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Contaminantes naturais da água, uma ameaça silenciosa

A exploração excessiva de aquíferos está agravando os problemas de contaminação natural da água em muitas áreas sujeitas ao estresse hídrico

Níveis de flúor, arsênico e outros compostos químicos prejudiciais à saúde afetam milhões de pessoas em todo o mundo e causam graves problema de saúde. É o que mostra o curta-metragem mexicano “Necessidade que mata”, finalista do We Art Water Film Festival 3 (assista no final do artigo).

Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), existem mais de 400 milhões de pessoas no mundo afetadas pela contaminação por flúor (fluoreto) na água e mais de 140 milhões sofrem as consequências do arsênico em cerca de 70 países. São dois tipos de contaminação natural da água que ocorrem principalmente nos aquíferos quando a água, no seu fluxo subterrâneo, dissolve vários compostos encontrados nas camadas do solo. Entre eles, os mais notáveis ​​são os sais de flúor que é a maneira pela qual esse elemento é encontrado na natureza, e o arsênico, um metaloide muito comum na atmosfera, hidrosfera e solo. Outros contaminantes naturais incluem manganês, urânio, radônio, césio e lítio.

Imagem: © Claudio Aguilera O/MINAGRI

O Paradoxo do Flúor

O flúor é encontrado em todas as águas naturais em maior ou menor grau, geralmente a maior parte da água não contém mais do que 0,3 mg/L. É um micro mineral essencial para o corpo humano, pois tem uma função essencial na formação de ossos e na manutenção do esmalte dentário. Na verdade, o uso de creme dental fluoretado tem sido bem-sucedido na prevenção da cárie dentária e a fluoretação da água também se mostrou eficaz nos casos da osteoporose em áreas de déficit do fluoreto na água potável e alimentos.

No entanto, ingerido em excesso é muito prejudicial. O limite estabelecido pela Organização Mundial de Saúde (OMS) para o consumo humano de flúor é de 1,5 mg/L. Comer ou beber em quantidade excessiva provoca fluorose, uma doença que durante o período de formação dentária (antes dos oito anos de idade) pode produzir efeitos opostos aos benefícios do flúor em doses reduzidas: dentes e esqueleto quebradiços, alterações no desenvolvimento do sistema nervoso e problemas de pigmentação na pele. Em muitos casos, os sintomas não aparecem após uma exposição desconhecida e prolongada, o que aumenta os danos à saúde das pessoas afetadas. De fato, o uso de produtos enriquecidos com flúor, como o creme dental, é desencorajado em crianças por causa de sua influência negativa no desenvolvimento do sistema nervoso.

A fluorose é endêmica em 22 países. Os principais afetados são Índia, China, Etiópia e México. Em algumas áreas do México, como o estado de Guanajuato, mostrado no curta-metragem, 40% da população sofre de fluorose grave produzida principalmente pelo consumo de água em mais de 23.000 poços existentes, dos quais mais de 5.000 são ilegais e sem nenhum controle.

Imagem: © Curt Carnemark / World Bank

A epidemia de fluorose aumentou devido à superexploração de aquíferos, o que exige perfurações cada vez mais profundas, em alguns casos chegando a 200 metros. Nestas áreas de águas subterrâneas, a água pode estar em contato com o solo entre 2.000 e 35.000 anos. Essa água “antiga” pode transportar concentrações mais altas de flúor e arsênico. É o que acontece em Guanajuato, onde os aquíferos foram superexplorados pela agricultura, atividades industriais e turísticas com má gestão hídrica.

Arsênico, o contaminante natural mais agressivo

O arsênico é um dos 10 produtos químicos que a OMS considera mais preocupantes para a saúde pública. Segundo a organização, a contaminação natural das águas subterrâneas por arsênico afeta mais de 140 milhões de pessoas em 70 países de todos os continentes. Além do México, o arsênico está naturalmente presente em altos níveis nas águas subterrâneas de vários países, principalmente Argentina, Bangladesh, Chile, China, Índia e EUA. Na Espanha também a superexploração de aquíferos é um gatilho para as intoxicações.

O limite máximo estabelecido pela OMS é de 10 microgramas por litro (10 μg/L). Em algumas localidades, como Guanajuato, o Centro de Geociências da Universidade Nacional Autônoma do México (UNAM) encontrou arsênico na água da região, em níveis cinco vezes superiores aos indicados pela OMS; também chumbo e flúor em uma concentração muito alta, especialmente em áreas próximas a San Luis de la Paz.

O arsênico presente na água também é transmitido para os alimentos que são preparados com ele e por irrigação agrícola, embora a ingestão humana através dos alimentos seja geralmente muito menor do que a produzida pela água contaminada.

Segundo a OMS, a exposição prolongada ao arsênico através do consumo de água e alimentos contaminados pode causar câncer e lesões na pele. Também tem sido associado a problemas de desenvolvimento, doenças cardiovasculares, neurológicas e diabetes. Aqui também, em muitos casos, os sintomas não se tornam aparentes no curto prazo.

Da água da chuva à tecnologia

A contaminação da água por arsênico também vem em muitos casos de atividades industriais e de mineração. No caso do flúor, a contaminação pode ser causada por resíduos industriais ou esgotos, especialmente da indústria de aço e alumínio, fertilizantes, produção de esmaltes e vidro, fabricação de borracha e adesivos, bem como o tratamento de couros e peles. O primeiro passo para preservar a população é detectar essas atividades descontroladas e impor a regulamentação internacional. Intervenções de longo prazo também são necessárias para planejar a redução da exposição de pessoas ligadas a diferentes processos industriais.

Imagem: ©Scott Wallace / World Bank

No caso da presença natural de flúor e arsênico na água, é necessário, antes de tudo, informar adequadamente a população sobre a magnitude e as causas do problema e estabelecer um sistema de monitoramento eficiente e transparente. É necessário que os membros de cada comunidade compreendam os riscos associados à exposição a altos níveis desses contaminantes. Também é essencial submeter populações de alto risco a monitoramento contínuo para detectar os primeiros sintomas de intoxicação. Em muitos casos, os governos não o fazem para evitar prejudicar outros interesses ou simplesmente porque não possuem uma governança adequada dos recursos.

A busca por aquíferos não contaminados é essencial, embora muitas vezes a mesma bacia compartilhe a mesma composição geológica, tornando difícil encontrar aquíferos saudáveis acessíveis a baixo custo, como em grandes áreas da Índia, Etiópia e Bangladesh. Nesses casos, a captação de água da chuva faz parte da solução, especialmente em regiões com alta pluviosidade, como Bangladesh, onde os sistemas domésticos de captação se mostraram muito eficazes no combate a intoxicação endêmica da população por arsênico.

Em muitos casos, no entanto, a remoção de contaminantes é a única solução eficaz e, portanto, necessário recorrer à tecnologia. No caso do flúor, existem vários sistemas no mercado, com diferentes níveis de dificuldade para sua implementação e diferentes graus de eficiência, como sistemas a base de absorventes (alumina ativada, óxidos metálicos, hidróxido de cálcio, carvão ativo, zeólitos, argilas, etc.) ou sistemas mais complexos, como osmose reversa ou eletrodiálise.

A remoção de arsênico, envolve técnicas de oxidação, precipitação e coagulação, absorção, troca iônica e vários sistemas de membranas. Também estão sendo desenvolvidos sistemas eficazes e baratos para eliminar o arsênico em pequena escala doméstica, embora ainda sejam escassas as evidências de sua eficácia a longo prazo.

Em todos os casos, educação e participação da comunidade são fatores-chave para garantir bons resultados. Assim como a capacidade de acessar investimentos para desenvolver e implementar essas tecnologias nas áreas mais pobres, que são as que mais sofrem com as consequências dessa contaminação, quase sempre silenciosa até que sejam irreversíveis.

A necessidade e a falta de água potável fazem as pessoas procurarem alternativas insalubres que afetam a saúde de toda uma comunidade, bem como crianças e adultos que precisam consumir água contaminada com flúor e arsênico. Assista o curta “Necesidad que mata”, de Abraham Lemus (México), finalista na categoria de Micro documentário do We Art Water Film Festival 3.  ASSISTA O DOCUMENTÁRIO.

https://www.youtube.com/watch?v=xtMNGGYYRvM&feature=youtu.be

Referência:  We Are Water Foundation, adaptado por Portal Tratamento de Água

Traduzido por Gheorge Patrick Iwaki

 

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