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Quantificação e classificação dos resíduos procedentes da construção civil e demolição no município de Pelotas, RS

Ambient. constr. vol.12 no.2 Porto Alegre Apr./June 2012

http://dx.doi.org/10.1590/S1678-86212012000200008

Quantificação e classificação dos resíduos procedentes da construção civil e demolição no município de Pelotas, RS

Quantification and classification of construction and demolition waste in the municipality of Pelotas, RS

Alessandra Buss TessaroI; Jocelito Saccol de SáII; Lucas Bastianello ScreminIII

IDepartamento Ambiental – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-Grandense – Av. Vinte de Setembro, 455, Centro Pelotas – RS – Brasil CEP 96100-000 Tel.: (53) 2123-1000 Ramal: 1046 E-mail:[email protected]
IIDepartamento Ambiental – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia Sul-Rio-Grandense E-mail:[email protected]
IIIDepartamento de Construção Civil – Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Santa Catarina – Rodovia SC 443, Próspera – Criciuma – SC – Brasil CEP 88813-390 Tel.:(48) 3462-5028 E-mail:[email protected]

 

RESUMO

A construção civil é um dos setores econômicos de maior impacto no meio ambiente. Entre os impactos causados por essa atividade, pode-se citar o elevado volume de resíduos gerados, que, na maioria dos municípios brasileiros, são depositados irregularmente, intensificando os problemas de saneamento nas áreas urbanas. Em virtude disso, algumas ações vêm sendo tomadas pelo Governo Federal, entre as quais se pode citar a criação de uma resolução que estabelece a elaboração e implantação de um plano integrado de gerenciamento de resíduos da construção civil com base nas características de cada região. O objetivo do presente artigo é apresentar os resultados do diagnóstico qualitativo e quantitativo da produção de resíduos de construção e demolição (RCD) no município de Pelotas-RS, elaborado com o auxílio de um software. O diagnóstico final resultante da pesquisa foi que são produzidos diariamente no referido município 315,08 m³ de RCD a uma taxa de geração per capita de 1,23 kg/hab.ano. A densidade dos RCD encontrada foi de 1,28 ton/m³, e a composição gravimétrica mostrou que 88% dos RCD produzidos referem-se aos resíduos classe A, os quais tem grande potencial para reutilização e reciclagem.

Palavras-chave: Resíduo de construção, demolição,  Diagnóstico, Quantificação

ABSTRACT

Construction is one of the economic sectors that has the largest impact in the environmental. One of the main impacts caused by this activity is the large amount of waste that is generated, which is disposed irregularly in most Brazilian municipalities, aggravating sanitation problems in urban areas. In order to address this problem, the Federal Government has undertaken some initiatives, including the creation of a resolution that establishes the development and implementation of an integrated waste management plan for the construction industry, based on the features of each region. The aim of this article is to present the results of a qualitative and quantitative assessment of the production of construction and demolition waste (CDW) in the municipality of Pelotas, RS, carried out with the support of a computer software. The results indicated that 315.08 m³ of CDW are produced daily in the municipality, at a per capita generation rate of 1.23 kg/inhabitant per year. The density of CDW found was 1.28 ton/m³ and gravimetric composition showed that 88% of CDW produced was Class A waste, which has a great potential for being reused and recycled.

Keywords: Construction and demolition waste. Diagnosis. Quantification.

 

Introdução

A construção civil tem sido considerada uma das mais importantes atividades para o desenvolvimento da sociedade, porém é uma atividade que causa impactos ambientais, pois utiliza recursos naturais, modifica o meio ambiente e gera um grande volume de resíduos. Diante desse fato, nas últimas décadas vem aumentando a preocupação quanto à disposição final dos resíduos gerados por ela.

Segundo Teixeira (2010), a problemática que envolve a situação dos resíduos sólidos é ampla e generalizada em todo o mundo. Os resíduos sólidos produzidos variam em sua composição, podendo ser identificados desde o tipo doméstico, hospitalar, químico, industrial e, entre outros, os resíduos gerados pela construção civil.

A geração de entulho é diretamente proporcional ao crescimento e ao desenvolvimento econômico de uma sociedade. Outro fator marcante é que a humanidade torna-se cada vez mais urbana e, segundo Teixeira (2010), a produção de resíduos cresce proporcionalmente à urbanização.

De acordo com Oliveira (2008), os resíduos de construção e demolição (RCD) possuem características bem peculiares, podendo variar sensivelmente em função do local da geração, da tecnologia aplicada na construção, das variantes referentes ao material aplicado durante a obra, da qualidade do projeto e da mão de obra utilizada. Essas variações interferem diretamente na quantidade do RCD gerado no Brasil, em que se pode observar claramente a necessidade de reduzir e de reciclar.

Conforme Morais (2006), o descarte inadequado do RCD é um dos maiores problemas na gestão dos municípios, pois ocasiona impactos significativos no meio ambiente urbano, o que pode comprometer a paisagem, o tráfego de pedestres e veículos, a drenagem urbana, além de atrair resíduos não inertes que contribuem para a multiplicação de vetores de doenças.

Embora seja importante a destinação adequada dos resíduos gerados, tornam-se imprecindíveis ações que visem à redução diretamente na fonte, ou seja, nos próprios canteiros de obra, que, somadas às ações de adequar a destinação desses resíduos, podem contribuir significativamente para a redução dos impactos da atividade construtiva no meio ambiente (SOUZA, 2004). Ainda, para Arruda (2005), a reciclagem surge como uma medida necessária em função da existência de RCD, mas, para ser viável, deve-se levar em consideração as condições em que os resíduos serão segregados.

A partir da década de 90 os RCD passaram a ser objeto de pesquisa científica, resultando em diversas publicações, que culminaram, em 2002, na Resolução do Conama nº 307 (BRASIL, 2002), a qual normalizou as principais questões relacionadas aos RCD e definiu-o como sendo resíduos provenientes de construções, reformas, reparos e demolições de obras de construção, bem como os resultantes da preparação e escavação de terrenos. Ainda, a referida resolução passou a exigir dos municípios brasileiros a elaboração e a implementação de um Plano Municipal de Gerenciamento dos Resíduos de Construção Civil, conforme a situação local.

De acordo com Bernardes et al. (2008), os estudos já realizados, de forma geral, mostraram que o primeiro passo para o desenvolvimento de ações visando ao gerenciamento eficaz do RCD é a realização de um diagnóstico local, identificando aspectos referentes a esses resíduos tais como origem, taxa de geração, agentes envolvivos na geração e coleta, destinação final, entre outros, que servem de base para o dimensionamento de ações para o atendimento da resolução vigente.

Portanto, é necessária a realização desse dignóstico para elaborar ações visando primeiramente à minimização da geração dos RCD e, também, à reutilização, reciclagem e destinação adequada, possibilitando, assim, uma redução nos custos de construção e também nos impactos ambientais causados por essa atividade.

Nesse contexto, este trabalho tem como objetivo realizar o diagnóstico da atual situação dos RCD no município de Pelotas, RS, para que futuras ações possam ser tomadas com vistas ao atendimento das normas vigentes e, em conseqüência, para contribuir na preservação do meio ambiente.

Resolução Conama nº 307

No Brasil, a legislação referente aos resíduos de construção civil é a Resolução do Conama nº 307, de 5 de julho de 2002, que estabelece diretrizes, critérios e procedimentos a serem adotados por governos municipais e agentes envolvidos no manejo e destinação do RCD, a fim de que os impactos ambientais produzidos por esses resíduos sejam minimizados (BRASIL, 2002).

A resolução Conama nº 307 estabelece diretrizes para que os municípios e o Distrito Federal desenvolvam e implementem políticas estruturadas e dimensionadas a partir de cada situação local, devendo essas políticas assumir a forma de um Plano Integrado de Gerenciamento de Resíduos de Construção e Demolição (PIGRCD), incorporando necessariamente (BRASIL, 2002):

(a) Programa Municipal de Gerenciamento de Resíduos de Construção e Demolição (PMGRCD), com as diretrizes técnicas e procedimentos para o exercício das responsabilidades dos pequenos geradores e transportadores; e

(b) Projetos de Gerenciamento de Resíduos de Construção e Demolição (PGRCD) que orientem, disciplinem e expressem o compromisso de ação correta por parte dos grandes geradores de resíduos, tanto públicos quanto privados.

Ainda, a resolução estabelece que os grandes geradores tenham como objetivo principal a não geração de resíduos e, posteriormente, a redução, a reutilização, a reciclagem e a destinação final adequada.

Os resíduos da construção civil devem ser classificados, para efeito dessa resolução e conforme a Resolução do Conama no 4311, em Resíduos Classe A, B, C ou D, o que é detalhado na Tabela 1.

 

Diante do exposto, os resíduos da construção civil deverão ser destinados de acordo com sua classificação, conforme a Tabela 2.

