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Nova tecnologia com função mista para secagem e compostagem de lodo de tratamento de esgoto e atendimento aos parâmetros legais de disposição agrícola

Resumo

Tradicionalmente, a compostagem de lodos de esgoto realiza-se em condições determinadas empiricamente e em processo devidamente controlado e com acréscimo de material estruturante. O presente trabalho apresenta uma quebra de paradigma para a relação C/N requerida na compostagem tradicional em lodos de esgoto, a partir de vários experimentos e melhorias incrementais em processo que utiliza basicamente o lodo de esgoto, e manipula outras variáveis de processo. A partir de estudos realizados ao longo de mais de 12 meses por equipes da SABESP e da UNESP, foi possível estabelecer um protocolo de operação que atingiu níveis de higienização similares ao da compostagem tradicional. Os resultados apresentados resultaram em um produto com características de fertilizante à base de lodo de esgoto devidamente estabilizado, com eliminação de patógenos dentro de um pleno atendimento às exigências do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) e da Resolução CONAMA 375/06, Classe Neste artigo são apresentados os testes realizados, detalhes dos procedimentos e os laudos das amostras analisadas pelo Instituto Agronômico de Campinas (IAC).

Introdução

A compostagem é praticada desde a História antiga (desde a Grécia antiga). Porém, até recentemente, de forma empírica (PROSAB, 2001). Atualmente a compostagem ganhou grande importância, pois extrapolou a fronteira agrícola e surge como alternativa no gerenciamento dos resíduos das cidades. Essa tecnologia ganhou força com as dificuldades para se encontrar novas áreas para implantação de aterros sanitários considerados cada vez mais escassos e caros. Como consequência isto eleva os custos para disposição dos resíduos urbanos em locais próprios e afastados do setor urbano (RODRIGUES et al., 2006).

De acordo com PROSAB (2001) a compostagem é um método controlado de decomposição biológica dos componentes orgânicos do lodo em determinadas condições e cujo produto final pode ser manipulado, estocado e/ou aplicado ao solo sem afetar de forma adversa o meio ambiente. A compostagem é, por definição, uma conversão biológica da matéria orgânica putrescível para uma forma mais estabilizada, com a concomitante destruição de patógenos a partir do calor gerado durante o processo biológico. Porém, esse processo não implica necessariamente na esterilização do produto final, mas numa seleção dos microrganismos presentes ao final de um determinado período. Também ocorre durante esse processo a diminuição da massa de água e de sólidos voláteis. No processo de compostagem tradicional, adiciona-se um material nomeado “agente estruturante” ou “material estruturante”. Ele tem como função dupla a estruturação do lodo a partir de sua mistura e também a adição de carbono para ajustar um balanço de energia e a relação carbono/nitrogênio (C/N) Krogmann (2001, apud MIKI e CHIZZOLINI, 2008). Já Pereira Neto (1987, apud Oliveira et al (2008) define que a compostagem é um processo aeróbio controlado, a partir da ocorrência de uma população diversificada de microrganismos, em duas fases que são (a) a de reações bioquímicas mais intensas e predominantemente termofílicas; e (b) a de maturação, com estabilização do material. Ocorre também o processo anaeróbio, que é mais comum em situações aonde a aeração é deficiente, e tem características de controle distintas, as quais exporemos mais a frente, com mais detalhes. Oliveira et al (2008) destacam que a aeração é prejudicada em pilhas muito úmidas. Na compostagem tradicional considera-se que a aeração ocorre nos períodos de revolvimento das pilhas, a qual usualmente no caso do Brasil é realizada com tratores adaptados ou uso de retroescavadeiras. Outro mecanismo com maior eficiência é a insuflação ou aspiração do ar contido nos vazios da massa. Outro fator importante é a periodicidade de revolvimento. Miki e Chizzolini (2008) menciona pelo menos 5 revolvimentos em um período de até 28 dias, seguindo orientação de Metcalf and Eddy (2003, apud MIKI e CHIZZOLINI, 2008). Já Oliveira et al (2008) recomenda 3 revolvimentos, sendo uma a cada duas ou três semanas.

