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Análise de alternativas de processo e disposição de lodo de esgoto na agricultura: quando a atratividade econômica e a preservação ambiental caminham juntas

Resumo

O presente artigo considerou nove alternativas técnicas de investimento para disposição final do lodo gerado em estações de tratamento de esgoto (ETE) considerando a atratividade econômica e riscos para o cumprimento das exigências das leis ambientais em vigor. Destas alternativas, três relacionam-se com o beneficiamento e disposição diretamente na agricultura e uma quarta alternativa é o envio para aterros sanitários. Embora o lodo classe B tenha sido banido nas empresas de saneamento, conforme previsto na Resolução CONAMA 375/06 a partir de 2011, os custos associados a essa classe de qualidade também foram analisados, em comparação ao lodo Classe A. Essa comparação pretendeu confirmar se de fato a produção de lodo Classe B é menos onerosa que a produção de lodo Classe A para cada uma das alternativas estudadas, uma vez que uma das tecnologias mais novas em uso permite a redução do volume, o que impacta diretamente na diminuição de custos de transporte desse material. O trabalho esmerou-se em detalhar toda a cadeia produtiva, incluindo os custos fixos e variáveis; custos de atendimento às exigências legais, que são mais impactantes conforme o tipo de disposição pretendida; e as barreiras de mercado. Adiciona ainda uma visão do potencial econômico dos dois tipos de lodo, Classe A e Classe B, quanto ao valor agregado, o que permite explorar a atratividade junto aos interessados em utilizá-lo no solo ou na agricultura. O objetivo principal foi comparar várias alternativas do ponto de vista econômico e ambiental, e estimular discussões futuras quanto às oportunidades e as barreiras mercadológicas, sem perder de vista os riscos jurídico-ambientais inerentes a cada uma das opções.

Introdução

Em qualquer processo industrial ocorre a geração de resíduos que podem não apresentar utilidade direta no próprio processo, mas podem se tornar matéria-prima para outras atividades e com fins variados. No Brasil, após de 20 anos de discussão veio a ser aprovada em meados de 2010 a Política Nacional de Resíduos Sólidos (PNRS) – lei nº 12.305/10 (BRASIL, 2010), regulamentada pelo Decreto nº 7.404. A PNRS tem como objetivo que o cidadão, o setor privado, a sociedade civil e os governos tratem de uma forma mais responsável, cooperativa e ambientalmente correta os resíduos gerados. No setor saneamento a geração de lodo é inerente às suas atividades. Tanto o tratamento de água quanto o de esgotos produzem resíduos que demandam destinação adequada para aterros controlados. Este é um desafio a se enfrentar, não apenas porque a sociedade, acertadamente, assim o cobra; porque cuidar da preservação dos recursos hídricos e do meio ambiente é indissociável das operações das empresas cuja principal matéria-prima é a água. O beneficiamento do lodo de esgotos para obtenção de um material utilizável no solo, para a agricultura ou para a silvicultura permite o atendimento a todas essas exigências. Associado a tudo isso se espera que nos próximos anos o Brasil amplie seus índices de tratamento de esgoto, o que irá indubitavelmente ocasionar a maior geração de resíduos sólidos, especialmente o lodo do tratamento. Esse aumento, se não associado a um planejamento quanto as formas de destinação, poderá gerar outros impactos tão ou mais desastrosos quanto a ausência do tratamento desses esgotos. Em outros países como Austrália, Espanha e Estados Unidos, o uso no solo é bastante disseminado. Já no Brasil, é difícil até mesmo obter dados a respeito da disposição. HONORIO (2014) realizou levantamento aonde clonclui que na região da bacia hidrográfica do Piracicaba (Estado de São Paulo), a qual concentra 5,3 milhões de habitantes, todo o lodo gerado em ETEs é destinado paraa aterros sanitários da região. Não há qualquer prática de reciclo. Mas o que isso representa em termos práticos e sociais? Em um estudo realizado pela SABESP para uma das regiões em que atua e aonde o lodo Classe B teve amplo uso e aceitação com reais benefícios e sem registros de qualquer problema ambiental ou de saúde pública; e considerando que a geração diária de lixo “per capita” no Brasil varia de 0,4 kg a 0,7 kg, com média de 0,52 kg/dia/habitante (CETESB, 1992, citado por CEPEA-USP); e considerando ainda um município com 337.00 habitantes, a cada 6 anos de disposição de lodo no aterro equivaleriam a 1 ano de disposição de lixo. Em outras palavras, sendo a produção anual de resíduos estimada em 63.934 ton/ano e a de lodo equivalente a 10.613 ton/ano, com a disposição de lodo no aterro sanitário municipal, a cada 6 anos reduz-se em 1 ano o tempo de vida útil do aterro. Isto demanda que o poder público tenha que investir em novos aterros em um espaço de tempo muito menor do que o previsto no projeto original (SABESP, 2009). Ou seja, o custo para a sociedade e para o meio ambiente é, de fato, significativo quando a opção é somente uma: envio para o aterro sanitário.

No Brasil, a Resolução CONAMA 375/06 (BRASIL, 2006) e as normativas do Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) oferecem alternativas técnicas e legais para o tratamento e a disposição controlada desse material.

O presente artigo apresenta, portanto, três alternativas diferentes de beneficiamento, das quais duas foram testadas, monitoradas e apresentaram atendimento para os parâmetros de qualidade exigidos tanto pela Resolução CONAMA 375/06 (RC 375/06) quanto pelas normativas do MAPA. E também uma estimativa de custos para o mesmo lodo de esgoto, desta vez beneficiado pela calagem. Uma quarta alternativa de disposição avaliada é o envio para o aterro, para efeito de comparação econômica. Em todos os casos avalia-se ainda como uma das alternativas a pré-secagem para diminuição do volume de lodo, com vistas aos custos de transporte. Porém é importante mencionar que a diminuição do volume contribui para alguns impactos ambientais associados ao próprio transporte desse material para o aterro sanitário. Para o estudo de caso em questão, que correu na ETE Lageado, localizada no Município de Botucatu, SP, a redução do volume desse material em até 75% diminuiu as emissões de gases de efeito estufa em cerca de 80% uma vez que houve diminuição do número de caminhões exigidos para o transporte desse material, que percorriam até 150 km para chegar no aterro sanitário para resíduo industrial mais próximo.

Autores: Ana Lúcia Silva;  Sergio Henrique Monção;  Ricardo Vianna e Ilva Martins Nery.

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