BIBLIOTECA

Tratamento de água para abastecimento público utilizando pré-oxidação com ácido peracético e coagulação com sulfato de alumínio

Resumo

Tratamento de água para abastecimento público – O ácido peracético (APA) é muito utilizado como agente desinfetante e por ser um oxidante forte possui capacidade de inativar um amplo espectro de microrganismos patogênicos. Dessa forma, o objetivo deste trabalho foi a avaliação do ácido peracético como um agente pré-oxidante de um processo de coagulação com sulfato de alumínio ferroso (SAF) utilizando como amostra de estudo água para abastecimento público. A caracterização da água bruta e tratada foi realizada pelos parâmetros físico-químicos: turbidez, pH, cor real, E. coli e coliformes totais. Para as análises microbiológica foi utilizada a técnica da filtração em membranas com meio de cultura cromogênico seletivo e diferencial para coliformes. Os resultados demonstram que nas concentrações maiores do ácido peracético e do coagulante houve a diminuição do pH prejudicando o processo de coagulação/floculação. No parâmetro cor a remoção foi total em todas as dosagens avaliadas. A configuração que apresentou a maior eficiência na remoção da turbidez foi de 5 mg.L-1 de SAF + 1 mg.L-1 de APA, atingindo 87,4% na velocidade de sedimentação de 0,35 cm.min-1 e comparada a mesma dosagem de SAF sem adição de APA foi possível observar que a eficiência de remoção de turbidez foi menor (85,7%), demonstrando a contribuição do APA no processo. Nas análises microbiológicas pode-se notar que a concentração de APA 1 mg.L-1 foi suficiente para inativação total de E. coli e para inativação total de coliformes totais foi necessária a dosagem de 4 mg.L-1. Embora o processo de coagulação/floculação/sedimentação não tenha atingido turbidez inferior a 5 NTU como exigido pela portaria de potabilidade da água (Portaria nº 888/2021 MS), o processo proposto foi satisfatório, pois o processo convencional contemplaria a etapa subsequente de filtração responsável pela remoção de sólidos em suspensão remanescentes do processo sedimentação.

Introdução

Embora as formas de tratamento de água para abastecimento público sejam bem estabelecidas e cumpram com os padrões de qualidade exigidos, os estudos para melhorar as formas de tratamento existentes ou a criação de novos métodos de tratamento são de suma importância para o desenvolvimento do saneamento ambiental. Os aprimoramentos das técnicas de tratamento são relevantes para reduzir custos operacionais, criar métodos alternativos e sanar problemas recorrentes (ACHON, BARROSO, CORDEIRO, 2014).

O tratamento convencional, também conhecido como ciclo completo, é o mais utilizado no Brasil devido as variações sazonais das características da água bruta, este método, consiste nas etapas de mistura rápida, floculação, decantação ou flotação, filtração e desinfecção (LIBÂNIO et al., 2006).

A coagulação é um dos processos mais usados no tratamento de água para a remoção da matéria orgânica natural e da turbidez (LIU et al., 2011). A coagulação age principalmente nas partículas em suspensão almejando o aumento da taxa de agregação dos coloides (CUI et al., 2020). A coagulação é realizada por métodos de mistura rápida em que o coagulante é disperso na água de tratamento, nesta etapa é de suma importância que o pH seja monitorado, pois é um fator que interfere diretamente na formação de coágulos (LIBÂNIO, 2010; YU et al., 2020).

Na coagulação ocorre a desestabilização das cargas das partículas, que está relacionada com o pH, a alcalinidade da água bruta, a natureza das partículas coloidais, o tamanho das partículas e o tipo e a dosagem dos produtos químicos que são aplicados (MARONEZE et al., 2014). Tanto o pH quanto a dosagem do coagulante estão diretamente ligados, pois cada produto químico apresenta uma faixa ótima de pH e o simples aumento da dosagem não garante que vai ocorrer uma eficiência maior (YU et al., 2020).

O processo de coagulação para remoção de matéria orgânica com sais metálicos consiste em três principais aspectos: no primeiro, os íons metálicos com cargas positivas e os coloides orgânicos com cargas negativas são eletricamente neutralizados, desestabilizados e agregados, no segundo, os íons metálicos e as moléculas de matéria orgânica solúveis formam complexos insolúveis e precipitados, e no terceiro, a adsorção química e física de compostos orgânicos ocorre na superfície do alúmen (LIMA e ROLLEMBERG, 2020).

Os principais mecanismos que ocorrem na coagulação são: compressão da dupla camada, adsorção e neutralização de cargas, varredura, adsorção e formação de pontes. A compressão da dupla camada acontece quando se emprega coagulantes com íons de cargas contrárias, especialmente os íons de elevada carga positiva, estabelecendo uma estabilização eletrostática (DI BERNARDO, 1993).

O processo de adsorção e neutralização de cargas ocorre quando os cátions metálicos na forma de sais são colocados na água, acarretando na formação de espécies solúveis hidrolisadas. Então ocorre a adsorção destes compostos pelos coloides e em seguida a neutralização devido a diferença de cargas (DI BERNARDO, 1993). A varredura normalmente acontece quando há dosagens altas de sais de alumínio e ferro, que são frequentemente superiores do que a concentração de saturação dos respectivos hidróxidos, acarretando na formação de precipitados de ferro ou de alumínio (DI BERNARDO, 1993).

No processo de Adsorção e formação de pontes acontece quando são colocados polímeros sendo eles sintéticos ou naturais, de amplas cadeias moleculares servindo de ponte entre a superfície no qual estão aderidos e outras partículas. Vale ressaltar que a coagulação pode ocorrer como resultado individual ou combinado desses mecanismos (DI BERNARDO, 1993).

