Desenvolver tecnologias para o tratamento de água e efluentes que sejam mais eficientes que as atualmente implementadas.
Esse é o principal objetivo do projeto “Desenvolvimento de técnicas de tratamento de efluentes para fins de reuso”, vinculado ao Programa de Pós-Graduação em Engenharia Civil e Ambiental da Universidade de Passo Fundo (PPGEng/UPF). Coordenado pelo professor Dr. Jeferson S. Piccin em conjunto com os professores Vandré Brião e Marcelo Hemkemeier, o projeto é vinculado à linha de pesquisa em saneamento ambiental do PPGEng e conta com a participação de alunos de doutorado e de mestrado do Programa, de mestrado do Programa de Pós-Graduação em Ciência e Tecnologia de Alimentos (PPGCTA) e acadêmicos de graduação dos cursos de Engenharia Química, Ambiental e de Alimentos.
Desde 2013, o projeto se dedica a verificar se as técnicas chamadas de não convencionais de tratamento de água e efluentes são capazes de realizar o tratamento de tal forma que seja possível realizar o reuso dessa água, seja em residências, comércio ou indústrias, contribuindo assim com a redução da demanda hídrica. De acordo com Piccin, desde o início das pesquisas, o grupo já testou diferentes configurações de tratamento envolvendo processos eletrolíticos, processos oxidativos avançados, tratamento por membranas de ultra, micro, nano filtração ou osmose inversa, além do uso de carvão ativado para o polimento final. “Por exemplo, nós verificamos que o uso de processo eletro-Fenton seguido de adsorção em resinas de troca iônica é capaz de tratar efluentes de tingimento de pedras semipreciosas, que é um grande problema da indústria de pedras, gemas e joias da nossa região”, explica o professor.
Eletrocoagulação seguida de adsorção em carvão ativado
Em outra pesquisa, que está em fase final de publicação da Revista Desalination and Water Treatment, o grupo verificou que a aplicação de eletrocoagulação seguida de adsorção em carvão ativado é capaz de produzir água para reuso em diversas aplicações urbanas, industriais e agrícolas a partir de efluentes domésticos.
Esses processos, ainda segundo o coordenador, são tecnologias compactas se comparadas aos sistemas convencionais de tratamento, como por exemplo sistemas de lagoas.
“Os processos convencionais demandam bastante área, enquanto os processos que nós estamos estudando são compactos, menores. Com eles, um condomínio, por exemplo, pode instalar um processo desse e promover um reuso de água interno para lavar a calçada, para ornamentação, para irrigação, para bacias sanitárias”, ressalta.
Para o professor, a principal ideia é ter uma infraestrutura, principalmente urbana, mais inteligente quanto ao consumo de água.
“Hoje, a água que se usa para irrigar o jardim é a mesma que se usa para dar descarga na bacia sanitária e a mesma que se usa para consumo. Não há um aproveitamento hídrico inteligente, apesar de que condomínios mais novos já preveem captação de água da chuva, mas mesmo a água da chuva requer algum tipo de tratamento”, complementa.
Contaminantes emergentes
Atualmente, as pesquisas têm se voltado para a remoção dos chamados poluentes emergentes, como é o caso de fármacos (e seus metabólitos), agrotóxicos e cosméticos e produtos de higiene. Segundo Piccin, esses compostos normalmente são muito solúveis em água e, devido à sua baixa biodegradabilidade, podem não ser removidos em sistemas convencionais de tratamento de água e efluente. Além disso, para alguns, não se conhece os efeitos ao meio ambiente e aos seres vivos. “Nós estamos tentando desenvolver um material capaz de reter esses contaminantes presentes na água. Essa tecnologia é conhecida como adsorção”, destaca.
Como exemplo de pesquisa nessa área, está o trabalho da aluna de doutorado do PPGEng Thais Strieder Machado. Egressa do curso de Engenharia Ambiental e mestre pelo PPGEng da UPF, Thaís busca, com sua pesquisa, desenvolver materiais adsorventes a partir de quitosana e biossurfactantes para auxiliar na remoção de fármacos, especificamente amoxicilina e paracetamol.
“Esses contaminantes são extremamente consumidos mundialmente e apresentam-se em águas residuais, e, mesmo que essa presença se dê em pequenas escalas (por exemplo, nanométrica), podem causar danos à saúde humana e aos animais”, conta.
De acordo com Thaís, as tecnologias convencionais aplicadas no tratamento desses efluentes com traços de contaminantes emergentes apresentam pequenas remoções e, em alguns casos, nula. Por isso, surgiu a ideia de remover esses compostos a partir da técnica de adsorção.
“A técnica de adsorção ocorre através do efluente, passando por um material sólido adsorvente em que o contaminante se adere através de características físicas e/ou químicas, e trata-se de uma tecnologia avançada que apresenta resultados promissores para contaminantes em pequenas concentrações”, pontua.
A quitosana proveniente de um fungo e os biossurfactantes produzidos por uma bactéria são objeto de estudo devido às suas ligações químicas favoráveis para que ocorra a remoção dos contaminantes. Esses biocompostos apresentam baixa toxicidade e alta biodegradabilidade, favorecendo sua aplicação sob o ponto de vista ambiental. Aliado a isso, a pesquisa ainda adiciona materiais provenientes de sílica produzidos a partir da técnica sol-gel, que apresenta características físicas favoráveis para remoção de contaminantes em efluentes (por exemplo, elevada porosidade, resistência, não solubilidade em água, entre outras). Dessa forma, o estudo concentra-se em desenvolver materiais adsorventes promissores em características químicas e físicas em conjunto com os biocompostos de origem microbiana.
Etapas iniciais
Apesar de ainda estar em etapas iniciais, os resultados, conforme Thaís explica, são promissores e acredita-se chegar em materiais adsorventes inovadores em conjunto com o biossurfactante. “Os próximos passos dedicam-se a aprimorar os materiais e aplicá-los em condições favoráveis (pH, temperatura, massa de adsorvente, vazão do efluente, entre outros) para a remoção dos fármacos”, observa a aluna, ressaltando a importância da pesquisa.
“Atualmente, a maioria dos contaminantes emergentes não apresenta parâmetros limites nas legislações internacionais vigentes para o lançamento de efluentes ou em água potável, mas sabe-se que estão presentes no nosso cotidiano. A remoção de contaminantes emergentes no tratamento de efluentes é essencial para garantir a qualidade dos recursos hídricos receptores, assim como para a saúde pública e o ecossistema”, garante.
Fonte: Universidade de Passo Fundo.