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Abastecimento de água em municípios baianos com tarifa social: uma abordagem acerca do uso racional

Resumo

O reconhecimento da essencialidade da água para a sobrevivência humana e a preocupação em garantir o acesso a mesma às populações de baixa renda impulsionaram as prestadoras de serviço de abastecimento de água a regulamentar a aplicação de subsídios nas contas de água e esgotamento sanitário, em conformidade com a Lei 11.445/2007. Assim, a tarifa social é um benefício concedido a famílias de baixa renda instrumentalizadas através de redução dos preços normais praticados em serviços básicos. Como regra não exclusiva, as prestadoras de serviços vinculam o acesso à tarifa social a famílias que são cadastradas em algum programa de assistência social. Como exceção, na Bahia dos 12 municípios que adotam a tarifa apenas 3 desvinculam a concessão do cadastrado simultâneo no programa Bolsa Família. A partir do banco de dados do SNIS/Diagnóstico de Água e Esgoto (SNIS, 2015) foram coletadas informações sobre os valores médios cobrados nas tarifas de água, além de variáveis relacionadas ao comportamento dos consumidores e dos prestadores do serviço e através da comparação entre municípios com perfis socioeconômicos semelhantes, analisou-se a eficiência da tarifa social como instrumento racionalizador de uso do recurso hídrico pelos prestadores de serviço e consumidores. Baseando-se em fundamentos de racionalidade estabelecidos pela teoria microeconômica, os resultados apresentados indicam que a tarifa social não pode ser utilizada, de forma exclusiva, para avaliação da racionalidade de uso da água pelo consumidor visto que parâmetros como disponibilidade do recurso ou mesmo restrição orçamentária interferem nessa análise de formas distintas. Contudo, no âmbito dos prestadores do serviço as informações e indicadores do SNIS evidenciam estes se comportam de forma economicamente irracional, com elevados índices de perda que comprometem o faturamento e agravam os custos da menor arrecadação decorrente da adoção da tarifa social.

Introdução

A água tem uma importância fundamental para sobrevivência humana, seja para utilização em consumo pessoal e higiene assim como para insumo para produção de bens e serviços relacionados ao desenvolvimento e bem-estar social. Reconhecendo essa multiplicidade de usos a Lei N° 9.433 de 8 de janeiro de 1997 (Lei das Águas) instituiu a política nacional de recursos hídricos e através dela assegura que a água é um recurso natural limitado, dotado de valor econômico e com uso prioritário para o consumo humano e a dessedentação animal em situações de escassez.

Do ponto de vista teórico, a definição de um bem econômico se baseia no aspecto de escassez e pode ser sistematizada como produto ou serviço escasso que tem custo de oportunidade não-nulo, sendo assim, são passíveis de racionamento ou mesmo comercialização em mercados. Uma das formas de classificação desses bens, fundamentada na natureza implícita do mesmo, foi apresentada por Samuelson (1954) que formulou os conceitos de bens públicos e privados, distintos entre si pelos aspectos de rivalidade e exclusividade. Ou seja, o consumo ou uso por um indivíduo limitando ou impossibilitando o consumo por outros (rivalidade) e a possibilidade de restrição do consumo a alguns indivíduos (exclusividade). Enquanto os bens privados seriam rivais e exclusivos, os bens públicos seriam não-rivais e não-exclusivos.

Contudo, no âmbito da teoria econômica, a água apresenta características que impedem a sua rígida caracterização como bem público ou privado. Considerando os múltiplos usos possíveis, aqueles identificados como offstream, que ocorrem fora do sistema hidrológico natural, implicam em rivalidade entre os usuários, permitindo a classificação do recurso hídrico como um bem privado. Por sua vez, usos instream como navegação ou piscicultura em tanques redes não implicam na retirada do recurso do leito do rio, permitindo, em linhas gerais, que o mesmo possa ser também utilizado por outra atividade e assim, caracterizando a água como bem público. Deve ser alertado que o ponto de partida para esta análise é a disponibilidade do bem em um determinado tempo e espaço. Evidentemente, a alocação de um número significativo de embarcações pode gerar rivalidade, descaracterizando temporariamente a não-rivalidade. Da mesma forma, a construção de represas para qualquer finalidade, pode resultar em estoque mínimos operacionais que podem inviabilizar demais atividades à montante.

Corroborando o entendimento da política instituída pela Lei 9.433 de assegurar à atual e as futuras gerações a necessária disponibilidade de água em padrões de qualidade suficientes, a agenda de sustentabilidade da Organização das Nações Unidas (ONU), lançada em 2015, elenca entre os 17 objetivos a serem atingidos até 2030 a meta de “Assegurar a disponibilidade e gestão sustentável de água e saneamento para todos”. No Brasil tal meta deve atingir cerca de 35 milhões que segundo o Instituto Trata Brasil, não são atendidos com o serviço.

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Autores: Gleice da Silva Aguiar;  Karine Veiga dos Santos;  Felipe Matos Farias e Telma C S Teixeira.

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