Possibilidades para aplicações do RCD e do material reciclável

As vantagens econômicas da reciclagem em substituição às deposições irregulares de RCD são claramente notadas nos custos de limpeza urbana para as administrações municipais devido ao alto custo do descarte irregular, correção da deposição com aterramento e controle de doenças que custam em média U$ 10/m3 de RCD, contra um custo 25% menor para a reciclagem (CARNEIRO et al., 2001).

Uma das opções de uso do agregado reciclado é a utilização em pavimentação, que, além da vantagem de diminuir a quantidade de resíduos dentro dos aterros, traz benefícios como (LEITE et al., 2007):

(a) diminuição dos custos de pavimentação, sempre que estes materiais tenham um custo menor que os materiais convencionais levando em conta o fator transporte;

(b) expansão pequena ou nula, ou seja, com entrada de água ou saturação não se apresentaram mudanças de volume nas camadas compactadas;

(c) ganho de resistência devido à autocimentação, em função da eventual presença de atividade pozolânica;

(d) melhoria nas condições de saneamento dos municípios e economia com a limpeza urbana, colaborando com programas municipais de gerenciamento de resíduos sólidos;

(e) poupança de recursos minerais naturais, devido à menor velocidade de exploração das jazidas, com consequente diminuição de agressão ao meio ambiente;

(f) diminuição dos custos de operação de aterros, devido à menor quantidade de resíduo envolvido;

(g) necessidade de áreas menores para manutenção de aterros e bota-foras, em função do prolongamento da vida útil dos existentes; e

(h) redução do consumo de energia e geração de CO2 na produção e transporte de materiais.

De acordo com Kartam et al. (2004), os RCD reciclados também podem ser utilizados como agregado para concreto de baixa resistência, em pavimentação de rodovias, como material para drenos ou para recheio de estruturas de contenção, na produção de blocos de cimento, na fabricação de blocos pré-moldados para pavimentação de calçadas, etc. A eficiência da reciclagem de RCD pode ser melhorada caso exista um conjunto de instruções acompanhadas de avanços tecnológicos e de procedimentos cientificamente testados.

A combinação de RCD com materiais sintéticos alternativos também tem sido estudada, tais como tiras ou grãos de borracha de pneus usados e garrafas PET prensadas. Esses materiais podem ser utilizados em substituição a materiais granulares naturais em sistemas drenantes. A presença de um geotêxtil envolvendo material drenante alternativo pode servir como um elemento de filtro para o sistema. A utilização desses materiais alternativos, além de dar uma destinação ambientalmente amigável para tais resíduos, pode representar economias substanciais em regiões onde materiais drenantes convencionais sejam escassos ou caros (PALMEIRA, 2010).

Sistema de apoio ao gerenciamento dos resíduos de construção e demolição

De acordo com Scremim (2007), o Sistema de Apoio ao Gerenciamento dos Resíduos de Construção e Demolição é um software desenvolvido para auxiliar municípios no gerenciamento de RCD.

O software permite, por meio de uma interface interativa e acessível, funções como provimento de informações referentes ao RCD ao usuário, auxílio no diagnóstico do RCD no município e, a partir do diagnóstico, proposição de alternativas de gestão.

Com relação às informações referentes ao RCD, o software fornece ao usuário uma explanação das informações necessárias para a utilização da ferramenta e como coletar os dados necessários para o diagnóstico do RCD no município. Nesse estágio, são fornecidas planilhas e fichas que servem para o levantamento e o cadastramento de dados referentes aos agentes envolvidos na geração e coleta do RCD.

Após o usuário estar familiarizado com o assunto e ter realizado a coleta das informações básicas a respeito do RCD no município, as informações são cadastradas no sistema que armazena e processa esses dados. O sistema pode ser alimentado com dados à medida que estes venham sendo obtidos, formando, assim, um banco de dados com informações como:

(a) cadastro dos agentes envolvidos na geração de RCD;

(b) cadastro dos agentes envolvidos na coleta e transporte de RCD;

(c) cadastro de áreas utilizadas como destinação final (bota-fora);

(d) característica qualitativa e quantitativa de RCD no município; e

(e) cadastro de áreas que poderão ser utilizadas para a instalação de pontos de entrega voluntária (PEV), áreas de transbordo e triagem (ATT) e aterro.