A função do coagulante é desestabilização da suspensão coloidal diminuindo todas as forças atrativas, desse modo reduzindo a barreira de energia e permitindo que as partículas possam se agregarem (SANTOS et al., 2007). Normalmente, os coagulantes são divididos em dois grupos principais, os polieletrólitos e os coagulantes metálicos. No caso dos polieletrólitos as cadeias poliméricas já estão formadas quando são adicionadas na água. No entanto, nos coagulantes metálicos quando são adicionados na água passam por um processo de hidrólise e os íons de cargas positivas são liberados no meio (LIMA e ROLLEMBERG, 2020).

Os principais coagulantes disponíveis no mercado para o tratamento de água são: sulfato de alumínio, cloreto férrico, hidroxicloreto de alumínio e sulfato férrico (MACEDO, 2007). No Brasil, um dos coagulantes mais usados é o sulfato de alumínio ((Al2(SO4)3). Ele é adicionado a água com o óxido de cálcio (CaO), que é mais conhecido como cal virgem é usado para o controle do pH do meio. O sulfato de alumínio é um sal que é obtido pela reação entre o ácido sulfúrico e o hidróxido de alumínio, é solúvel em água (LUTTRELL, 2015).

Logo após a coagulação da água, ocorre o processo de floculação que se inicia com a mistura lenta, com o objetivo de que as partículas menores se juntem para formar agregados maiores ou flocos (LIMA; ROLLEMBERG, 2020). De acordo com Libânio (2005) no processo de floculação existem três mecanismos que são resultados das colisões entre as partículas, são elas a floculação pericinética, floculação ortocinética e a floculação por sedimentação diferencial.

A floculação pericinética ocorre por causa da energia térmica do fluido, que ocasiona o movimento Browniano das partículas coloidais menores que 1 µm. Na floculação ortocinética é necessária a introdução de energia externa que promove a união das partículas desestabilizadas e dos microflocos. A floculação por sedimentação tem como diferencial a não uniformidade e densidade dos flocos formados, o que acaba ocasionando diferentes velocidades de sedimentação e acarretando no choque entre os flocos e um maior crescimento destes.

A sedimentação é um processo de separação sólido-liquido usada para a retirada de partículas discretas e floculentas, como por exemplo sólidos suspensos, compostos orgânicos e partículas coloidais (WANG et al., 2011; HUA et al., 2016). Alguns sistemas de tratamento podem apresentar a pré-oxidação como um etapa preliminar de tratamento, de acordo com Veneu e colaboradores (2015), o pré-tratamento com agentes de oxidação como o ozônio, cloro, permanganato de potássio podem melhorar o processo de coagulação.

A pré-oxidação tem como objetivo a remoção de algas e cor, melhorar a eficiência da coagulação, oxidar a matéria orgânica para impedir a formação de biofilmes nos filtros, evitar incrustações em membranas, remover metais específicos ou a finalidade de desinfecção (MATILAINEN; VEPSALAINEN; SILLANPAA; 2010). O cloro é a principal agente químico usado na pré-oxidação, por causa do seu fácil manuseio, o seu alto potencial oxidante e também pelo seu baixo custo. O uso de reagentes clorados como o dióxido de cloro (ClO2), hipoclorito de sódio (NaClO), hipoclorito de cálcio [Ca(ClO)2] e cloro (Cl2) na etapa de pré-oxidação traz alguns benefícios, tais como, a redução do odor e do sabor da água, a remoção do ferro, manganês e também a remoção de cor (ROSALÉM et al., 2013).

No entanto, a utilização de oxidantes clorados pode gerar subprodutos tóxicos como os trihalometanos, que apresentam potencial carcinogênico (MEYER, 1994). Devido a isso, os estudos para a substituição do cloro por oxidantes alternativos são relevantes, sendo o ácido peracético um promissor substituinte (KITIS, 2004) O APA é um ótimo sanitizante devido a sua capacidade oxidante de componentes celulares dos microrganismos, tendo uma rápida ação à baixas concentrações sobre um amplo espectro de microrganismos. É esporicida em baixas temperaturas e continua efetivo na presença de material orgânico sendo, portanto, um biocida efetivo. Sua ação biocida é influenciada pela concentração, temperatura e tipo de microrganismos (SREBERNICH, 2007).

O APA também é usado no tratamento de águas residuárias como um agente desinfetante (WAGNER et al., 2002), é comercializado na forma de uma mistura aquosa quaternária equilibrada, contendo ácido peracético, ácido acético, peróxido de hidrogênio e água (GEHR et al., 2003). Fonseca e colaboradores (2020), realizaram estudos utilizando o APA para a préoxidação de água de abastecimento público para remoção de clorofila e observou eficiência satisfatória na concentração de 4 mg.L -1 , demonstrando que o oxidante tem grande potencial para estudos de pré-oxidação seguidos de coagulação.

Dessa forma, o presente trabalho sobre o tratamento de água para abastecimento público, teve como objetivo avaliar a utilização do ácido peracético, na pré-oxidação da água bruta, como tratamento preliminar ao tratamento convencional, utilizando o sulfato de alumínio ferroso como coagulante.

Autor: Keila Cardoso Teixeira, Thayrine Dias Carlos, Renato Almeida Sarmento2, Nelson Luis Gonçalves Dias de Souza, Douglas Henrique Pereira e Grasiele Soares Cavallini.

Tratamento de água para abastecimento público


LEIA TAMBÉM: DESAFIOS DA GESTÃO INTEGRADA DE RECURSOS HÍDRICOS NO BRASIL E EUROPA

ÚLTIMOS ARTIGOS: