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250 anos para construir a Agenda 21 Local no Brasil

René Capriles
Editor da ECO•21

Na RIO’92 quase todos os governos da Terra decidiram adotar diversas medidas para implementar o desenvolvimento sustentável, entre elas, a principal foi o Plano de Ação denominado Agenda 21 no qual se estimulava os governos nacionais, estaduais e municipais ONGs, instituições oficiais e empresas privadas, para que, conjuntamente com os cidadãos, fossem adotadas as melhores estratégias para atingir o desenvolvimento sustentável.

A Agenda 21 Local é um poderoso instrumento para proceder às mudanças necessárias no âmbito municipal, desde que ela seja usada em toda sua riqueza conceitual, metodológica e operacional. Exige uma vontade e determinação política mais ampla, que orienta a ação por meio de diretrizes e concepções que dizem respeito à natureza do poder, entendendo-o como um patrimônio da sociedade para promover o bem público.

A RIO’92 propunha que, no ano 2000, pelo menos um milhão de municípios tivessem a sua Agenda 21 Local em marcha. Hoje, 13 anos depois, o número oficial registra somente 7.000 Agendas 21 Locais (65% delas na Europa) devidamente aplicadas, isto é, menos de 1% dos municípios do Planeta. Em média, 700 municípios adotam anualmente esse Plano de Ação, o que significa que serão necessários pelo menos 1.500 anos para implantar o milhão de Agendas Locais previstas.

Na prática, uma Agenda 21 Local não passa de uma forma de envolver todas as pessoas e instituições de uma região na identificação dos principais problemas ambientais, sociais e econômicos desse local e das soluções preferíveis para esses problemas à luz da visão que a comunidade tem para o seu futuro. Por essa razão, a Agenda 21 deveria ser profundamente conhecida em todos os estamentos da sociedade, com particular ênfase nos programas educacionais.

Trata-se de um processo com uma componente participativa muito importante através do qual as autoridades trabalham em parceria com os diversos setores da comunidade na elaboração de um Plano de Ação que permita implementar a sustentabilidade em nível local.

Segundo alguns estudos especializados, em muitos casos, nos municípios que já estão aplicando o Plano de Ação da Agenda 21 não existe uma participação direta e real dos cidadãos. Igualmente foi constatado, mediante pesquisas e levantamento de dados que, na realidade, o que existe hoje não passa de um “simulacro de participação” cidadã limitado a projetos urbanísticos com forte tendência para os setores do turismo. Segundo esses informes, se faz necessário a elaboração de um plano que atue muito além da questão ambiental levando em consideração todos os fatores sócio-econômicos das cidades.

A grande maioria dos municípios europeus que já estão aplicando a Agenda 21 Local, também assumiu o compromisso da “Carta de Aalborg” assinada nessa cidade dinamarquesa em 1994. Esta iniciativa pretende a promoção do desenvolvimento sustentável se apoiando principalmente nos setores econômicos dos municípios. O pensamento diferenciado da Agenda 21 Local fica mais evidente num dos enunciados que diz: “Nós, cidades, reconhecemos que as autoridades locais devem estabelecer políticas de ordenamento do território que integrem uma avaliação estratégica dos efeitos de todas as iniciativas ambientais. Devemos tirar partido das possibilidades oferecidas pelas grandes concentrações urbanas, em matéria de serviços públicos de transporte e abastecimento de energia. Lançando programas de renovação urbana e de planejamento de novas áreas urbanas periféricas, faremos esforços para combinar diferentes funções, de modo a reduzir as necessidades de mobilidade. O conceito de interdependência regional eqüitativa deverá permitir o equilíbrio dos fluxos entre a cidade e o campo dissuadindo as cidades de explorarem simplesmente os recursos das áreas periféricas”.

A “Carta de Aalborg” considera a sustentabilidade como um processo criativo local e equilibrado e não uma simples perspectiva, nem um estado imutável. A sustentabilidade permite a obtenção duma informação permanente sobre as atividades que favorecem o equilíbrio do ecossistema urbano, ou sobre aquelas que o afastam. Ao basear a gestão urbana na informação alcançada ao longo deste processo, a cidade é encarada como um conjunto orgânico, tornando visíveis os efeitos de suas mais significativas ações. É através desse processo, que a cidade e os cidadãos podem fazer escolhas devidamente pensadas. Um sistema de gestão assente na sustentabilidade faz com que as decisões tomadas levem em consideração não somente os interesses das partes respeitantes, mas também os das gerações futuras.

A Agenda 21 Local, obriga as cidades a se comprometerem na utilização dos instrumentos políticos e técnicos disponíveis para uma abordagem ecossistémica da gestão urbana.

Devem-se aproveitar os instrumentos existentes, incluindo os relacionados com o processamento de dados ambientais regulamentos, instrumentos econômicos e de comunicação, como os decretos, taxas e multas e também dos mecanismos de incremento da conscientização, em geral, incluindo a participação do público. O que se procura em definitiva é o estabelecimento de novos sistemas orçamentais ambientais que disponibilizem meios para a gestão dos recursos naturais, em moldes análogos aos que se aplicam aos outros tipos de recursos.

Numa correta interpretação da Agenda 21 Local, as decisões e as políticas de controle e vigilância do ambiente, avaliação de impactos, contabilidade, balanços e relatórios parciais ou globais, devem de estar baseadas em diferentes tipos de indicadores, tais como, os de qualidade ambiental, fluxos urbanos, e, acima de tudo, indicadores de sustentabilidade dos sistemas urbanos.

Em Aaltborg, as cidades, reconheceram que uma série de políticas e atividades já foi aplicada com sucesso, isto é, com conseqüências ecológicas positivas, em numerosas cidades européias. Contudo, enquanto estes instrumentos forem considerados somente como meios disponíveis para reduzir o ritmo e a pressão da insustentabilidade, não serão suficientes para inverter essa mesma insustentabilidade na sociedade. De qualquer modo, com a importante base ecológica já existente, as cidades estão em excelente posição para efetivarem a integração das suas políticas e atividades no processo de administração e gestão das economias urbanas duma forma sustentável. Neste processo, todos os cidadãos são chamados a desenvolver e a aplicar estratégias próprias, bem como a partilhar a experiência adquirida.

Segundo a ambientalista Patrícia Kranz, que é uma especialista na metodologia da Agenda 21 Local, “Os processos da Agenda 21 Local têm o desenvolvimento sustentável como foco e dão às questões ambientais o mesmo peso que às econômicas e sociais. Buscam mostrar as convergências e interdependências, fomentando uma reflexão crítica sobre o modelo de desenvolvimento que se deseja e suas conseqüências em termos de crescimento econômico, justiça social e preservação ambiental. Este foco no Desenvolvimento Sustentável pede, ainda, que sejam consideradas duas questões que normalmente não são abordadas em outros processos de desenvolvimento: a satisfação das necessidades das gerações atuais não deve colocar em risco as possibilidades das futuras gerações satisfazerem suas necessidades e as mudanças pedidas nos padrões de consumo dos países desenvolvidos que servem de modelo para os países em desenvolvimento, e são imitados pelas elites destes”.

No ano 2000 foi lançada pelo Ministério do Meio Ambiente uma publicação de especial importância no processo de internalização da Agenda 21 no País: o manual Construindo a Agenda 21 Local destinado a orientar cidadãos, prefeituras, parlamentares, ONGs, entidades comunitárias e demais envolvidos na luta pela sustentabilidade social, política, ética e ambiental no nível local.

Se referindo ao manual “Construindo a Agenda 21 Local”, a Ministra Marina Silva disse: “é um guia que procura auxiliar diferentes setores de nossa sociedade a iniciar e, sobretudo, criar as condições necessárias para a continuidade do processo de elaboração de agendas locais. Deixa claro em seu texto a importância da participação de todos os atores sociais, em todas as etapas de preparação de um plano de desenvolvimento sustentável local, desde o diagnóstico, passando pela elaboração pela definição de ações prioritárias meios de implementação responsabilidades comuns e acompanhamento da implementação. Estamos certos que é no processo participativo, que os planos estratégicos locais passarão a ser, realmente, planos de desenvolvimento sustentável de uma localidade e não planos de uma única gestão política administrativa”.

Em 2003, foi organizada no Congresso Nacional uma Frente Parlamentar Agenda 21 com o objetivo de atuar junto aos municípios brasileiros, estimulando a organização dos poderes legislativo e executivo e os diversos segmentos da sociedade na construção das Agendas 21 Locais. O Brasil tem 5.561 municípios, mas, até agora, ao redor de 300 assumiram a Agenda 21 Local como o princípio básico para seu desenvolvimento. Neste ritmo, o Brasil levará quase 250 anos para implementar este Plano de Ação em todas as suas Prefeituras.

Fonte: http://www.eco21.com.br

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