Após o estágio de diagnóstico, o sistema fornece informações que podem auxiliar no dimensionamento de ações visando à gestão correta desses resíduos. É sugerido ao usuário levantar:

(a) características das áreas de PEV, ATT e aterro;

(b) sugestões de destinação final para cada classe de resíduo, através do fornecimento de trabalhos técnicos da área; e

(c) exemplos de programas de educação ambiental e fiscalização necessários para a implementação de outros ações.

Metodologia

O estudo foi desenvolvido no município de Pelotas, RS, localizado a 250 km de Porto Alegre, a capital do estado, no extremo sul do Brasil, ocupando uma área de 1.610,09 km² (192,5 km² de área urbana), com 328.275 habitantes, dos quais cerca de 92% residindo na zona urbana do município (IBGE, 2010).

Primeiramente foi realizada uma pesquisa junto ao órgão responsável do município pela limpeza pública, para verificar os procedimentos referentes à coleta e destinação final do RCD dada no município e aos agentes envolvidos. Após a identificação dos agentes envolvidos (setor público e privado de coleta) foram realizadas visitas às mesmas com o objetivo de coletar dados referentes às movimentações de carga, destinação final dada, tipos de equipamentos utilizados, etc. Para a caracterização quantitativa, foi utilizada a metodologia proposta pelo software mencionado anteriormente, que se baseia em Neto (2005) e consiste na média dos seguintes parâmetros:

(a) movimentação de cargas das empresas coletoras, obtida pelo somatório do RCD coletado por empresas e pela administração municipal; e

(b) volume descartado nos aterros municipais, obtido pelo somatório dos resíduos descartados diariamente em aterros autorizados por empresas de coleta, pela própria prefeitura e por empresas de terraplenagem e outras.

Para o diagnóstico da origem do RCD, durante os meses de outubro, novembro e dezembro de 2009, foram entregues para empresas que atuam na coleta e transporte de RCD do município planilhas onde deveriam ser registrados os dados das coletas classificados em reformas/demolições e novas obras, poda e volumosos, sendo os volumosos restos de móveis e outros materiais não inertes e todo o material não classificado como RCD, com a finalidade de realizar o diagnóstico da massa unitária e o porcentual da composição dos materiais contidos no RCD.

A caracterização quantitativa foi realizada durante 2009. Com os dados, realizou-se a média do peso, em toneladas, do RCD coletado durante o período de 12 meses, para identificar a estimativa da quantidade total de RCD produzido mensalmente em Pelotas, sendo utilizada a metodologia adotada por Neto (2005).

Para realizar a caracterização qualitativa dos RCD no aterro municipal, utilizou-se o método de amostragem de acordo com a NBR 10007 (ABNT, 2004). A amostragem consistiu na seleção aleatória de 3 caçambas de 5 m3 de resíduos provenientes de diferentes locais dispostos no aterro controlado do município. Posteriormente foram coletadas, de cada caçamba, 5 amostras de 18 litros, totalizando uma amostra de 90 litros por caçamba.

Com o total das amostradas representativas da composição dos RCD, realizaram-se a separação e a classificação dos componentes, determinação do volume e do peso dos resíduos e a análise gravimétrica do RCD. A classificação dos resíduos foi realizada conforme a Resolução do Conama nº 307 (BRASIL, 2002) e nº 431 (BRASIL, 2011).

Foram identificados na pesquisa, através de vistas in loco, os pontos de depósito irregular de RCD no município, sendo esses pontos georreferenciados com o auxílio de GPS, sendo os dados processados no programa GTM PRÓ para a confecção da imagem. O GTM PRÓ é um software de geoprocessamento com capacidade de interface com unidades receptoras GPS e possui inúmeras funções para profissionais, tais como levantamento topográfico georreferenciado, levantamento cartográfico, entre outros.

O presente estudo abrange somente os resíduos coletados pelas empresas licenciadas, não considerando os resíduos presentes nos pontos de depósito irregulares.

Todos os dados coletados serviram para alimentar o Sistema de Apoio ao Gerenciamento dos Resíduos de Construção e Demolição, que, como mencionado anteriormente, é um software desenvolvido para auxiliar municípios no gerenciamento do RCD.

Resultados e discussões

A partir dos dados coletados nas visitas aos agentes envolvidos com a coleta, transporte e disposição dos RCD no município de Pelotas, RS, procedeu-se à inserção deles no Sistema de Apoio ao Gerenciamento dos Resíduos de Construção e Demolição, para que fizesse o processamento e armazenamento desses dados, fornecendo, ao final, um resumo do diagnóstico dos RCD no município e sugerindo algumas alternativas de gestão.

Conforme diagnosticado em Pelotas, existem quatro empresas privadas licenciadas para a coleta e transporte do RCD e um serviço público de coleta realizado pela prefeitura. A prefeitura disponibiliza gratuitamente caçambas para a população, que são deixadas por 24 h no local solicitado e, após esse prazo, são recolhidas. As solicitações de caçamba são realizadas por telefone e, no momento do pedido, é preenchida uma ficha com os dados do local da coleta. Os tijolos e as telhas em bom estado são recolhidos e encaminhados para o pátio da prefeitura, e depois são disponibilizados para a população carente, para ser utilizados em reformas e construções que necessitem pouco material.

As quatro empresas privadas foram identificadas nesta pesquisa como Empresa A, Empresa B, Empresa C e Empresa D, e o trabalho realizado pela Prefeitura, como público.

Durante 2009, foram coletados pelas empresas licenciadas e pelo serviço público de coleta 98.305 m³ de RCD. Assim, tem-se uma geração mensal no município de 8.192,08 m³ ou 315,08 m³/dia (considerando 26 dias uteis no mês). A taxa de geração per capita foi de 1,23 kg/hab.dia (considerando a densidade do RCD igual a 1,28 ton/m³ obtida na pesquisa e mencionada posteriormente).

Os equipamentos utilizados pelas empresas coletoras estão relacionados na Tabela 3.

De acordo com dados fornecidos pelo Serviço Autônomo de Saneamento de Pelotas (Sanep), é encaminhada mensalmente para o aterro municipal uma média de 7.685 toneladas de resíduos sólidos urbanos (RSU), domiciliares e RCD, resíduos estes coletados pelos setores público e privado. Do total de RSU encaminhados para o aterro, 30,46% são referentes ao RCD, totalizando 2.340,86 toneladas por mês. Parte dos RCD destinados ao aterro são utilizados para melhorar a condição das vias de tráfego dentro da área aterro e o restante é depositado juntamente com os resíduos domiciliares, como pode ser observado na Figura 1. Essa atitude de depositar o RCD juntamente com os resíduos domiciliares no aterro descumpre a legislação e contribui para a redução da vida útil dele.

Os RCD que não são encaminhados para o aterro municipal são comercializados pelas empresas como material de aterro ou descartados irregularmente em áreas não licenciadas. Foram identificados 18 pontos de deposição irregular, os quais foram mapeados conforme a Figura 2.

Observou-se que a deposição irregular de RCD ocorreu com maior frequência ao longo da malha viária do município e nas margens do Canal São Gonçalo. A região onde se localiza a malha viária é mais afastada do centro do município e com presença de banhados, o que gera um grande impacto ambiental, demonstrado na Figura 3.

Segundo Ferreira (2005), em geral, banhados não atuam apenas como sumidouro ou reservatórios para partículas inorgânicas e nutrientes solúveis, mas também como fontes para compostos orgânicos dissolvidos e particulados, desempenhando funções essenciais para a manutenção dos recursos hídricos e possuindo funções ecológicas importantes para a manutenção do equilíbrio das regiões em que se desenvolvem. Essas funções incluem a produção de alimentos, a conservação da biodiversidade, a contenção de enchentes e o controle da poluição.

A deposição inadequada ao longo da margem do Canal São Gonçalo e seus afluentes (Figura 4) representa um grave problema ambiental, pois, além de deteriorar a qualidade das águas superficiais e subterrâneas, contribui para as inundações da área urbana e para a proliferação de vetores de doenças.

Em todos os pontos de deposição irregular observados além dos RCD, foram identificados resíduos domésticos, hospitalar, poda de árvores e volumosos. Tais ocorrências são comuns em pontos de deposição de RCD, pois eles acabam atraindo outros tipos de resíduos, agravando os impactos já causados. Tal situação deve despertar nos gestores públicos rigidez na fiscalização e maior cobrança para que os gestores de RCD cumpram seu papel diante da real situação.

Para o diagnóstico da origem dos RCD, somente uma empresa de coleta de RCD concordou em participar do levantamento (Empresa D). De acordo com os dados fornecidos pela empresa, dos 30,46% dos entulhos recolhidos mensalmente no município, 76% são de RCD, 13% de resíduos de poda e também foram encontrados 11% de volumosos.

