) (VALCÁRCEL et al., 2011). Assim como as demais classes de medicamentos, os AINEs também têm sido detectados no ambiente aquático com concentrações na faixa de ng.L¬1 a µg.L¬1 e, apesar dessas baixas concentrações, estudos demonstram que tais compostos são biologicamente ativos (FENT; WESTON; CAMINADA, 2006) e interagem com a biota do meio, interferindo significativamente na fisiologia, no metabolismo e no comportamento das espécies (BELISÁRIO et al., 2009), A principal forma de atuação desses compostos é a inibição, de forma não seletiva, das enzimas ciclooxigenases (COX) 1 e 2, bloqueando a conversão do ácido araquidônico em prostaglandinas (SILVA & SILVA, 2012) que são responsáveis por diferentes funções fisiológicas, como por exemplo reprodução, transporte de água e regulação osmótica, nas quais atuam como hormônios locais (ROWLEY et al., 2005). A presença e o destino de compostos farmacêuticos e seus metabólitos no ambiente aquático representam uma questão preocupante em todo o mundo. A avaliação do risco ambiental e humano dos fármacos, bem como a sua distribuição e acumulação nos diferentes compartimentos ambientais, são pontos ainda poucos esclarecidos e que demandam contínuos esforços para sua compreensão (GINEBREDA et al., 2010; DU et al., 2014; SCHAIDER et al., 2014). No entanto, devido à ampla variedade de compostos pertencentes à classe dos AINEs, realizar o monitoramento de todos pode ser uma tarefa economicamente inviável devido, principalmente, às baixas concentrações e às técnicas frequentemente utilizadas para sua detecção. Dessa forma, Sui et al. (2012), por meio dos parâmetros: quantidade de medicamento consumido, eficiência de remoção nas plantas de tratamento de esgoto e potenciais efeitos ecológicos, estabeleceram uma lista de fármacos prioritários a serem monitorados no ambiente aquático. Entre os medicamentos listados, o diclofenaco e o ibuprofeno foram classificados com alta prioridade de monitoramento; e o naproxeno com prioridade moderada devido, principalmente, aos efeitos ecológicos no meio.Do ponto de vista de regulamentação ambiental da União Europeia, o diclofenaco também se encontra entre os compostos com alta prioridade de monitoramento, juntamente com dois hormônios estrogênicos, 17α etinilestradiol e 17β estradiol (VIENO & SILLANPÄÄ, 2014). Haap, Triebskorn e Köhler (2008) verificaram efeitos tóxicos, agudos e crônicos do diclofenaco em culturas de Daph nia magna em intervalo de concentração de 1 a 80 mg.L¬1 , sendo a intensidade do efeito dependente da espécie testada, do tempo de exposição e do efeito analisado. Entre os efeitos apresentados na literatura tem se alterações ultraestruturais no fígado de trutas arco iris (TRIEBSKORN et al. 2007), alterações na capacidade de regulação osmótica em caranguejos Carcinus mae nas para concentrações no intervalo de 10 a 100 ng.L¬1 (EADES & WARING, 2010) e aumento da peroxidação lipídica em mexilhões zebra (Dreissena polymorpha) expostos a concentrações de 1 μg.L¬1 (QUINN et al., 2011). Feito, Valcárcel e Catalá (2012) verificaram a diminuição da peroxidação lipídica em embriões de peixes zebra (Danio rerio) quando expostos por 90 minutos a concentrações de 0,03 µg.L¬1 . Com relação ao ibuprofeno, Gravel e Vijayan (2007) verificaram, em trutas, a inibição de proteínas responsáveis por respostas de defesas em situações de estresse com concentrações semelhantes àquelas presentes no ambiente aquático (1 µg.L¬1 ). Parolini, Binelli e Provini (2011) não verificaram efeitos significativos na fragmentação do DNA em hemócitos de mexilhões zebra (Dreissena polymorpha) expostos por 96 horas a concentrações inferiores a 2 µg.L¬1 , porém, para concentrações entre 2 e 8 µg.L¬1 foram constatados danos celulares e genéticos. Moluscos da espécie Ruditapes philippinarum apresentaram diminuição no sistema imunológico, assim como incapacidade de lidar com o estresse oxidativo quando expostos por períodos de 1 a 7 dias e concentrações de 0,1 e 1000,0 µg.L¬1 de ibuprofeno (MILAN et al., 2013). Além do diclofenaco e do ibuprofeno, na literatura também são citados outros dois fármacos comumente presentes em águas superficiais, sendo eles o paracetamol (SANTOS et al., 2013; VULLIET; CREN OLIVÉ; GRENIER LOUSTALOT, 2011; LUQUE ESPINAR et al., 2015) e o naproxeno (SILVA et al., 2011; SHANMUGAM et al., 2014; HUANG et al., 2011; CARMONA; ANDREU; PICÓ, 2014). Ambos os fármacos também apresentaram efeitos tó¬ xicos descritos na literatura, como alterações genéticas (PAROLINI et al., 2009) e estresse oxidativo (ANTUNES et al., 2013; LUCERO et al., 2015). Dessa forma, levando se em consideração que a presença de AINEs em ambiente aquático pode ocasionar riscos ao ecossistema e também à saúde humana, algo pouco documentado no Brasil, o objetivo deste trabalho foi identificar a presença de resíduos de diclofenaco, ibuprofeno, naproxeno e paracetamol ao longo do percurso dos córregos do Veado/Limoeiro e Cedro do município de Presidente Prudente, São Paulo, e verificar a influência da pluviosidade sobre a concentração dos resíduos identificados, a fim de que os resultados obtidos forneçam informações científicas que possam ser utilizadas como ferramentas para orientar a tomada de decisões sobre a avaliação e o gerenciamento de riscos pelas instâncias pertinentes.

Autores: Ederson da Silva Stelato; Tamiris Garbiatti de Oliveira; Gabriele Marques Stunges; Emilaine Cristina Pelegrineli da Silva; Renata Medici Frayne Cuba; Alessandro Minillo e William Deodato Isique.

Leia o estudo completo: avaliacao-da-presenca-de-residuos-de-anti-inflamatorios-nao-esteroides-nos-corregos-veado-e-cedro-do-municipio-de-presidente-prudente-sp-brasil

ÚLTIMOS ARTIGOS: