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Avaliação de tecnologias de tratamento para reúso de efluente na indústria de biodiesel

Resumo

Em uma das etapas de produção do biodiesel ocorre a sua purificação, responsável pela maior geração de efluente do processo. Este efluente, denominado água de lavagem do biodiesel, contém uma série de impurezas, e não pode ser descartado no corpo hídrico sem o devido tratamento. Este efluente é encaminhado a um tratamento preliminar para remoção de óleos e graxas e material coloidal, e em seguida é necessário um tratamento secundário (processos biológicos) para remoção de matéria orgânica biodegradável. No presente trabalho, procurou-se avaliar técnicas de tratamento terciário (polimento) deste efluente após tratamento físico-químico e biológico anaeróbio com o objetivo de gerar um efluente que atenda aos padrões de reúso Classe 1. Tal efluente poderá ser utilizado, por exemplo, na lavagem de carros e em outras situações de contato direto com o usuário ou ser descartado com menor impacto ambiental ao corpo receptor. Como polimento foram avaliados o processo biológico aeróbio seguido de filtração em areia e troca iônica. No tratamento biológico aeróbio foi utilizado um biorreator de bancada operado em bateladas sequenciais de 24 h. Foram avaliadas diferentes concentrações iniciais de matéria orgânica na alimentação, medida como demanda química de oxigênio (DQO de 500, 1000, 2000 e 3000 mg/L), simulando diferentes situações de operação do tratamento anaeróbio anterior, com manutenção do pH na faixa de 6,5 a 7,0 e suplementação com nitrogênio (ureia) e fósforo (KH2PO4) para uma relação ideal DQO:N:P de 100:5:1. A biodegradabilidade aeróbia foi avaliada em termos de redução de DQO, atingindo-se valores na faixa de 90%. O tratamento do efluente do processo biológico aeróbio por filtração em areia e troca iônica resultou, à exceção do pH, no enquadramento do efluente ao padrão de reúso Classe 1 da norma ABNT NBR-13.969.

Introdução

A sustentabilidade é um conceito de aplicação crescente pelo qual se buscam soluções que equilibrem os aspectos econômico, social e ambiental. A água é imprescindível como recurso natural renovável e a possibilidade de escassez de recursos hídricos, bem como o aumento da demanda, evidenciam a necessidade de um sistema eficiente de gestão deste recurso, principalmente nas indústrias de grande porte. No setor energético, o biodiesel tem papel de destaque entre os biocombustíveis da matriz energética brasileira devido ao aumento de sua demanda com a obrigatoriedade de mistura com o diesel (7% desde 2014). Em 2005, a Lei n° 11.097 introduziu o biodiesel na matriz energética brasileira, determinando a mistura do biodiesel puro (B100) a todo diesel de petróleo comercializado no país para utilização em transportes (ANP, 2016). De acordo com a Associação dos Produtores de Biodiesel do Brasil (APROBIO), de 2004 até o final de 2014, o Brasil produziu cerca de 17,4 bilhões de litros de biodiesel e a mistura óleo diesel-biodiesel (BX) reduziu a necessidade de importação do diesel.

O biodiesel é produzido por meio de uma reação de transesterificação de triglicerídeos na presença de um álcool e um catalisador, convertendo os triglicerídeos em ésteres metílicos (biodiesel) e subprodutos (glicerol). Após a transesterificação, o processo continua com a separação dos ésteres metílicos e glicerol por decantação ou centrifugação e o biodiesel produzido é encaminhado para a etapa de purificação, também denominada lavagem. Esta etapa de lavagem aquosa é a maior fonte de geração de efluentes do processo de produção do biodiesel, pois é realizada repetidas vezes. Esta etapa é importante para a remoção de contaminantes e impurezas como o catalisador remanescente, sabões, sais, álcool residual e glicerina livre, e necessária para a garantia das especificações do biocombustível (ATADASHI et al., 2011; NGAMLERDPOKIN et al., 2011). De forma geral, utilizando-se métodos tradicionais de lavagem, são gerados até 3 litros de água de lavagem para cada litro de biodiesel produzido que, em função de suas características físico-químicas, não estão adequados para lançamento nos corpos hídricos. Desta forma, é necessário um tratamento adequado para este efluente (DE BONI et al., 2007).

O controle da poluição gerada pelos efluentes líquidos industriais deve ser realizado inicialmente pela redução de perdas nos processos e do consumo de água, incluindo as lavagens. Após a otimização do processo industrial de forma geral, a poluição hídrica deve ser controlada utilizando-se um sistema eficiente de tratamento de efluentes líquidos e averiguando-se as possibilidades de reúso (GIORDANO, 2004; TELLES & COSTA, 2010). O reúso pode ser considerado uma ação de redução do consumo, pertencente ao conjunto de atitudes que resultam em um uso racional da água e que não oferece prejuízo ao desenvolvimento das atividades produtivas (TELLES & COSTA, 2010).

A primeira regulamentação que trata de reúso de água no Brasil é a norma técnica NBR-13.696, de setembro de 1997. Na norma, o reúso é abordado como uma opção à destinação de esgotos de origem essencialmente doméstica ou com características similares. A norma NBR-13.969/97 é recomendada para reúso de efluentes para fins que exigem qualidade de água não potável, mas sanitariamente segura, tais como irrigação dos jardins, lavagem dos pisos e dos veículos automotivos, na descarga de vasos sanitários, etc. (ABNT, 1997). Adotou-se esta norma como referência para os parâmetros de qualidade do efluente a ser tratado devido à ausência de legislação específica para reúso de efluentes industriais. Nesta norma são definidas classes para reúso, sendo o objetivo principal, no presente estudo, atingir os parâmetros adequados para a classe 1, a mais restritiva, com possibilidade de utilização da água de reúso para lavagem de carros e outros usos que requerem o contato direto do usuário, com possível aspiração de aerossóis pelo operador, incluindo chafarizes.

O objetivo geral do estudo foi avaliar a possibilidade de reúso industrial do efluente da produção de biodiesel, após etapas de polimento, de acordo com parâmetros da norma ABNT NBR-13.969 e o enquadramento do efluente tratado aos parâmetros de descarte da Resolução CONAMA nº 430/2011, com o intuito de reduzir a demanda de água potável e o volume de efluentes descartados pela usina de biodiesel, promovendo benefícios econômicos e ambientais.

Autores: Luana Ferreira Afonso; Lidia Yokoyama e Magali Christe Cammarota.

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