Na Tabela 4, observa-se que 88% do RCD gerado no municipio refere-se à Classe A, ou seja, fração mineral composta de argamassas, concretos, material cerâmico e solo natural, ambos reutilizáveis ou recicláveis na forma de agregado. Esse valor é semelhante aos dados oriundos de outros municípios como Passo Fundo, RS, por exemplo, onde Bernardes et al. (2008) encontraram 94,9% de RCD Classe A no RCD gerado naquele município.

 

Ainda, a densidade dos RCD obtida no município foi de 1,28 ton/m³, o que permite concluir que são geradas no município 10.485,86 toneladas mensalmente de RCD.

Durante 2009, foram coletados, pelas empresas licenciadas e pelo serviço público de coleta, 98.305 m³ de RCD. Assim, tem-se uma geração mensal no município de 8.192,08 m³ ou 315,08 m³/dia (considerando 26 dias uteis no mês). A taxa de geração per capita é 1,23 kg/hab.dia (considerando a densidade do RCD igual a 1,28 ton/m³ obtida na pesquisa e mencionada posteriormente).

Comparado esse valor com as 5.344,14 toneladas de resíduos domiciliares recebidos no aterro, conclui-se que os RCD representam 66,24% dos RSU gerados no município.

Com base no diagnóstico dos RCD do município, o sitema forneceu as seguintes informações:

(a) número de pontos de entrega voluntária igual a 10;

(b) área necesária para a implantação de uma ATT entre 2.300 e 4.800 m²;

(c) volume de RCD Classe A a ser dado destinação final (aterro/reciclagem) igual a 277,27 m³/dia;

(d) volume de RCD Classe A passível de reciclagem igual a 110,23 m³/dia;

(e) área necessária para a implantação de uma central de reciclagem entre 3.500 e 7.500 m²; e

(f) quantidade de material reciclável (Classe B) por dia:

– papel/papelão _ 1,21 tonelada;

– metal – 10,08 toneladas;

– madeira – 16,13 toneladas;

– vidro – 4,03 toneladas; e

– plástico/PVC _ 8,87 toneladas.

Além dessas informações, o software disponibiliza documentos técnicos referentes às formas de reciclagem de RCD Classe A, aterros de inertes, programa de informação ambiental e fiscalização e características da base jurídica.

Entre as possíveis aplicações da fração mineral dos RCD, pode-se citar a utilização desses como base e sub-base de pavimentação, agregado para argamassa e concreto sem função estrutural, como material de aterro, etc. No município em estudo, já se utiliza parte do RCD coletado, sem nenhum tipo de beneficiamento, para melhoramento das vias internas do aterro controlado do município, o que anteriormente era realizado com a utilização de material natural.

Com o volume passível de reciclagem no município, acredita-se que seria viável economicamente a reciclagem dos RCD para a utilização do agregado gerado na confecção de artefatos de concreto sem função estrutural (tubos para drenagem, lajotas para pavimentação, meio-fio, etc.), o que já acontece em cidades como Belo Horizonte, onde a prefeitura possui três usinas de reciclagem de RCD.

Conclusão

Apesar de a Resolução nº 307 do Conama (BRASIL, 2002) estar em vigor desde 2004, nenhuma ação visando ao atendimento desse documento vem sendo realizada no município de Pelotas. Atualmente, a coleta e o transporte dos RCD são realizados por quatro empresas privadas e o setor de limpeza pública, que coletam diariamente 315,08 m³ de RCD.

O RCD representa 66,24% do RSU gerado no município, e a taxa de geração per capita é de 1,23 kg/hab.dia. Dos 315,08 m³ de RCD coletados diariamente, 70,34 m³ (22,32%) são destinados ao aterro municipal, e o restante é comercializado com material para aterro ou depositado irregularmente no meio ambiente. Foram detectados 18 pontos de deposição irregular, distribuídos ao longo de ruas e rios da cidade.

A composição gravimétrica do RCD gerado no município mostra que a Classe A representa 88% do total de resíduos gerados e o restante é composto principalmente de resíduos Classe B (papel, plástico, vidro e metal). Isso demonstra a parcela significativa de resíduos que pode ser reutilizável ou reciclável na forma de agregado. Ainda, tem-se a densidade do RCD igual a 1,28 ton/m³.

Em virtude desse diagnóstico, percebe-se a necessidade clara de implantação de um plano de gerenciamento dos RCD no município de Pelotas. Espera-se que este diagnóstico sirva de apoio para a implantação desse plano de gerenciamento pelas autoridades locais, contribuindo, assim, para o atendimento da legislação e, consequentemente, para a preservação do meio ambiente.

Referências

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