A medida que a matéria orgânica dessa mistura de lodo mais o material estruturante é decomposto, registramse temperaturas na faixa de pausterização, entre 50 e 70 °C. São essas temperaturas que irão destruir os organismos patógenos eventualmente presentes no lodo de esgoto. A inter-relação entre as populações microbiológicas que fazem parte desse processo não são totalmente compreendidas, estando presentes conforme a literatura, bactérias, actinomicetos e fungos. Não obstante isso se atribui às bactérias as responsabilidades de maior decomposição das proteínas, lipídios e gorduras, por conta das temperaturas termofílicas, assim como a maior parte do calor gerado. Já os fungos e actinomicetos estariam relacionados com a fase mesofílica (abaixo de 40 °C), ficando estes com a decomposição de compostos orgânicos complexos e a celulose na forma de agente estruturante. Além das fases mesofílica e termofílica ocorrem ainda a de maturação do produto final, que resultará em um material estabilizado (MIKI e CHIZZOLINI, 2008).

PROSAB (2001) resume quais são os fatores mais importantes para a compostagem: aeração, presença de nutrientes e umidade. O carbono seria a principal fonte de energia, e o nitrogênio requerido para a síntese celular. Porém, outras substâncias presentes exclusivamente no lodo, e não necessariamente no material estruturante, são essenciais, tais como o fósforo, o enxofre, e micro nutrientes como Cu, Ni, Mo, Fe, Mg, Zn e Na, utilizados nas reações enzimáticas. Porém os detalhes deste processo são pouco conhecidos.

O processo é caracterizado pelo forte crescimento dos microrganismos mesófilos nos primeiros dias, com gradativa elevação da temperatura. A seguir, os termófilos se proliferam com maior intensidade, aumentando a temperatura, e destruindo os microrganismos patogênicos. Esse processo ocorre até o consumo máximo da matéria orgânica, e então a temperatura diminui, mantendo-se a população mesófila. Os odores são quase inexistentes nessa fase. Ocorre durante toda essa fase, alto consumo de oxigênio. A maturação se dá na fase seguinte, com temperatura ambiente e polimerização de moléculas orgânicas estáveis, no processo chamado de humificação (PROSAB, 2001).

Essa breve introdução buscou identificar as principais características do processo de compostagem, assim como as variáveis que interferem diretamente nas reações bioquímicas. A identificação das variáveis permite então adentrar no tema deste projeto. A identificação dos pontos críticos de um processo torna possível a manipulação através de instrumentalização, para fins de otimização. A manipulação de processos químicos, físicos e biológicos pelo homem através de sua instrumentalização permite obter resultados mais rápidos e mais eficientes. Trata-se, portanto, de um desenvolvimento operacional, aonde inovações são propostas e testadas para que processos ocorram de forma diferente, com maior economia e maior eficiência. A proposta de aperfeiçoamento do processo de compostagem tem como objetivo principal encontrar alternativas mais eficientes de obtenção de um produto utilizável no solo e na agricultura, que hoje representa um grave problema para o meio ambiente. Segundo Nuvolari e Costa (2010), a disposição final dos resíduos oriundos dos sistemas de tratamento de água e esgoto constitui uma problemática de abrangência mundial. As estações de tratamento de águas residuárias geram um resíduo sólido denominado genericamente de lodo de esgoto (SANEPAR, 1997).

Enfim, o presente trabalho tem por objetivo apresentar uma inovação tecnológica realizada em equipamento desenvolvido inicialmente para a secagem de lodo gerado em estação de tratamento de esgotos (ETE). Após melhorias operacionais e a elaboração de um protocolo operacional específico o equipamento tornou-se apto para a função de redução de agentes patogênicos e atratividade de vetores por compostagem natural apenas com lodo de ETE, sem adição de material estruturante orgânico (cascas de árvore, por ex.). São apresentados os incrementos tecnológicos realizados em conjunto com especialistas da UNESP e os resultados de qualidade para avaliação de atendimento as exigências de registro do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) e a Resolução CONAMA 375/06 para os microrganismos patogênicos.

Autores: Ana Lúcia Silva; Cesar de Lima Lourenço; Roberto Lyra Villas Boas; Maurício Tápia e Caroline de Moura DAndréa Mateus


 

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